A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) vai apresentar nesta quinta-feira, 6, as propostas de três resoluções que poderão alterar significativamente a maneira como projetos de pesquisa clínica – aqueles que envolvem seres humanos – são avaliados no Brasil. O objetivo é preencher lacunas e dar mais agilidade ao sistema atual, tão moroso e burocrático que acaba por inibir a participação do País em projetos de pesquisas internacionais, além de atrasar o avanço da ciência nacional.
Somados todos os trâmites da Conep e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), é comum levar mais de um ano para ter um projeto de pesquisa clínica aprovado. Nos Estados Unidos e na Europa, esse prazo é de dois a três meses. “Não tem como ser competitivo dessa forma”, diz Marcelo Lima, diretor médico da Amgen, uma das várias empresas do setor farmacêutico que diz que poderia fazer mais pesquisas clínicas no Brasil, não fosse pelo excesso de burocracia. O problema afeta tanto a indústria quanto a academia.
O jornal O Estado de S. Paulo apurou que uma das propostas de maior impacto que deverá ser apresentada ao Conselho Nacional de Saúde (CNS) diz respeito à distribuição de poderes entre a própria Conep e os Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) locais, que avaliam os projetos dentro de suas respectivas instituições (há cerca de 700 deles espalhados pelo País, ligados a hospitais, universidades e institutos de pesquisa).
No sistema atual, há uma sobreposição de competências, que obriga muitos projetos a serem avaliados duas vezes: uma pelos CEPs (de todas as instituições envolvidas) e outra pela Conep. A ideia é propor um novo sistema de trâmites diferenciados, em que os comitês locais ganhariam autonomia para aprovar projetos de sua competência, de acordo com o grau de risco de cada pesquisa, e a comissão nacional só se envolveria em casos excepcionais, ou para resolver alguma disputa. “Não haverá mais dupla atribuição”, disse o coordenador da Conep, Jorge Venâncio.
Expectativa. Pesquisadores consultados pela reportagem receberam a ideia da descentralização com otimismo. “De todas as mudanças que precisam ser feitas, essa é a mais impactante”, avalia José Nicolau, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e diretor da Unidade de Coronariopatia Aguda do Instituto do Coração (Incor). “Temos pessoas muito competentes nos CEPs, que podem fazer análise tão boa quanto a da Conep, em prazo muito menor.”
Segundo Venâncio, a Conep recebe cerca de 150 projetos de pesquisa clínica por mês para analisar. O prazo para a comissão dar uma resposta é de 60 dias. “Na média, temos conseguido cumprir esse prazo”, diz o coordenador.
O problema é que a primeira resposta não é necessariamente a final. Caso haja algum questionamento, o projeto é devolvido aos pesquisadores, que precisam submeter o pedido novamente à Conep, e um novo ciclo de 60 dias se inicia.
“A Conep já avançou bastante, melhorando seus processos e reduzindo o tempo das avaliações, mas ainda repete muito do esforço que é feito pelos CEPs”, diz o presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), Florentino Cardoso, que defende também a redução da burocracia. “Não estamos pedindo facilidades. Queremos apenas um sistema mais eficiente e que funcione com prazos estabelecidos.”
Cronograma
A resolução que regulamenta a análise de pesquisas clínicas pela Conep é a CNS 466, de dezembro de 2012. Os três documentos que serão apresentados amanhã são propostas de resoluções complementares à ela; não substitutivas.
Além da proposta que trata da reorganização do sistema CEP/Conep, há uma sobre a regulamentação de pesquisas com seres humanos nas áreas das Ciências Humanas e Sociais e outra sobre um regime diferenciado para a análise de projetos considerados de interesse estratégico para o SUS.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.