Será que, no final da vida, Bach enfim escreveu algo chato? Foi essa a pergunta que a pianista Angela Hewitt fez a si mesmo há alguns anos. Após gravar todas as principais peças do compositor para teclado, ela recebeu um convite para interpretar “A Arte da Fuga”. “Era difícil de acreditar. E eu resolvi aplicar tudo o que eu havia aprendido para tentar dar vida a essa música”, escreveu ela em um artigo publicado em 2012 no The Guardian. No ano passado, o resultado: ela lançou um elogiado CD em que registra a peça, a mesma que apresenta nesta terça-feira, 07, em recital na Sala São Paulo (a partir de quinta, ela também toca com a Osesp, mas com repertório diferente: o Concerto nº 25 de Mozart, sob regência de Richard Armstrong).
“Em 2012, eu fui convidada para fazer dois recitais em Londres e pensei que talvez fosse o momento de fazer a peça”, ela conta, em entrevista à reportagem. “Foi uma boa ideia separá-la em dois recitais, um na primavera, outro no outono, porque o processo de aprendizado foi muito intenso. No final, fiquei feliz de ter esperado, de ter gravado outras obras antes de fazê-la porque isso fez da Arte da Fuga uma obra mais fácil de compreender e eu sabia exatamente o que precisava para dar vida a ela.”
“A Arte da Fuga” foi escrita na última década de vida de Bach, sem uma instrumentação definida e com uma notação aberta, o que deixa ao intérprete a tarefa de tomar decisões quanto à interpretação. Durante muito tempo, ela foi vista como pouco mais do que um exercício acadêmico mas, para Hewitt, perto da “Arte da Fuga”, obras como as mais célebres Variações Goldberg “parecem brincadeiras de criança”. “As Goldberg são muito mais acessíveis para o ouvinte. A Arte da Fuga é trabalho duro para o intérprete e o público, mas as recompensas são enormes. Para mim, a importância da obra está no fato de que mesmo sendo um compêndio técnico, está longe de ser um trabalho acadêmico estéril. Há muita emoção e drama nessas fugas. E cabe ao intérprete dar a cada uma delas seu próprio caráter. Bach te dá as pistas. Você só precisa encontrá-las.”
Após gravar a obra, a primeira impressão se desfez. Hewitt já não a considera “chata”. “Pelo contrário, só me fizeram admirar Bach ainda mais. Quer dizer, eu sabia que ele era um cara esperto, tendo escrito coisas como O Cravo Bem Temperado, para não falar de todo o resto. Mas A Arte da Fuga é de mexer com a cabeça da gente.” Depois de quase vinte anos gravando Bach, Hewitt conta que agora tem se dedicado à gravação das sonatas de Beethoven. E, em algumas semanas, fará pela primeira vez o Concerto nº 1 de Brahms. “Depois, o concerto para mão esquerda de Ravel. É muito trabalho, mas que grande música! E isso me deixa feliz.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
ANGELA HEWITT
Sala São Paulo. Pça. Júlio Prestes, 16, tel. (011) 3367-9500. 3ª, 5ª e 6ª, 21h; sáb., 16h30. R$ 71/R$ 92 (3ª); R$ 45/R$ 178 (ensaio 5ª, 10 h, R$ 10).