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3ª Flupp ocupa escola de arte da favela da Mangueira

Organizar uma festa literária na favela e para a favela, mas que também atraia outras favelas e quem mora na chamada “cidade formal”. O escritor Julio Ludemir tem a premissa a nortear a Festa Literária Internacional das Periferias (Flupp). A terceira edição, aos pés do Morro da Mangueira, começou na quarta-feira e vai até domingo, 16, com 50 atrações nacionais e internacionais e uma pioneira batalha de poesias, a Rio Poetry Slam, com poetas de 16 nacionalidades.

“Se eu estivesse aqui vendendo celular, ninguém estranharia. Mas se monto uma festa literária, acham que é um evento salvacionista. Se fosse em Ipanema, não compareceriam todos os moradores de Ipanema, e aqui também é assim, porque sempre haverá os desinteressados”, reflete Ludemir, que trabalha em parceria com o escritor Ecio Salles, o antropólogo Luiz Eduardo Soares e a professora Heloísa Buarque de Hollanda.

“Dizer que o livro e a cultura ainda não chegaram à favela, principalmente como fator de mobilidade social, é não entender que existem jovens da favela chegando às universidade e criando uma nova subjetividade”, acredita.

A expectativa é que o público passe de 20 mil pessoas, o que tornaria essa Flupp a maior de todas. O fato de a Mangueira ser um morro mítico, graças à fama emprestada pela escola de samba e compositores como Cartola e Nelson Cavaquinho, e central, o torna mais convidativo do que os que o precederam: os morros dos Prazeres e Vigário Geral.

Na abertura, quarta, viam-se mesas cheias para ouvir debates, estudantes circulando com olhares curiosos e moradores conferindo a exposição sobre o ator e pioneiro na militância negra no Brasil Abdias Nascimento, que teria feito 100 anos em março.

As autoras africanas Chibundu Ozuno, da Nigéria, e Leonora Miano, de Camarões, convidadas a falar sobre O amor nos tempos do ebola, uma vez informadas sobre o significado do carnaval, das escolas de samba e das favelas para os afrodescendentes cariocas, logo se sentiram em casa.

“O Brasil sempre me atraiu por ser o país com mais negros fora da África. Quero ir onde as pessoas são marginalizadas, onde não têm voz”, disse Leonora, que vive na França e foi premiada por livros perpassados pelas temáticas da consciência negra e a diáspora africana. É sua quarta vinda ao Brasil.

Feliz por falar de literatura “não só para uma elite”, a jovem Chibundu gosta de pensar nessa interação Sul-Sul, sem necessidade de qualquer mediação. E não se importa de ter de responder a questões nascidas de estereótipos que reduzem a África a pobreza, doenças, ditaduras e guerras civis. “Mas sempre faço questão de dizer que o que falo é opinião minha, e não da Nigéria inteira, pois somos 170 milhões de pessoas.”

Chibundu tem 23 anos e seu primeiro romance, The Spider Kings Daughter, lançado aos 21, foi saudado com entusiasmo pela crítica britânica. Embora ela seja doutoranda em história na Kings College London e venha de uma família de médicos, é uma inspiração para jovens negros de favelas (a princípio, com menos chances) que sonham seguir carreira literária. Para Hugo Germano, por exemplo, também de 23 anos. Entusiasta da Flupp de primeira hora, levado por seu professor de teatro, ele se diz transformado.

“Lia pouco e tinha muita dificuldade com a escrita. Sempre gostei de suspense e, graças à Flupp, descobri Agatha Christie, li peças de Nelson Rodrigues e Plínio Marcos, cheguei a Clarice Lispector. O teatro abriu meus caminhos e a Flupp me encaminhou. É incrível escrever sobre mim e saber que outra pessoa vai ler e ter suas próprias impressões”, conta Germano, que teve o conto O Assassino Noturno publicado pela Flupp no ano passado e, para a edição de 2014, criou o autorreferente Agora Sei.

É justamente essa a pretensão do evento, inspirado na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip): formar novos leitores e escritores, dilatando horizontes, em especial aqueles fadados à estreiteza, por conta de empecilhos financeiros. Mudar narrativas e repertórios. Para conquistar adeptos nas comunidades em que se instala, a Flupp é precedida de visitas às escolas dos arredores e aos projetos sociais. A sigla termina em “upp” em alusão à Unidade de Polícias Pacificadoras, ação policial que tem como objetivo desarmar traficantes e levar paz às favelas. A referência foi deixada de lado para que o conceito de periferia se ampliasse. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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