Aos 94 anos, a pintora paulista Jandyra Waters continua ativa, retomando em obras mais recentes questões que pareciam ter ficado no passado. O visitante da retrospectiva Ritmo do Tempo, que será aberta nesta quinta, 27, às 19 horas, na Galeria Almeida & Dale, vai observar, por exemplo, semelhanças formais entre pinturas do fim dos anos 1970 e telas pintadas este ano. Nada a estranhar. Não se trata de simples retomada nostálgica, mas de aprimoramento.
O diálogo entre as pinturas do passado e as atuais é tão intenso que a curadora Denise Mattar, na mostra, só segue a ordem cronológica até a década de 1960, quando Jandyra partiu para o abstracionismo informal, após um longo período figurativo, que começou em 1947, em Sussex, Inglaterra, onde morou e teve suas primeiras lições de pintura.
O próprio título da exposição foi escolhido pela curadora em razão da existência de um poema da artista que trata das relações temporais, publicado pela pintora em 2001 – ela escreveu livros lançados por editoras como a José Olympio. No poema, intitulado Sempre, ela conclui que o tempo é pouco mais que uma abstração – “sempre é também agora”, escreve, reiterando a suspeita do físico inglês Stephen Hawking de que tudo acontece simultaneamente – e de uma vez só.
Assim, a justaposição de planos que a curadoria evidencia, ao colocar lado a lado telas mais antigas e atuais, tem como objetivo combinar essas pinturas dentro de um novo conceito, que vai além da filiação de Jandyra Waters ao abstracionismo geométrico. A curadora Denise Mattar suspeita que, se não fosse tão independente, a pintora poderia ter facilmente se integrado ao movimento neoconcreto. “A construção dinâmica de seu trabalho tem algo a ver com a liberdade cromática de um Aluísio Carvão”, observa, comparando-a ao pintor paraense que, residindo no Rio, em 1959, assinou o Manifesto Neoconcreto ao lado de Lygia Clark, Lygia Pape e outros.
Em 2016, Jandyra vai completar 60 anos de sua primeira exposição individual, realizada em 1956, quando foi aberta a Exposição Nacional de Arte Concreta, ano zero do concretismo na arte brasileira. Ela passou ao largo, mas não despercebida pelo crítico Theon Spanudis, que apoiava os artistas neoconcretos. Spanudis notou que a pintura de Jandyra trazia algo inédito ao abstracionismo geométrico, certo esoterismo – talvez associado a uma obsessão pela simetria axial, que refletiria bem mais que uma simples imagem espelhada ao espectador.
A observação de Spanudis ganhou ressonância nos anos 1980, quando a artista apresentou uma série tridimensional chamada Templos (1984), cujas peças, hoje raras, constituem uma leitura muito pessoal dos princípios da geometria sagrada e remetem vagamente aos recortes matissianos. “Não vejo esses trabalhos como representações de caráter religioso”, diz a curadora Denise Mattar.
Outra série rara presente na retrospectiva diz respeito à passagem de Jandyra pelo abstracionismo informal, representada por três pinturas de cores sóbrias, que contrastam violentamente com as cores fortes e as linhas diagonais das outras telas da mostra.
Há poucas pinturas figurativas na retrospectiva, todas realizadas no Brasil, em 1957, já sob orientação do pintor Takaoka, de quem Jandyra foi aluna. Resta esperar que os museus com obras suas no acervo (MAC, MAM, Pinacoteca) sigam o exemplo da exposição e exibam essas pinturas ao público. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.