Variedades

Renato Russo, 19 anos sem o ídolo que fez muitas cabeças na minha geração

Pensei muito sobre o que escrever neste 11 de outubro, data que marca a partida de Renato Russo desta vida. Foi numa sexta-feira de 1996, que ele partiu jovem demais. Não tenho muito mais o que falar sobre ele. Dizer sobre o quanto foi importante em minha formação? Sobre a entrevista que fiz com ele em 1994? Sobre os três shows que assisti de sua Legião Urbana, dois deles viajando centenas de quilômetros? Sobre o choro que correu de meus olho durante todo o final de semana de solidão e dor 19 anos atrás? Não. Nada disso. Preferi republicar três textos que fiz nos últimos anos, que mostram um pouco desta nossa realação. 
 
Quem foi Renato Russo
Hoje, o cantor e compositor que fundou a seminal banda de rock Legião Urbana, Renato Russo, estaria com 55 anos.
 
Vítima de complicações decorrentes da aids, Renato tinha apenas 36 anos, mas já havia inscrito seu nome na história do rock nacional. Ele ocupava a 25.ª posição na Lista dos Cem Maiores Artistas da Música Brasileira da revista "Rolling Stone", em outubro de 2008. Homossexual assumido desde os 18 anos, ele jamais confirmou estar com a doença.
 
Com a Legião, Renato Russo, que nasceu no Rio, deixou oito álbuns de estúdio, cinco ao vivo e alguns lançados postumamente, além de vários contos, entre outros escritos.
 
Gravou também três discos solo e cantou com Erasmo Carlos, Cássia Eller, Herbert Vianna, Adriana Calcanhoto, Paulo Ricardo, Leila Pinheiro, Biquíni Cavadão, 14 Bis e Plebe Rude, entre outros. Uma das mais bem-sucedidas bandas do País em 14 anos de atividade, a Legião vendeu mais de 25 milhões de discos. 
 
Em 1973, Renato e sua família foram morar em Brasília, e lá, em 1978, ele formou a banda Aborto Elétrico, na qual mostrava sua predileção pelo punk inglês. São desse período músicas como "Tédio", "Que País É Esse?" ou "Veraneio Vascaína".
 
Foi em homenagem ao inglês Bertrand Russell e aos franceses Jean-Jacques Rousseau e Henri Rousseau, que Renato Manfredini Júnior adotou o sobrenome artístico Russo e se tornou um mito para várias gerações de fãs da Legião, que o veneram como a um deus.
 
Sua trajetória inspirou filmes como "Faroeste Caboclo" (2013), dirigido por René Sampaio, e "Somos Tão Jovens" (2013), de Antonio Carlos da Fontoura. Em relação ao filme de Fontoura, fica claro que a "música de Russo esteve presente em fases agudas da história recente do Brasil e a comentou. Mesmo os que pensam que não conhecem sua música, acabam por reconhecê-la, pois em muitos momentos ela se tornou uma trilha sonora do País, tão em crise quanto o músico", como afirma o crítico do jornal O Estado de S.Paulo Luiz Zanin Oricchio.
 
À frente da Legião Urbana, Renato Russo e sucessos como "Pais e Filhos", "Eduardo e Mônica", "Geração Coca-Cola", "Tempo Perdido", "Eu Sei", entre outros, viraram objeto de culto de fãs de todas as idades. 
 
Bom, já falamos muito de quem foi ele: Seguem textos de minha autoria e as respectivas datas de publicação. 
 
Mentir pra si mesmo é sempre a pior mentira
Publicado em 2/4/2011
 
Em "Quase sem querer", minha preferida entre tantas preferidas músicas de Renato Russo, o mestre – no contexto da canção – insere essa passagem que, vira e mexe, recorro mesmo que apenas nos meus pensamentos, quando lido com uma das coisas que mais me irritam: a mentira. Nesse sentido, "mentir pra si mesmo é sempre a pior mentira" soa como um mantra, uma das maiores verdades que já ouvi.
 
