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A novela do Metrô em Guarulhos: uma cidade iludida há quase 50 anos

Guarulhos não tem metrô, mas não faltaram promessas de que o modal chegaria por aqui

Em operação desde 1974 no município de São Paulo, o Metrô sempre foi um sonho do cidadão guarulhense que espera, desde então, a chegada deste modal de transporte à cidade. Segunda maior cidade do estado, Guarulhos não tem uma linha de Metrô que atenda seus moradores até hoje. E não é por falta de promessas que esse sonho se mantém alimentado, anos a fio.

Além das datas sempre prorrogadas, o retorno dos trens à cidade (o antigo trem da Cantareira chegava a Guarulhos pela Vila Galvão e ia até a Base Aérea, em Cumbica) conta com episódios lendários, como uma placa instalada, na década de 1980, entre as rodovias Ayrton Senna e Hélio Smidt informando aos motoristas que ali passaria o Metrô.

As primeiras notícias de Metrô em Guarulhos aconteceram no ano anterior à sua inauguração, envolvendo a viagem do prefeito da época para Brasília. A comemoração aconteceu na edição do antigo “Guaru News”, de 24 de outubro de 1973, com a manchete “Metrô vem para Guarulhos partindo através da Zona Norte”.

No texto, o prefeito Valdomiro Pompeo recebe a notícia com euforia. Com 800 indústrias e com a Via Dutra já sobrecarregada, a cidade teria uma nova ligação com a capital, interrompida há quase uma década após o fim do Trem da Cantareira. O trajeto seria praticamente o mesmo, contemplando os bairros de Vila Galvão, Gopoúva e Tranquilidade. Por fim, a matéria cita que a “anunciada extensão da linha do Metrô vem reforçar a hipótese de que o novo Aeroporto Internacional seria em Cumbica e não em Viracopos, em Campinas”.

Dois dias antes da publicação do Guaru News, o prefeito paulistano, Miguel Colasuonno, anunciou pela televisão que a Linha Norte-Sul do Metrô, a primeira construída, não mais teria 17 quilômetros de extensão como no projeto original. Após sua inauguração, em setembro de 1974, ela ganharia um ramal de mais 10 quilômetros que a levaria a Guarulhos, atravessando a Rodovia Fernão Dias.

O mesmo jornal noticiou, em 12 de julho de 1974, o seguinte: “Metrô para Guarulhos. Em 20 dias, definição”. A edição traz informações de um encontro no dia anterior entre o mesmo Colasuonno e o ministro dos Transportes, Dirceu Nogueira. Após a reunião, em um prazo de três semanas, seriam divulgados os planos para extensão da Linha Norte do Metrô, até o Centro de Guarulhos ou a Cumbica.

O tempo passou, a então Linha Norte-Sul (hoje linha 1-Azul) do Metrô chegou ao Tietê, depois ao Tucuruvi. E nada de prolongar até Guarulhos. E a lenda da extensão passou a ser vista com ceticismo e ironia pelos moradores, que normalmente rebatem as sucessivas promessas com alguma triste piada.

 

Pra Guarulhos, via Itaquera

Em 2002, o então subprefeito de Ermelino Matarazzo e da Ponte Rasa, Arnaldo Bispo do Rosário, trabalhou numa proposta que ligaria a Zona Leste – Estação Itaquera – ao aeroporto de Guarulhos pelo Metrô. Foram contratados profissionais para a realização de estudos da obra, orçada em US$ 300 milhões. A viagem ocorreria em 20 minutos e abrangeria estações na avenida Paranaguá e na rodovia Presidente Dutra. Entretanto, com a promessa do governador Alckmin de entregar um ramal entre a Luz e o aeroporto no ano seguinte, a ideia foi abortada. O desejo do governador se concretizou 14 anos depois do previsto, com a extensão da Linha 13-Jade da CPTM.

