Variedades

Reflexão sobre Chico Buarque é do diretor Miguel Faria Jr.

Chico paulista? “O pai dele, Sérgio Buarque de Hollanda, foi um intelectual com a cara e a formação de São Paulo. Chico passou a juventude na cidade. Estudou, fez amizades em São Paulo. Isso é para toda a vida. E onde foi que ele estourou? No Festival de MPB da Record, em São Paulo. A ligação é forte, sim.” Quem avalia é o diretor Miguel Faria Jr. Amigo, há bem uns 50 anos, de Francisco Buarque de Holanda, o Chico, Miguel bateu muita bola com ele, empinou muito caneco de cerveja. E acompanhou sua evolução. “A obra de Chico reflete as várias fases que ele viveu – e as várias fases do Brasil. Tudo isso repercute no público, que dá o troco. Chico se tornou mítico.”

Havia um pouco de tudo isso em Vinicius de Moraes, outra figura emblemática – poeta, cantor, compositor, crítico de cinema, diplomata – que Miguel Faria Jr. também documentou, em outro belo trabalho, Vinicius. Se não é o documentário mais bem-sucedido de público da história do cinema brasileiro, Vinicius com certeza liderou a bilheteria do gênero numa fase em que o documentário já tinha prestígio, mas os números eram pequenos. Vinicius rapidamente ultrapassou 150 mil espectadores, foi o fenômeno de 2005. Miguel quis voltar à ficção e tentou adaptar Leite Derramado – de Chico. Seu projeto não vingou (mas o filme será feito pela Conspiração). A ideia do documentário sobre Chico, artista brasileiro (como Vinicius), começou a ser gestada.

Miguel levou a ideia ao amigo. Chico pediu alguns dias para pensar. Retornou dizendo que sim, mas não queria se envolver. Dava a entrevista, e só. Chegou a brincar. “Não vou nem querer ver pronto.” Com essa carta branca, incondicional, só restava a Miguel Faria Jr. seguir adiante. Ele começou a gravar as entrevistas no fim de 2013. Gravava, editava, definia o material para a pesquisa iconográfica. A pauta ia sendo definida nas conversas.

“Gravei cerca de 30 horas que abordam 70 temas.” Vida, obra, família, censura, por aí vai. Chico foi perseguido durante a ditadura, teve de se exilar. Tudo é contado, esmiuçado. Chico e seus heterônimos – Julinho da Adelaide, criado para driblar a censura.

Hoje, muitas histórias soam divertidas, mas na época… Se a música era dele, já estava proibida. Iniciava-se, então, um processo de negociação com a censura. Até que ponto mudar palavras podia alterar o sentido? Chico conta tudo, e em clima de descontração. “A grande diferença em relação a Vinicius é que ele está vivo”, esclarece o diretor. “Lá, eu precisava de outros para contar a história de Vinicius. Aqui, o próprio Chico conta. A fala é dele, mas o olhar é meu.” De posse das falas, havia outro problema. Como ilustrar o material?

“Não encontrei muita coisa no Brasil. O material era quase todo de vídeo, que vai desbotando com o tempo. A qualidade da imagem e do som não era boa.
Comecei a procurar fora do Brasil. Encontrei o material para o filme na Itália, na França, na Alemanha”, conta o diretor. Chico não participa do lançamento. “Seria cabotino” – é sua justificativa. Mas, no filme, ele reflete sobre sua formação, suas influências, sobre sua extensa produção. São 500 músicas, dez livros. Seu nome é trabalho. Chico preocupa-se com o tempo. “Os projetos demoram, a vida encurta.” Ele ainda tem livros para escrever, músicas para compor. É também o sentimento de Miguel Faria Jr. O diretor não tem mais fôlego para o futebol. “Chico tem”, conta. Miguel não dispensa a praia, que o revitaliza. No começo de sua carreira, ele fazia aqueles filmes cabeças, difíceis. “Sinto-me menos dono da verdade”, diz. “Amadureci.” E promete voltar à ficção. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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