Os enganadores, que julgam se dar bem com pequenas ou grandes inverdades, talvez abominem essa frase. Afinal, acreditam ser felizes, independente de pregarem a verdade ou não. Pode ser. Mas ainda prefiro acreditar que "mentira tem perna curta".
Ainda nessa linha de citações, também impossível deixar de lembrar de Abraham Lincoln, presidente norte-americano entre 1861 até 1865, quando foi assassinado. "Você pode enganar pessoas todo o tempo. Você pode também enganar todas as pessoas por algum tempo. Mas você não pode enganar todas as pessoas o tempo todo".
 
Mas por que ficar falando de mentiras? Por que esta sexta-feira foi 1º de abril, instituído como o dia da mentira. Coincidentemente na véspera, eu chamava a atenção de meu filho, que – pela própria idade (9 anos) e convivência com amiguinhos – ensaiava algumas mentirinhas, quase que inocentes.
 
Eu lhe falava, com toda a paciência que um pai deve ter (aprendi isso com o meu) que ele deve confiar em nós. Que essas coisas, aparentemente sem importância, são importantes sim. Que ele não precisa tentar se esquivar de pequenos erros que eventualmente comete. Que isso faz parte da vida. Que é melhor, sempre, custe o que custar, seguir o caminho da verdade.
 
Bastante desconfiado, com medo de sofrer represálias, tentou contrapor. Nestes momentos, joga no ar a velha máxima, em um tom quase choroso: "mas você ia brigar comigo". Não importa. Melhor eu brigar com você hoje do que você crescer envolto em mentiras.
E, mais uma vez, Renato Russo volta à minha mente. Em outra preciosidade de sua obra, ele arremata: "um dia pretendo tentar descobrir porque é mais forte quem sabe mentir. Não quero lembrar que eu minto também…" É, eu sei.
 
 
Mentir (e errar) é fácil demais
Publicado em 9 / 7 / 2011
 
Uso de novo o trecho de música do inesquecível Renato Russo para tocar em um tema que muita gente não gosta mas faz parte de nossas vidas: a mentira. E, justamente por ser fácil mentir, ela é tão presente. Aliás, alguns se escondem atrás de suas incompetências, proporcionando inverdades, plantando informações falsas, só para esconder suas próprias deficiências.
 
Parece ser inerente ao ser humano – há exceções – buscar nos outros as explicações para seus próprios fracassos. Não é difícil lidar com essas situações a todo o tempo. Repare como perturba o fato de alguém, que você tem a convicção de que errou, ficar argumentando, buscando justificativas em outrem para minimizar suas falhas. Isso é o que a gente mais esbarra no dia-a-dia. É aquela velha história. “Eu errei. Eu menti. Mas é que…”. Justamente, o “mas é que” pode ser a deixa daqueles que fogem à realidade.
 
Nesses momentos, seria tão bom se as pessoas assumissem suas falhas. Ao admitir erros e mentiras, quem sabe não voltariam a repetir as mesmas mazelas. Mas a sociedade vivencia isso e até propaga essa máxima, arraigada em nossa cultura.
 
Eu não me lembro de ter tido uma disciplina dessas na faculdade de Jornalismo. Mas – pelo tanto que nossos nobres coleguinhas utilizam esse tal de “mas é que” – dá até para imaginar que isso faz parte do currículo. Sou um jornalista, formado há exatos 20 anos (isso é tema para um texto em breve), e me orgulho demais desta profissão.
 
Mas é que… como tem sujeitos prepotentes, despreparados e senhores de si entre nós… São professores de Deus, para não dizer outra coisa. Um sabe mais que o outro. É um tal de se achar que dá até medo. Ainda mais quando a gente pensa que são esses seres “iluminados” os responsáveis por bem informar a população.
 