 

VLT até o Tucuruvi

Em 13 de novembro de 2008, o prefeito Elói Pietá, se reuniu com secretário estadual dos Transportes Metropolitanos, José Luiz Portella. Na pauta, a criação do futuro Corredor Metropolitano Guarulhos–São Paulo (Tucuruvi). O governo disse ter aporte de R$ 500 milhões para a realização dessa obra, que beneficiaria moradores de Vila Galvão e Taboão. Portella solicitou apoio da Prefeitura no engajamento junto ao presidente Lula, do mesmo partido do então prefeito, para a contribuição de mais R$ 300 milhões com o objeto de transformar o corredor de ônibus em uma espécie de metrô de superfície, também conhecido como Veículo Leve sobre Trilhos (VLT).

Em 2009, o próprio site do governo noticiou: “Trem de Guarulhos será ligado ao metrô”. A publicação do dia 12 de maio diz o seguinte: “O Trem de Guarulhos terá ligação com a Linha 3-Vermelha do Metrô, na futura Estação Tiquatira, na zona leste, que será construída. Estão previstas cinco estações em funcionamento nesse ramal, que será denominado Linha 13-Ônix. As obras estão orçadas em R$ 300 milhões, com previsão de conclusão até 2014. Apesar de o Expresso Aeroporto e do Trem de Guarulhos compartilharem a mesma via, o acesso a ambos os serviços será segregado, com tarifas diferenciadas. A linha de Guarulhos custará R$ 2,55”. A Estação Tiquatira – escrita como Ticoatira – no site do governo, seria interligada à Linha Vermelha. Foi mais um projeto engavetado.

 

Linha 2-Verde, até o Internacional Shopping

Em 2012, o então governador Geraldo Alckmin anunciou a expansão da Linha 2-Verde até Guarulhos. O novo trecho, de 13,5 quilômetros de extensão, teria obras iniciadas no ano seguinte e estabeleceria duas novas estações na cidade: Ponte Grande e Dutra (com estação terminal no estacionamento do Internacional Shopping). A inclusão das duas estações em território guarulhense foi confirmada em abril de 2014, gerando, inclusive, desapropriações de terrenos. Mas, novamente, as promessas não foram cumpridas. Em 2016, o tucano suspendeu o início das construções por um ano. A alegação foi o ajuste fiscal da União.

Somente em 2019 o atual governador João Doria excluiu cinco estações e cinco quilômetros do novo trecho. A extensão, que deve ter as obras iniciadas neste ano, adiou novamente as estações Dutra, Ponte Grande, Paulo Freire, Penha de França e Tiquatira. Novamente Guarulhos se viu fora dos projetos do Metrô.

O Governo Estadual não descarta, no futuro, a chegada da Linha Verde a Guarulhos. A nova previsão de entrega da estação Penha, que será a última da rota, é entre 2025 e 2026, segundo o Palácio dos Bandeirantes (a previsão inicial era 2013, já com as paradas guarulhenses). Após este período, a administração fará novos estudos sobre uma possível expansão, iniciando pela estação Ponte Grande.

 

Novo capítulo da novela

A última notícia envolvendo Metrô em Guarulhos aconteceu já em 2020, quando o Estado contratou uma empresa para realizar o levantamento topográfico que visa a construção de cerca de 19 km da nova Linha 19-Celeste. O trabalho começará na altura do cruzamento da rua Claudino Barbosa com a avenida Tiradentes, no Macedo e terminará no viaduto Júlio de Mesquita Neto, no bairro Bela Vista, já na capital. De lá, é prevista uma extensão até a avenida Brigadeiro Luiz Antônio.

