Nem só de histórias felizes vive este espaço. Hoje abordo um tema que, infelizmente, afeta diretamente a vida das pessoas, em geral, as mais simples, que não contam com um plano de saúde. Trata-se de uma história real, ocorrida com uma pessoa próxima, que me reservo o direito de não dizer quem é. Sem plano de saúde para a mãe, que tem mais de 70 anos e apresenta uma grave enfermidade, Sílvia (o nome é fictício) peregrinou por um posto de saúde municipal em busca de uma consulta. Após algumas idas e vindas, o atendimento apontou para a necessidade de uma cirurgia. Mas – antes – seria necessário passar em um especialista já no hospital Stella Maris, que atende pelo SUS. Quase dois meses depois, a tão necessária consulta foi marcada para segunda-feira. O atendente deixou claro. “Apesar de estar marcada para às 8h, chegue lá por volta das 6h para pegar um bom lugar na fila”. Pois bem, segunda-feira, 6h, estavam lá Silvia e sua mãe. Como chegaram cedo, tiveram o privilégio de ficar logo entre os primeiros da fila, do lado de fora do hospital, em uma rampa de acesso, a céu aberto. Como os termômetros, naquela manhã, marcavam em torno de 10 graus mais um vento cortante, a sensação térmica era de bem menos. Não só elas, mas todos que chegam para atendimento ficam expostos a todas as interpéries da natureza até às 7h15, faça chuva ou faça sol. Sim, as pessoas ficam naquele local descoberto, até a porta do salão de atendimento abrir. Bastaria uma boa alma permitir que aquele local fosse aberto, as pessoas chegariam e pegariam uma senha – como fazem só a partir das 7h15 – e poderiam aguardar o atendimento em um local digno. Mas isso não ocorre. Deve existir algum motivo que o hospital agir assim. Talvez seja para aumentar a humilhação daqueles que não têm outra saída do que mendigar por um atendimento médico. Fiquei sabendo depois que idosos, homens, mulheres, crianças e até bebês nos colos de mães desesperadas, passam por esse martírio todo santo dia. Quem chega mais perto da hora do portão abrir, é obrigado a encarar a fila que dobra a esquina, sob pena de não conseguir a senha para ser atendido naquele dia. Ah, a Sílvia e sua mãe, por volta das 8h30, ficaram sabendo que a médica, cuja consulta estava agendada, não iria atender naquele dia. O horário foi remarcado. E o martírio recomeçou na gelada manhã desta sexta-feira. Ernesto Zanon Jornalista, diretor de Redação do Grupo Mídia Guarulhos, escreve neste espaço na edição de sábado e domingo No Twitter: @ZanonJr