Com vacinação lenta, baixa adesão às medidas de isolamento social e sem políticas nacionais de testagem em massa, o Brasil atingiu neste sábado, 19, a marca de 500 mil mortes pela covid-19 (500.022, conforme dados do consórcio de veículos de imprensa, que inclui o <b>Estadão</b>). O País viu a pandemia crescer exponencialmente e, apenas neste ano, registrou o maior número de mortes pela doença entre todas as nações do mundo.
Apesar de alguns governadores projetarem vacinar toda a população com pelo menos uma dose até o fim de agosto, a incerteza na entrega de vacinas e o surgimento de novas variantes ainda tornam o futuro da epidemia incerto no País. Epidemiologista e professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Pedro Hallal afirma que pelo menos 400 mil mortes poderiam ter sido evitadas se o governo federal tivesse adotado medidas para controlar a pandemia.
Para Hallal, a gestão Jair Bolsonaro errou ao atrasar a compra de vacinas, desestimular o uso de máscaras e imunização, não implementar uma política rigorosa de isolamento social, além de distribuir remédios ineficazes para a covid-19, como a cloroquina, que causaram uma falsa sensação de segurança.
O distanciamento entre as pessoas é um dos pilares do controle do coronavírus, mas o Brasil nunca conseguiu, de fato, implementar essa medida. Dados do Google sobre mobilidade mostram que a porcentagem de pessoas que deixaram de se deslocar para o trabalho variou entre 42% e 25%. Bolsonaro, porém, vem criticando o isolamento social repetidamente desde o início da pandemia. Um levantamento feito pelo Estadão mostrou que, entre março de 2020 e março deste ano, Bolsonaro promoveu pelo menos 41 eventos com aglomerações. Em maio, quando o País já acumulava mais de 430 mil vítimas da covid, o presidente chamou de "idiotas" as pessoas que ainda seguiam as recomendações dos especialistas e mantinham o isolamento. "O Brasil precisa de três semanas de um lockdown rigoroso. Isso é muito necessário, mas sabemos que também é muito difícil", diz Pedro Hallal, admitindo dificuldades de adesão e econômicas.
Para Marcel Ribeiro-Dantas, pesquisador em bioinformática no Instituto Currie (França) e integrante da isola.ai, iniciativa que conduz estudos relacionados ao distanciamento social na América Latina, as medidas fracassaram por falta de fiscalização e de alinhamento no discurso. "Não adianta o prefeito falar uma coisa e a oposição dizer outra. Falta uma voz uníssona."
O médico José Cherem, integrante do Núcleo de Pesquisa Biomédica da Universidade Federal de Lavras (UFLA), diz que a falta de apoio governamental é um dos principais entraves ao isolamento. "Falta um subsídio financeiro. As pessoas também estão enfrentando dificuldades econômicas, insegurança alimentar e desemprego", aponta.
Os especialistas ressaltam ainda que o Brasil deveria ter apostado em uma política de testagem em massa. Em geral, o Sistema Único de Saúde (SUS) só oferece teste de coronavírus a quem manifesta sintomas claros da doença – e o resultado demora. "O Brasil precisa ainda começar a fazer o sequenciamento para enfrentar a pandemia com informações mais criteriosas", defende José Cherem. O médico fala que, quando o país sabe com quais cepas está lidando, consegue calcular o impacto que o vírus terá sobre o sistema de saúde e tem tempo de prepará-lo.
<b>Imunização</b>
Os especialistas são reticentes em cravar o futuro da pandemia, mas concordam que dificilmente o País adotará uma política de isolamento social ou de testagem eficientes a ponto de controlar a disseminação do novo coronavírus. Sobra, portanto, a vacinação. O País comprou, ao todo, 559,6 milhões de doses das cinco vacinas aprovadas pela Anvisa, conforme a plataforma apolinar.io/vacinas. A previsão é de que tudo seja entregue até dezembro.
No sábado, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, se manifestou nas redes sociais, lamentando as "500 mil vidas perdidas pela pandemia que afeta o Brasil e o mundo". "Trabalho incansavelmente para vacinar todos os brasileiros no menor tempo possível e mudar esse cenário que nos assola há mais de um ano. Presto minha solidariedade a cada pai, mãe, amigos e parentes que perderam seus entes queridos." O presidente Bolsonaro não havia se manifestado até às 16h.