O barítono Paulo Szot não é muito de falar do passado. Mas as apresentações que ele faz nesta sexta (6) e sábado (7) no Teatro São Pedro são, em muitos sentidos, um retorno às origens. Pela primeira vez desde que se consagrou nos palcos internacionais – no musical South Pacific, na Broadway, que lhe rendeu o Tony de ator, e mais tarde em palcos como o Metropolitan e o Scala -, ele volta a São Paulo para um concerto solo dedicado à ópera. E será regido por seu “primeiro maestro”, Luiz Fernando Malheiro, que o descobriu entre os cantores do Coral Lírico do Teatro Municipal há quase 20 anos.
A primeira parte do concerto é composta de uma seleção de canções do ciclo Des Knaben Wunderhorn, de Mahler. “Este é um repertório que me dá enorme prazer. Eu cantei essas canções pela primeira vez em 2001, em Jacksonville, na Flórida, com o maestro Fábio Mechetti e Mahler logo se tornou uma paixão, as cores da sua música, as atmosferas diferentes que consegue criar a cada uma das peças”, diz Szot ao Estado após uma manhã de ensaio. O repertório de canções, ele acrescenta, é algo a que gostaria de se dedicar mais: mas está contente de, em março, poder interpretar outro ciclo, as Canções e Danças da Morte, do russo Modest Mussorgski – será com a Orquestra Petrobrás Sinfônica, no Teatro Municipal do Rio.
Na segunda parte, a ópera. Szot vai interpretar compositores que, de certa forma, marcam sua evolução como cantor. Ele abre o programa com a ária do conde em As Bodas de Fígaro. Mozart é um autor bastante associado a seu início de carreira: “Mas quero tê-lo perto de mim ainda por muito tempo”, ressalta. Em seguida, Eugene Onegin, de Tchaikovski, que ele cantou no Brasil no começo da carreira e, lá fora, se tornou um de seus grandes papéis. Aparecem, então, autores de escrita mais pesada – Carlos Gomes, de quem ele canta a ária de Colombo, e Wagner, com a cena final de A Valquíria.
A trajetória de Szot começa com uma queda. Aos 18 anos, bailarino, ele resolveu partir para a Europa. Viajou 23 dias em um navio cargueiro que o levou até a Polônia. Mas durante um ensaio caiu e machucou o joelho. Foi então que sua relação com o canto começou. Após alguns anos, ele resolveu voltar ao Brasil. E passou a integrar o Coral Lírico do Theatro Municipal de São Paulo. “A primeira ópera que cantei, no coro, foi Turandot”, recorda.
Mas a ocasião o marcaria por outros motivos. Foi nos ensaios da produção que ele conheceu o então maestro assistente do teatro, Luiz Fernando Malheiro. “Ele também havia estudado na Polônia e me chamou para uma audição. Tempos depois, me ligou. Perguntou se eu queria fazer um Barbeiro de Sevilha. Qual papel?, eu perguntei, e mal acreditei quando ele disse que era o protagonista.”
Malheiro se recorda daquela época – e da audição, em que já ficava claro que
“ali tinha um cantor de verdade”. “Fizemos muita coisa juntos depois, em São Paulo e Manaus”, lembra o maestro, diretor do Festival Amazonas de Ópera. “Nós conversamos muito sobre o programa que ele cantaria agora e me pareceu interessante que o público de São Paulo pudesse ouvi-lo de novo cantando um concerto dedicado à ópera. Em seguida, juntamos autores importantes de seu repertório e outros que estão chegando, em um momento em que a voz dele vai se transformando”, explica o maestro.
Variedade
Szot mudou-se para os Estados Unidos em meados dos anos 2000. Sua estreia em Nova York foi com As Bodas de Fígaro, na New York City Opera. Foi cover da mesma ópera no Metropolitan. Mas a grande chance viria em 2008, no musical South Pacific, na Broadway. Venceu o Tony de melhor ator – e, de quebra, ganhou um contrato para voltar ao Met, agora como protagonista de O Nariz, de Shostakovich, regido pelo maestro russo Valery Gergiev.
As ressalvas do mundo da ópera com relação aos musicais nunca o incomodaram. Até porque sua trajetória lá fora tem sido pautada justamente pela diversidade. Ele tem um grupo de jazz, com o qual se apresenta regularmente.
E, mesmo no mundo lírico, papéis do repertório tradicional – como Escamillo, em Carmen, que ele fará este ano em sua estreia no Festival de Glyndebourne, na Inglaterra – convivem com óperas novas, como A Dogs Heart, de Aleksander Raskatov, estreada no Scala de Milão em 2013, ou The Death of Klinghoffer, de
John Adams, apresentada no ano passado no Metropolitan.
“O que me interessa como artista é estar aberto a coisas novas. Mesmo no repertório tradicional. Um papel como Escamillo, por exemplo, que já fiz tanto, exige que busque sempre uma outra forma de enxergá-lo.” Já com a opereta O Morcego, outro de seus compromissos para este ano, a novidade estará no fosso. “Será a primeira vez que vou cantar regido pelo maestro James Levine, estou muito animado”, confessa ainda.
E ele imaginava chegar onde chegou? “Eu sonhava, mas não imaginava”, brinca. “Quando fiz o Barbeiro de Sevilha, o Enzo Dara (cantor e diretor italiano) me disse: aprende bem o italiano porque você vai precisar falar o idioma quando estiver cantando no Metropolitan. Ali, pensei nisso pela primeira vez. Mas no sonho mais louco eu faria um ou outro papel secundário. E estava mais do que bom.” Pelo jeito, não estava. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.