O tanto de resquícios ideológicos e partidários que carregamos daria para povoar todo um país de grandes dimensões territoriais. E não me excluo disso, não. Afinal, somos humanos – e como tais – erramos. O problema talvez seja exatamente esse. Alguns se julgam acima dos céus.
 
Aí, quando isso ocorre – perder a sensação do que é céu e do que é terra – a imprensa erra. Erra ao ignorar a mente das pessoas de bem. Erra ao engolir versões oficialescas de fatos mal apurados ou que interessem ao poder dominante. Erra quando se deixa usar por esses interesses. Afinal, errar – como mentir – é fácil demais.
 
FAROESTE CABOCLO FATURA EM CIMA DE RENATO RUSSO
Publicado em 01/06/2013
 
Quando comecei a curtir Legião Urbana, em meados dos anos 80, muita gente torcia o nariz. Dizia que era só mais uma banda de rock que desapareceria como tantas outras… Renato Russo era um gênio. Eu não tinha dúvidas e passei a acompanhar de perto a trajetória do quarteto, depois trio.
 
Era daqueles que comprava o LP no dia que chegava nas lojas, viajava para assistir shows dentro de minhas possibilidade etc e tal. Quando ouvi Faroeste Caboclo pela primeira vez, percebi que Renato era um pouco mais do que eu imaginava. Nove minutos de música sem qualquer repetição. Uma história e tanto. Um verdaeiro roteiro de filme policial.
 
Lembro que, no meio das baladas em mesas de bar, atormentava meus amigos com minha voz desafinada, imitando Renato e atacando de Faroeste do começo ao fim, sem esquecer de nada da letra. Era motivo de sarro, é lógico. Mas não me intimidava não.
 
O tempo passou, me formei jornalista e tive a honra de entrevistar Renato Russo em 1994, quando ele trabalhava o disco solo Stonewall. Foram dois telefonemas e quase uma hora de conversa prá lá de descontraída quando eu misturava um pouco de fã com o profissional. Quis morrer quando o editor do caderno de Cultura do jornal Shopping News abreviou minha matéria a uma coluna no canto de uma página secundária. Ele achava o Legião "uó".
 
Quando Renato se foi "cedo demais" em 1996, fiquei de luto. Lembro que amigos me ligavam para me dar os pêsames. Chorei muito mas me levantei e continuei comprando os novos lançamentos da Legião que ainda foram colocados no mercado. No dia do lançamento de "Somos tão jovens" eu estava lá no cinema e, como escrevi neste espaço, adorei a forma como abordaram o início da carreira de Renato.
 
Nesta sexta-feira, meio de feriado, mais uma vez entrei na fila do cinema para assistir logo de cara o Faroeste Caboclo, imaginando que se tratava da história contada por Renato Russo. Mas – apesar de bem feito e ser bom – fui percebendo que o filme apenas se baseou na obra assinada pelo Legião, aproveitando-se de forma inteligente da lenda que se tornou um dos maiores astros do rock nacional.
 
Repito: o filme é bom. Mas não é fiel à música. Muitos dirão que é apenas uma adpatação. E é mesmo. Mas seria possível sim ficar menos em cima das drogas e contar um pouco mais sobre a trajetória de João de Santo Cristo. Muitas passagens da música são completamente ignoradas. Outras são fiéis. Mas o saldo é um exagero de exposição de maconha e cocaína, além de excesso de violência.
 
Não queria um filme feijão com arroz não. Mas creio que – já que queriam aproveitar o sucesso de Renato Russo – o Faroeste Caboclo no cinema poderia ser melhor. Choro de fã? Pode ser. Mas quando se exagera demais em cima de um tema corre-se o risco de errar. João de Santo Cristo de Renato Russo não foi apenas traficante. O do filme vive em função das drogas. De cabo a rabo.
Resumo da ópera: o filme tem muitas qualidades. O maior erro, porém, é explorar em demasia ser uma obra de Renato Russo. A música é muito melhor.
 

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