Em meio ao burburinho da São Paulo Fashion Week, o Masp inaugura uma exposição que remete aos primórdios dos desfiles no Brasil. A mostra Arte na Moda: Coleção Masp Rhodia, que abre ao público sexta, dia 23, traz 79 peças, entre vestidos, macacões e conjuntos, com estampas criadas por grandes artistas contemporâneos: Hércules Barsotti, Willys de Castro, Alfredo Volpi, Carlos Vergara e Nelson Leirner. Todas foram doadas ao Masp em 1972 e produzidas entre 1960 e 1970 por encomenda da Rhodia, indústria química francesa, para divulgar seus fios de fibra sintética, então recém-chegados ao Brasil.
“Havia necessidade de aproximar o consumidor brasileiro desse material, já que nossa tradição no algodão era forte”, afirma Tomás Toledo, curador da exposição ao lado de Patrícia Carta e Adriano Pedrosa, diretor artístico do Masp. “Para isso, a estratégia foi criar um desejo de imagem e de moda, com roupas de modelagem atual, semelhantes às das passarelas internacionais.”
Sob o comando do publicitário italiano Lívio Rangan, a empresa atuou em duas frentes: em uma, firmava parceria com os maiores estilistas do Brasil na época, como Dener, Guilherme Guimarães e Ugo Castellana, italiano radicado no País. Em outra, investia na colaboração de artistas plásticos.
As coleções da Rhodia, com mais de 100 modelos cada, eram apresentadas na Fenit, a Feira Nacional da Indústria Têxtil, considerada revolucionária para a moda brasileira. “Era um sucesso. As pessoas queriam saber onde comprar aquelas roupas com estampas do Barsotti e do Volpi, mas elas não eram comercializadas”, diz Toledo. Diferentes correntes artísticas do período estão contempladas nas peças da exposição. O pop aparece nas criações de Nelson Leirner e Carlos Vergara e a abstração aparece nas de Manabu Mabe e Antonio Bandeira, enquanto o concretismo vem representado por Willys de Castro e Hércules Barsotti.
Uma das roupas mais conhecida, aliás, é de autoria de Barsotti. Sua obra op art em preto e branco estampa um vestido em camadas, desenhado por Alceu Penna. “O modelo foi criado em 1966 para uma coleção cujo tema era Brazilian Fashion Team, por causa da Copa do Mundo da Inglaterra naquele ano”, conta a historiadora Maria Claudia Bonadio, autora do livro Moda e Publicidade nos anos 1960, que traça um panorama do trabalho de Lívio Rangan na Rhodia.
Depois dos desfiles da Fenit, as roupas apareciam em grandes editoriais, de até 60 páginas, nas revistas Manchete, Cruzeiro, Claudia e Joia. “O ensaio com o vestido, inclusive, de Barsotti foi fotografado em Londres”, afirma Maria Claudia. “Da Europa ao Japão, essas peças rodaram o mundos.”
Além de criar uma cultura de moda no Brasil, elas também representavam a identidade brasileira no mundo. Por isso, havia a preocupação de se aproximar de nomes que retratassem a cultura popular brasileira – destacam-se aí as estampas assinadas por Aldemir Martins, Carybé, Francisco Brennand, Genaro de Carvalho, Lula Cardoso Ayres, Manezinho Araújo, Gilvan Samico e Carmélio Cruz.
Trata-se da primeira vez que a coleção completa vem a público desde que passou a pertencer ao Masp. “O (Pietro) Bardi sempre teve muito interesse em moda, mas curiosamente acabou não trabalhando com esse acervo”, diz Toledo. Mais de 40 anos depois, os trajes precisaram ficar semanas em cabides, assentando com o próprio peso (já que são de tecido sintético e não podem ser passados), para finalmente ocuparem todo o segundo subsolo do prédio do Masp, ao lado de fotografias dos desfiles da Rhodia na Fenit e de documentos históricos.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.