Variedades

Figurino minucioso e artesanal é ponto-chave dos concorrentes ao Oscar

Meryl Streep é uma atriz capaz de convencer em qualquer papel. Se a caracterização ajuda então, seu talento chega a assustar. Logo no início de Caminhos da Floresta, um dos filmes que concorrem ao Oscar de melhor figurino este ano, sua personagem, a Bruxa, surge com um vestido composto por pequenos retalhos de couro costurados sobre chiffon e combinados a outro tipo de couro, cuja textura lembra uma casca de árvore rachada. Em boa parte das roupas do longa, a figurinista Colleen Atwood, premiada três vezes pela Academia, buscou mimetizar, por meio de cores e texturas, a floresta que dá título ao filme, onde Chapeuzinho Vermelho, Cinderela, Rapunzel e outros seres de contos de fadas têm suas histórias cruzadas.

Em tempos de cinema digital, em que quase tudo se resolve na pós-produção, o figurino artesanal, tratado com esmero e riqueza de detalhes, sugere uma bem-vinda volta às raízes. E agrada público, críticos e atores. Também em Caminhos da Floresta, o terno do Lobo, vivido por Johnny Depp, exigiu esforço manual da equipe.

Não apenas porque ele próprio sugeriu a roupa que gostaria de usar, mas também por causa da padronagem de pelos que foi bordada sobre uma tela fina de lã e depois emendada no o traje de Depp. “Pensei nisso quando vi uma peruca dos anos 1920”, conta Colleen, dando uma ideia de quão longe pode chegar a imaginação de um figurinista.

Já a figurinista polonesa Anna Sheppard, vencedora de dois Oscars, precisou de mais que imaginação para agradar a Angelina Jolie, a todo-poderosa de Malévola, produção da Disney que concorre apenas nesta categoria. Anna contou com um time composto por um designer de sapatos, um chapeleiro, um joalheiro e um criador de próteses especiais (sem contar os assistentes de cada um deles) para criar mais de 2 mil peças e tornar reais as ideias da atriz, protagonista e produtora executiva do longa. “Angelina é realmente apaixonada não só por quem a personagem é, mas pelo visual dela”, afirma o diretor Robert Stromberg.

Nem precisava dizer. O visual sombrio da vilã de A Bela Adormecida traz à tona lembranças de Angelina no início dos anos 2000, quando era considerada garota-problema e andava por aí carregando no pescoço um relicário com gotas de sangue de seu então marido, Billy Bob Thornton.

A bem da verdade, até hoje a estrela segue a linha fatal – pelo menos quando se trata de moda. Exigente, Angelina solicitou, entre outras coisas, próteses para deixar suas maçãs do rosto proeminentes e supervisionou a confecção dos imponentes chifres da vilã. Ao todo, foram desenvolvidos mais de 20 pares, feitos de resina de uretano e facilmente acoplados ao chapéu na cabeça da atriz por meio de um sistema magnético.

Os tons escuros do figurino de Malévola encontram eco no de outro concorrente, Mr. Turner, produção inglesa que narra os últimos 25 anos de vida do excêntrico pintor britânico J. W. Turner. Criados por Jacqueline Durran, os impecáveis trajes de época (a trama se passa na Inglaterra do século 19) têm como base de cores o jogo de luz e sombra apresentado nos quadros do artista impressionista. Jacqueline criou sapatos com solas levemente inclinadas para ajudar o protagonista, vivido por Tim Spall, a encontrar o andar do personagem, e desenvolveu réplicas idênticas do chapéu e do anel usados pelo pintor.

Enquanto isso, Mark Bridges, figurinista da comédia noir Vício Inerente, estrelada por Joaquin Phoenix, não quis saber apenas de reproduções. Para contar a história de Doc Sportello, detetive hippie que vive na Los Angeles dos anos 1970, o profissional garimpou peças vintage em brechós e bazares. Ele e sua equipe as lavaram dezenas de vezes e desgastaram áreas como as bordas dos bolsos e a parte de trás das calças até que ficassem com o aspecto surrado.

Um dos looks mais emblemáticos do filme, o vestido de crochê laranja usado pela atriz Katherine Waterston é um original da época, encontrado por Bridges em uma feira de antiguidades. “Foi um achado de sorte, pois a maioria das roupas artesanais não sobreviveu aos últimos 45 anos”, diz o figurinista. “Eu apenas tingi a peça para reativar a cor, mas tomando cuidado máximo.”

Man Ray e Klimt

No caso da italiana Milena Canonero (dona de três estatuetas da Academia), responsável pelos looks de O Grande Hotel Budapeste, o desafio não consistiu apenas em recriar um período histórico, mais especificamente os anos entre guerras, na fictícia – e colorida – Repúplica de Zubrowka, onde se desenrola a trama. Milena precisou imergir no universo muito particular do diretor Wes Anderson, cuja preocupação estética atinge um nível de detalhamento maior a cada novo filme. Para compor a direção de arte complexa, ela desenhou as roupas levando em conta não somente os personagens, como também os tons do cenário e dos objetos de cena.

Durante a criação dos figurinos em si, Milena teve como referência a carga dramática das fotos de Man Ray e as cores dos quadros do pintor austríaco Gustav Klimt. Um dos vestidos de veludo de Tilda Swinton, que interpreta uma colecionadora de arte de mais de 80 anos, tem as cores e desenhos de uma das mais famosas pinturas do artista, o Retrato de Adele Bloch-Bauer 1.

A figurinista ainda encomendou peças de grandes grifes, caso do trench coat de couro da Prada usado por Willem Dafoe, um dos vilões, durante toda a trama e os casacos e estolas de pele da Fendi, marca italiana conhecida por sua expertise na utilização de peles de Mink e raposa.

Não à toa, os universos da alta moda e dos melhores figurinos de cinema formam um encontro perfeito. Em ambos, o rigor técnico, a confecção artesanal e a minúcia de detalhes são fatores essenciais. Isso, sem falar nos sonhos que despertam dentro e fora das salas de projeção.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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