Contudo, poucos se lembram que em 2011 já existiam notícias acerca do novo ramal. Na ocasião, o Diário de Guarulhos trouxe uma entrevista com o arquiteto e urbanista Alberto Epifani, gerente de Planejamento e Integração do Metrô. Ele afirmou à reportagem que a linha teria estações na Av. Tancredo Neves, Centro (Guarulhos), Anel Viário (Castelo Branco), Vila Endres e Fernão Dias, seguindo em direção à estação Dutra. No local, também seria construída uma baldeação para a Linha Branca, seguindo até a Penha. “O governador Geraldo Alckmin fez questão de que a Linha Celeste seguisse até Guarulhos, pois os estudos iniciais previam que ela deveria terminar na Vila Maria”, disse Epifani. De acordo com o arquiteto, o prazo para conclusão dessas linhas de metrô será 2018. “São muitas as etapas necessárias para se construir uma linha: diretrizes, projeto funcional, licença ambiental, desapropriações, projeto executivo e execução. As obras mesmo devem começar só em 2013, com recursos do Tesouro ou, talvez, parte delas, numa PPP”, disse o profissional na época.

Em maio deste ano, o Metrô suspendeu a licitação do projeto básico da Linha Celeste. O novo ramal, de acordo com o governo, tem potencial de demanda de 500 mil passageiros por dia e o custo da obra é de aproximadamente R$ 15 bilhões. Há previsão de paradas no Bosque Maia, Centro, Vila Augusta, Itapegica, além de um ponto de baldeação na possível Estação Dutra, da Linha Verde, caso ela saia do papel um dia, assim como a própria Linha Celeste que, de concreta, por ora, nada tem.

 

O que tem pra hoje

A Linha 13-Jade da CPTM, única via férrea da cidade, abriga dois pontos de parada no município: Cecap e Aeroporto, ligados ao bairro do Engenheiro Goulart, na Zona Leste da capital. Embora avance pelo território de Guarulhos e atenda parte de sua população que procura locomoção para São Paulo, os novos trens deslocam sete vezes menos passageiros do que o previsto pela administração estadual, segundo estimativa de novembro de 2019. A falta de ligação com o aeroporto e com os bairros periféricos são apontados como os principais pontos da falta de quórum da rota. A companhia estuda a extensão da linha até a região do Bonsucesso, contudo, nada saiu do campo da especulação.

Prometido pela primeira vez para 2004, depois para antes da Copa do Mundo de 2014 e entregue às vésperas do mundial de 2018, não surtiu o efeito esperado nos usuários do transporte público que, em regra, continuam utilizando o bom e velho ônibus, que leva aos terminais interligados às estações Penha, Carrão, Brás, Tucuruvi, Tietê e Armênia. Após o desembarque, já na capital, os guarulhenses se locomovem com os meios locais para chegar ao destino desejado. Cidadãos que se deslocam de um ponto a outro da cidade também optam pelos ônibus municipais, que se interligam pelos cinco terminais de Guarulhos: Vila Galvão, Pimentas, Cecap, São João e Taboão.

Quem chega à Estação Aeroporto e precisa pegar voo, aguarda cerca de 15 minutos por um ônibus gratuito, que leva os usuários até os terminais 2 e 3. Era prevista a construção de um transporte hectométrico resolvendo a questão, todavia o TCU (Tribunal de Contas da União) não concordou com o início das obras, alegando que não há demanda para tal e que o atendimento atual é o suficiente para a finalidade apresentada. Um ano após o anúncio do “people mover”, a construção segue indefinida.

Em junho, uma matéria publicada pelo jornalista Ricardo Meier, no blog Metrô CPTM, traz projeções feitas por um escritório de arquitetura, responsável pelo projeto de expansão da Linha 2-Verde do Metrô, de como seria a futura Estação Dutra, ao lado do Shopping Internacional. O desenho surpreende. Com mais de 34 mil m² de área, a estação incluirá um terminal de ônibus com sete plataformas de embarque e desembarque de passageiro, praça de uso público, pista de skate, playground, ginástica, uma quadra poliesportiva e 290 vagas para ciclistas. Um prognóstico otimista aponta a entrega das obras para daqui uma década. Porém, a projeção não leva em conta as inúmeras promessas já realizadas e não cumpridas pela administração estadual.

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