Miguel Faria Jr. lembra-se – “Nos anos 1960, o pessoal do cinema e da música era muito próximo, no Rio. Frequentávamos os mesmos bares, os mesmos restaurantes.” Vem daí a longa amizade – 50 anos – do diretor Miguel Farias Jr. com o cantor, compositor e escritor Chico Buarque de Holanda. Ela culmina agora no documentário Chico – Um Artista Brasileiro. Miguel documenta o artista que tem fama de ser reservado. Deve ser por conta da proximidade, que produziu confiança. Chico diz coisas tão íntimas que você fica pensando. Como ele conseguiu? Ele, Miguel.
Chico fala da ex-mulher, Marieta Severo, de quem está separado há 16 anos. Diz que teve vários amores depois, mas as outras passam. Marieta foi a companheira em momentos decisivos, a mãe de suas filhas, a interlocutora. É o de que ele mais sente falta. Marieta era a primeira ouvinte das músicas, a primeira leitora dos textos. E Chico tinha absoluta confiança nela, no seu gosto, na sua sensibilidade. Havia o risco de que Chico – Um Artista Brasileiro fosse chapa branca. Miguel Faria Jr. foge a essa armadilha, até porque o próprio Chico se recusa a ser objeto de uma hagiografia. “Eu diria que é antes a humanização do mito”, define o diretor.
Chico, o filme, estreia nesta quinta, 26, em salas de todo o Brasil, depois de abrir o Festival do Rio e integrar a programação da Mostra. Há quase 40 anos, em 1977, Miguel Faria Jr. contactou o amigo Chico para que ele fizesse a trilha de Na Ponta da Faca. A parceria não se concretizou, mas dois anos depois Chico compôs duas canções para a trilha de República dos Assassinos, que Miguel adaptou do livro de Aguinaldo Silva, ficcionalizando a ligação de setores da repressão do regime militar com o Esquadrão da Morte. Tarcísio Meira faz o sinistro Mateus Romeiro e, em torno dele, gravitam a personagem de Sandra Bréa e a travesti Eloína, interpretada por Anselmo Vasconcelos.
Para as duas, Chico compôs canções que ultrapassaram seu significado na trilha e ganharam vida própria. Não Sonho Mais, o tema de Eloína, e Sob Medida, o de Sandra Bréa. Foi há 38 anos. E agora o documentário. Chico descontraído e exposto como você nunca viu. Miguel Faria Jr. que já foi diretor maldito, lotou os cinemas com a ficção O Xangô de Baker Street e o documentário Vinicius, sobre Vinicius de Moraes. Ele reflete – o documentário sobre Chico é um desdobramento do outro, sobre Vinicius. A surpresa talvez seja a forte conexão paulista na vida e obra de Chico Buarque. Chico, o artista brasileiro, é também Chico paulista. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.