Apesar do diploma em economia, a oscilação na Bovespa não tem a mesma importância que uma palavra que se encaixa nas melodias compostas por Sylvio Fraga. Filho do ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga – cujo rosto chama a atenção pela semelhança, o músico, que lança este mês o CD Cigarra no Trovão, garante não ter tanta familiaridade com o assunto que lidou na faculdade e em casa.
“Não me peça para explicar nada de taxa de juros, que eu não sei mesmo”, reforça o carioca de 29 anos, que nesta quarta, 9, faz show com seu quinteto no Espaço Tom Jobim, no Rio, e, dia 16, no Teatro Itália, em São Paulo, para mostrar as canções do segundo disco.
Mesmo com letras que descrevem cenas, como Ave da Cidade e No Canavial Alienígena, ele explica que os versos não são a primeira coisa que vem à mente. “Quando componho, começo pelo violão. Nunca escrevo a letra antes. Às vezes, acabo desistindo e passando para um parceiro.”
O disco tem composições com nomes excêntricos, como Fanta Laranja e Bolo de Jabuticaba, cujos versos se resumem ao título, repetido por um coro. O artista conta que não é deboche. “É mais uma alegria que um deboche. Você está em algum lugar e, de repente, alguém traz um bolo. É meio que uma festa”, diverte-se.
Outro fato divertido do CD é a foto da capa, em que aparece rodeado por galinhas. “Elas são reais. Compramos no Mercadão de Madureira (zona norte do Rio). Não confiei no cara que ia buscar. Falei que ele não poderia matá-las. Fiquei apegado”, confessa o cantor, que as levou para sua casa na serra fluminense. “Havia um galinheiro desativado. Elas estão felizes, tiveram 15 pintinhos. Agora, o pai de um amigo, arquiteto, desenhou um galinheiro novo, que vai começar a ser construído. Elas são super saudáveis, descobri um lugar que vende ração orgânica.”
Com fala mansa, ele vai incluir um cover do performático Michael Jackson (1958-2009) no show. “Vou cantar The Way You Make me Feel. Rola um samba no meio”, adianta, em entrevista ao Estado. Fraga diz não ter uma classificação exata para seu som, que recebeu uma avaliação curiosa ao passar as canções para um programa de computador. “Houve um erro e entrou como pop japonês. Achei ótimo. Acho que vão classificar como MPB por default. Chamo de canção brasileira de hoje.”
Quando cursava economia, o carioca comandou o Museu Antônio Parreiras, em Niterói, e entrou em crise. “Não aguentava mais aquele negócio. Não era minha vocação, minha natureza. Naquele momento, ficou claro que eu tinha de fazer o que era mais importante para mim: escrever poemas e fazer música. Aí, me mandei”, relembra ele, que foi fazer um mestrado em poesia em Nova York.
Sylvio Fraga já havia passado temporadas nos EUA desde a infância, o que o deixou fluente em dois idiomas. “Como escrevo em português, traduzia meus poemas. Entrei (no curso) escrevendo em inglês. Se é difícil escrever um poema em uma língua, imagina em duas. Decidi nunca mais escrever em inglês”, conta o artista, que já lançou dois livros com poemas.
Ele jura não ter tido problemas em casa ao mudar de carreira. “Não tive nenhuma pressão para fazer economia. Sempre me apoiaram. Hoje, acho que teria feito história. É uma educação mais ampla e sólida”, analisa o cantor, que convocou o pai no disco anterior, Rosto (2013). “Na casa dos meus pais havia um quarto de hóspedes que virou estúdio de ensaio. Meu pai é super musical, bem afinado, assovia bem. Precisava engrossar o coro e peguei a matéria prima local.”
Fraga sempre esteve no circuito Rio-Nova York-Brasília, onde morou. Agora, pretende rodar as cidades universitárias do Brasil com uma caravana cultural, em um caminhão que se transforma em palco com capacidade de som para um show com até 10 mil pessoas, para o qual buscou patrocínio.
“O objetivo são 80 shows. Vou levar a música para dentro do Brasil, a lugares que estão querendo absorver cultura. A gente vai fazer workshops com músicos locais e uma exposição sobre o pintor que estudo, Antônio Garcia Bento. Para cada biblioteca pública, a gente vai doar 50 livros de poesia contemporânea”, revela o músico, que vai começar pelo interior de Minas Gerais e São Paulo, mas pretende chegar ao Maranhão, em 2016.
Apesar de sempre ter lidado com informação sobre os rumos do Brasil em casa, Fraga diz não saber como o País sairá da crise. “Eu juro que não tenho a menor ideia. Coisas boas também acontecem, tem gente sendo presa, por exemplo. Por um lado, algumas coisas estão funcionando. Se o Eduardo Cunha for preso, vai ser uma coisa maravilhosa para o Brasil. Espero qualquer coisa no momento.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.