Variedades

Larrain acerta de novo com filme sobre velhas culpas da igreja e da ditadura

Pablo Larrain conversa com o repórter pelo telefone. É o diretor chileno de Tony Manero, No e El Club/O Clube, que estreia nesta quinta, 1º. Larrain está nos EUA, acompanhando exibições especiais de seu novo filme e buscando apoio para o próximo, Jackie, que será uma produção cara, com Natalie Portman como a viúva do ex-presidente John F. Kennedy, no período imediatamente posterior ao assassinato, em Dallas.

O Clube aborda um tema espinhoso. O título refere-se menos a uma área de lazer que a um retiro no qual a Igreja isola religiosos que se tornaram indesejáveis e precisam sair de circulação. O caso específico de que trata o filme é de um padre que cometeu abuso infantil, mas, como sempre na obra do autor, existem reminiscências da ditadura militar. Um velho padre ligado ao aparelho de repressão do regime. “É curioso como essas duas linhas dramáticas pertenciam a diferentes roteiros que estava escrevendo. Terminaram por se interligar. Pode parecer estranho, mas não é. A Igreja e o Exército são organizações diversas, mas baseadas em rigorosos códigos de disciplina. E, no limite, o que me interessou foi a pavorosa solidão desses padres e freiras. O título não deixa de ser irônico. Aquilo é tudo, menos um clube, pelo menos não no sentido leve que se atribui a um clube.”

Larrain admite que fez muita pesquisa para escrever e dirigir O Clube. “Dada a importância da Igreja Católica em nossa cultura, seria leviano tratar o tema de forma inconsequente. Todo mundo tem opinião formada e é contra o abuso, mas eu não fiz o filme para condenar, atirar pedras. Fiz para tentar entender, o que é sempre mais difícil.” Ele reencontra seu ator fetiche, Alfredo Castro, presente em todos os seus filmes desde Fuga, em 2006. “Alfredo é um grande ator e um amigo. Na verdade, foi meu professor, no começo de minha carreira. Um dos meus prazeres nessa profissão é propor-lhe coisas difíceis que sei que ele vai fazer muito bem, sempre me surpreendendo com uma compreensão dos personagens que vai além do meu olhar.”

O repórter comenta que, desta vez, o distribuidor – a Imovision – não quis esperar pela Mostra e está estreando o filme quase um mês antes. O Clube foi premiado no Festival de Berlim, em fevereiro. Estreou em maio, no Chile. “Ficamos dez semanas em cartaz, o que foi muito bom.” E a crítica? “Foi respeitosa. Às vezes, temos posições conflituosas. Os críticos fazem o trabalho deles, eu faço o meu. Eventualmente nos ignoramos, o que é melhor para ambas as partes.” Ele fica feliz de saber que o Chile estará representado na Mostra por Patricio Guzman e que ele vai receber um prêmio de carreira, além de apresentar seu novo filme, El Botón de Názcar. “É um maestro, um mestre. Patricio tem essa capacidade de juntar coisas aparentemente disparatadas, que não dão liga, e fazer filmes belíssimos. A luz das estrelas e o deserto, as populações indígenas do litoral, a água do mar e um botão de nácara. É emocionante ver como ele junta essas coisas para dar testemunhos muito verdadeiros sobre o horror da ditadura. É como se nos lembrasse, sempre – No se olviden, não se esqueçam.”

O diretor reflete sobre como são curiosos os caminhos da criação. “Já disse que tinha dois roteiros e não conseguia me decidir por nenhum. Também não conseguia o dinheiro. Um dia, desabafei com meu irmão, que me ajuda a produzir. Estava cansado de ser um cineasta desempregado, ainda mais depois de No, que foi tão bem. Queria algo urgente. Em três semanas fundimos as duas histórias e levantamos a produção, meio na guerrilha. Os atores nunca tiveram acesso ao roteiro. Entregava-lhes as cenas antes de filmar. Todo mundo teve de se adequar. Os nervos andavam à flor da pele. Poderia não ter funcionado, mas funcionou. A história ficou mais verdadeira, como queria.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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