Houve no início dos anos 1980, na Inglaterra, um movimento musical que se convencionou chamar de New Romantic. Contra a austeridade do punk, preconizava a disseminação de cor, lirismo, senso de diversão e descompromisso. Entre esses artistas, pontificaram alguns, como Roxy Music, Duran Duran, Sade, Culture Club, Wham! e Spandau Ballet – este último gestou hits planetários, como True, Only When You Leave, Gold e Through the Barricades.
Trinta e cinco anos após seu surgimento, o Spandau Ballet (que durou uma década) voltou à ativa neste final de ano com um vigoroso pacote de novidades: além de uma coletânea dupla, Story: The Very Best of Spandau Ballet (lançamento Warner Music), e uma turnê mundial em curso, há um documentário em longa-metragem que está sendo mostrado nos cinemas pelo mundo, Soul Boys of the Western World, dirigido por George Hencken, no qual contam sua história com documentação de seus arquivos pessoais.
“O filme não aborda apenas o que aconteceu com a gente, mas mostra todas as mudanças de uma época, seja na esfera musical, política ou cultural. Não é só a banda o objeto de exame, mas toda a cultura pop de uma geração”, disse ao Estado, essa semana, o saxofonista Steve Norman, de 54 anos, um dos fundadores do Spandau Ballet (os outros veteranos são Tony Hadley, os irmãos Gary e Martin Kemp e John Keeble).
“Propusemos uma música positiva, de construção de algo, num momento em que o ceticismo do punk era absoluto. Nós fizemos algo a respeito”, argumenta Norman, que se tornou, após o final do Spandau, em 1989, um festejado produtor e DJ, trabalhando em Ibiza com estrelas da house music e da cena club, como Frankie Knuckles e Bruce Foxton.
A história do grupo, conta Norman, é a história de um grupo de amigos de escola da periferia de Islington, inicialmente. Mas havia um condimento diferente: banharam de soul o seu som, coisa que era restrita a algumas poucas bandas daquela geração, como Fine Young Cannibals, Simple Minds e Dexys Midnight Runners.
“Em 1974, eu tinha 14 anos e também tendia a ser um punk. Mas, de todos os integrantes, eu era o único que tinha um coté de soulman. Adorava Stevie Wonder e artistas da black music. Mas também gostava de progressivo, de rock. Originalmente, eu era o guitarrista da banda. Dessa forma, nós acabamos educando uns aos outros musicalmente, um ensinava ao outro aquilo que tinha de peculiar.”
Para se opor ao punk rock em voga, eles buscaram uma fórmula de uma música alegre, colorida. “Em 1977, 1978, quando a gente começou, nós estávamos entre esse desencanto do punk e o nascimento de uma nova era, com o New Romantic. Tomamos a decisão consciente de fazer uma música mais comercial, e também que tivesse mais a ver com nossas origens. Foi então que eu comecei a tocar o sax. Era a busca de um groove, algo mais próximo da música para dançar.”
Steve Norman diz que seu saxofone nunca foi parte integrante da “era yuppie”, que encheu de sons de sax as baladas dos anos 1980 para fomentar um ideário playboy, tipo 9 Semanas e Meia de Amor. “Nunca fui fashion. Eu, na verdade, tocava percussão e bateria também, sonhava em ser baterista. Mas o saxofone era um elemento para fazer uma música mais dance, um tempero melódico. Eu podia tocar o sax, adorava a música de Grover Washington Jr. Mas o saxofone sempre esteve na música pop, não era uma exclusividade de uma época”, ponderou o músico, hoje em dia fã da banda Queens of the Stone Age.
Norman acha que muito da dance music moderna se inspirou em sons que o Spandau criou. O fato de serem os detentores de alguns recordes (a canção True atingiu mais de 4 milhões de plays na América do Norte, enquanto Gold, de 1983, foi escolhida como tema das Olimpíadas de Verão de Londres em 2012) mostra que sua permanência está assegurada.
“Não penso muito em termos de legado. Claro que dá orgulho e é importante ter uma música que as pessoas cantam junto com a gente em todo lugar do mundo. Mas o mais importante é a diversão. Viver é isso. Talvez seja a mesma sensação para alguém como Steven Spielberg, que fez bons filmes, mas é mais lembrado por um grande filme. Ele ama todos os filmes que fez.”
O Spandau Ballet já fez uma turnê de retorno em 2009, mas agora está de novo na estrada e na iminência de lançar material inédito (há três canções novas na coletânea). Não sabem se a turnê passará pelo Brasil. “É algo que sempre quisemos. Seria fantástico”, diz. No momento, empenham-se em mostrar o seu novo filme para o máximo de plateias possíveis – no início deste mês, houve uma sessão em Santiago (Chile).