Variedades

Novo catálogo identifica mais de 2.600 obras de Alfredo Volpi

Para comemorar os 100 anos do primeiro quadro de nosso maior pintor modernista, feito em 1914, o Instituto Alfredo Volpi de Arte Moderna vai lançar em julho o catálogo raisonné de Volpi (1896-1988), reunindo informações sobre 2.646 obras de autoria do artista, de azulejos a afrescos, passando por desenhos e pinturas. Ele ainda não é o catálogo definitivo. Faltam aproximadamente 500 outros trabalhos à espera do tombo, segundo o presidente do instituto, o engenheiro Marco Antonio França Mastrobuono, ele mesmo um dos maiores colecionadores de Volpi, que conheceu em 1973.

Em todo caso, a publicação cresceu em relação aos dois volumes do catálogo parcial publicado no ano passado pela Base 7 Projetos Culturais em conjunto com o Instituto Cultural Itaú, aproximadamente 2.300 obras que cobrem oito décadas da produção do pintor. E mesmo esse número pode dobrar, no final da catalogação, segundo projeção de Mastrobuono. “Já temos 3.100 obras fotografadas, entre as pertencentes a colecionadores particulares e instituições públicas, e podemos chegar a 4 mil”, estima.

Embrião

Esse trabalho de catalogação começou em 1978 sob a coordenação de Pietro Maria Bardi, então diretor do Museu de Arte de São Paulo (Masp), com a participação ativa de Volpi, que viveria ainda mais dez anos depois de iniciada a operação. Há 15 anos, a Associação para a Catalogação da Obra de Alfredo Volpi, então presidida pelo falecido colecionador Domingos Giobbi, lançou um CD-ROM com 2.239 imagens das obras, que serviu de embrião para o catálogo digital que o instituto dirigido por Mastrobuono exibe hoje em seu site, incluindo os trabalhos roubados e extraviados do artista.

O catálogo parcial da Base 7 foi feito em parceria com dois institutos, o que leva o nome do pintor e o Itaú Cultural, com apoio do Ministério da Cultura, mas teve circulação restrita. O novo catálogo terá distribuição mais ampla, para cobrir os custos da extensa pesquisa que parece não ter fim sobre o histórico e propriedade das obras.

Como conta Mastrobuono em sua biografia do pintor, Alfredo, publicada pelo Instituto Volpi há dois anos, o espírito anárquico do artista dificulta – e muito – esse trabalho de catalogação. “Quando eu perguntei a Volpi por que nunca datou um quadro, ele respondeu com outra pergunta: Pra quê?.” A resposta, se Volpi estivesse vivo, poderia ser outra pergunta: “Só para dar confusão?”. É o que acontece desde que um grupo seleto de “volpistas” (colecionadores e galeristas que trabalham com sua obra) se reuniram há alguns anos para criar uma sociedade para a catalogação, na década de 1990. Os antivolpistas, ou seja, aqueles que ficaram fora do círculo fechado, acusaram a sociedade de manipular o catálogo em benefício próprio, levando a uma dissidência entre os integrantes da associação.

O principal motivo que provocou essa campanha foi a decisão, segundo conta Mastrobuono na biografia de Volpi, de não incluir no catálogo quadros pintados depois de 1984, quando, ainda de acordo com o colecionador, a filha mais velha do pintor, Eugênia Maria, herdeira e inventariante, teria passado a dificultar o acesso de amigos próximos ao pai, entre eles o colecionador e advogado José Basano Neto. Ele conheceu Volpi nos anos 1970 e morava no mesmo bairro, o Cambuci. Preocupado com o futuro de sua coleção de Volpis, foi Basano quem sugeriu a catalogação de sua obra, cuja autorização foi formalizada nos anos 1980, segundo Mastrobuono.

“Algum tempo depois, Volpi adoeceu e começaram a sair do ateliê quadros duvidosos, provocando um refluxo na demanda das pinturas do artista”, conta. Num leilão realizado em 1993, que repercutiu na imprensa, o valor das obras de Volpi despencou, o que explica a razão da urgência da catalogação para evitar a repetição do mesmo fenômeno hoje, quando a cotação do pintor está no topo, com trabalhos que chegam a valer até R$ 12 milhões.

“Existem ainda hoje falsificações grosseiras e quadros de origem duvidosa que nos chegam diariamente para análise”, diz Mastrobuono.
Analisando o acervo hereditário, a juíza Vivian Wipfli, conta Mastrobuono na biografia de Volpi, destituiu da inventariança a herdeira Eugênia Volpi e nomeou um inventariante dativo em 2010. Ela recorreu da decisão, que, apesar disso, foi mantida pelo Tribunal de Justiça. O processo de inventário de Volpi permanece aberto. Por meio de um alvará judicial, o Instituto Alfredo Volpi, com a finalidade de preservar e divulgar a obra do artista, tem agora poderes para continuar a catalogação da obra do pintor e avaliar a autenticidade de seus trabalhos.

Indignação

Isso provoca reações que não são difíceis de entender num mercado que movimenta milhões. Mastrobuono conta que já recebeu a visita de marchands indignados com a recusa de o instituto incluir quadros sob suspeita no catálogo. “Quem conviveu com Volpi identifica logo uma falsificação, pois conhece perfeitamente sua paleta, pincelada e sua linguagem pictórica”, justifica o colecionador. “Como ele mesmo preparava esses pigmentos, é possível localizar até sua origem”, conclui, evocando o convênio firmado entre seu instituto e o departamento de Física da USP para analisar materiais usados nos quadros de Volpi.

Algumas falsificações são tão rudimentares que trazem até a assinatura de Volpi na parte frontal de telas produzidas após o breve namoro do pintor com o concretismo (1953), quando este passou a firmar seu nome atrás delas. Em casos mais escandalosos, os falsificadores até esquecem as várias demãos de carbonato de cálcio dissolvidas em cola que Volpi passava em suas telas para preservar a têmpera a ovo.

Segredo

A “vitalidade criativa” de Volpi, segundo Mastrobuono, “não desacelerou até os 82 anos, quando sua vista cansou e ele deixou de aceitar encomendas de quadros pequenos em 1978”. Em 1984, implantou um marca-passo. Algum tempo depois, diz Mastrobuono, sua mão “progressivamente tremeu”. Investigando as páginas do espólio do artista, o advogado Pedro Mastrobuono, um dos fundadores do Instituto Volpi e filho de seu presidente, descobriu que a certidão de óbito do pintor desvendava um segredo: ele morreu de Alzheimer.

Isso, conclui Mastrobuono, explica a razão das dificuldades que os volpistas passaram a enfrentar para ver Volpi, mantido à distância dos amigos, e testemunhar sua produção – daí a decisão de não incorporar as telas datadas de 1985 até a morte do pintor. “Quem preferir comprar esses quadros, edite outro catálogo”, recomenda o colecionador.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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