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Estada em Hong Kong muda planos do Blur para novo álbum

Seriam treze horas dentro de um avião, voando de Hong Kong a Londres. Outras dezessete horas para voltar a Ásia, em Jacarta, na Indonésia, sete dias depois. Os integrantes do Blur tentavam se acostumar ao fuso horário na costa sul da China e, para piorar, o baterista Dave Rowntree sofria com um resfriado persistente. Foram dois shows cancelados e uma das maiores bandas do Reino Unido nos últimos 20 anos se viu presa, a quilômetros de casa.

Rowntree, em entrevista por telefone ao jornal O Estado de S. Paulo, enumera as razões pelas quais o grupo decidiu permanecer em Hong Kong depois do show realizado no AsiaWorld Expo, em 6 de maio de 2013. Na ocasião, as apresentações seguintes, em Taiwan, ainda na China, e Tóquio, no Japão, foram canceladas e a próxima e última parada da perna asiática da turnê seria na Indonésia, oito dias depois.

O curioso é como intempéries em série foram capazes de fazer o que anos de súplicas dos fãs não. O próprio baterista vacila ao tentar encontrar uma justificativa firme o bastante para explicar a decisão do Blur em voltar a gravar um disco de inéditas. O certo é que algo aconteceu, do outro lado do mundo, e foi capaz de ascender a criatividade de um grupo que não lançava um álbum com a formação original desde 1999, com o 13 – o disco seguinte, Think Tank, foi concebido sem a participação Graham Coxon.

Aquela estadia em Hong Kong foi capaz de concretizar o que até mesmo os integrantes da banda consideravam impossível: a criação de The Magic Whip, álbum que recentemente chegou ao Brasil pela gravadora Warner Music. O histórico do Blur não era favorável para que aquelas sessões em estúdio se transformassem nas 12 faixas que estão no novo álbum, o oitavo de uma carreira que completa 27 anos de existência.

“Era uma grande brincadeira: estávamos fazendo um disco em uma semana. Mas não sabíamos se seria viável”, relembra o baterista. A ideia de passar uma temporada no estúdio, em vista que voar de volta para casa era inviável, veio de Damon Albarn, vocalista da banda e um dos líderes criativos do grupo ao longo dos anos, uma função dividida com Coxon em maior e menos intensidade ao longo dos anos.

Foram “cinco longos dias”, como conta Rowntree. O quarteto permaneceu enclausurado ali e, ao sair, Albarn, Coxon, Rowntree e o baixista Alex James haviam reunido 40 horas de material bruto, experimentações, tentativas e erros. “Era impossível não ficar animado com aquilo que estávamos vivendo. Era muito excitante. Estávamos gravando em Hong Kong, entende?”, diz o baterista.

Rowntree conta que não havia animosidade entre Albarn e Coxon ou mesmo uma rivalidade criativa, algo que minou a carreira do Blur em alguns momentos. Em 1996, por exemplo, a banda quase chegou ao fim com os problemas de Coxon com o excesso de ingestão de álcool e a animosidade dele quanto a sonoridade característica do Britpop da primeira metade daquela década. Já seis anos depois, Coxon se internou em uma clínica de reabilitação para tratar de alcoolismo e, quando voltou para as gravações do disco Think Tank, a relação com o grupo já não era mais a mesma. Ficou apenas cinco dias com os companheiros e foi avisado pelo empresário da banda de que a presença dele ali não estava ajudando no processo criativo. Coxon deixou o Blur naquele ano e só se juntou ao grupo novamente para uma turnê de reunião em 2009.

The Magic Whip nasceu naqueles dias de maio de 2013, mas foi praticamente esquecido por três dos quatro integrantes da banda. Na época, Albarn chegou a anunciar que aquelas sessões em Hong Kong seriam o início de um novo disco do Blur, mas como nada mais foi dito sobre o tema, os fãs do grupo imaginaram se tratar de mais uma tentativa frustrada da banda em voltar ao estúdio. Não seria a primeira vez.

Em 2012, o Blur foi chamado para voltar ao gigantesco Hyde Park, em Londres, para realizar show comemorativo de encerramento dos Jogos Olímpicos. A banda convocou William Orbit, produtor responsável pelos então mais recentes trabalhos deles, 13 e Think Tank, e partiram para o estúdio. Orbit, pelo Twitter, atualizava os fãs sobre as gravações. Não muito depois, projeto já foi descontinuado. O que seria um disco completo foi transformado em dois singles, The Puritan e Under The Westway. Uma frase publicada pelo produtor na rede social explicou a razão pela qual as gravações foram interrompidas – e valoriza o esforço da banda em fazer as sessões na China valerem a pena. “O (novo disco do) Blur poderia ser bom. Mas Damon, tão brilhante e talentoso, é um m… com o resto do Blur”, escreveu.

Coxon, desta vez, não queria deixar que aquele material se perdesse. Ele, mais do que qualquer um dos outros integrantes do Blur, parecia ter algo a provar. Não tão versátil quando Albarn, amigo de infância com quem fundou a primeira banda, Coxon conseguiu criar uma carreira solo consistente. Ainda assim, a saída do grupo, da forma como aconteceu, ainda era algo que precisava ser resolvida.

“Depois da turnê, cada um de nós voltou para sua respectiva vida”, conta Rowntree. “Mas Graham se voluntariou para ouvir aquele material.” Em setembro do ano passado, o guitarrista chamou o produtor Stephen Street, responsável pela fase britpop do grupo, com os discos Modern Life Is Rubbish, Parklife, The Great Escape e Blur, para ajudá-lo a dar coerência nos devaneios sonoros de Hong Kong.

Mostrou alguns rascunhos para os outros três integrantes e Albarn, principalmente, se empolgou com o material. Decidiram, por fim, homenagear a cidade que foi responsável por fazer o Blur voltar à ativa, criativamente falando. Damon compôs canções sobre a estadia da banda ali, sobre “quatro deles em uma terra estranha”, e aceitou adiar o projeto de retornar com o Gorillaz para o ano que vem.

“Começar a gravar um disco é sempre a parte mais excitante do processo todo”, resume o baterista. “Quando fazemos músicas novas, as dificuldades parecem lavadas e vão embora. Sabe, é como se fosse mágica.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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