Variedades

Mostras tratam da relação de Willys de Castro e Montez Magno com poesia

Enquanto pesquisava os arquivos de Willys de Castro (1926-1988) no Instituto de Arte Contemporânea (IAC), o curador Gabriel Perez-Barreiro encontrou um papel onde estava apenas datilografado “lado a lado” – com o “a” levemente rebaixado entre as duas palavras. Na ocasião, foi como achar uma “pista” para conceber uma exposição com um tema específico sobre o artista – no caso, uma mostra que relaciona agora, em São Paulo, um expressivo conjunto de 12 Objetos Ativos criados pelo pintor de 1959 a 1962 e uma seleção de seus escritos, alguns deles, poemas inéditos.

Entre a escultura e a pintura, os Objetos Ativos de Willys de Castro são, estruturalmente, peças de madeira recobertas por telas com composições abstrato-geométricas pintadas a óleo e criadas para serem fixadas na parede. Nessas valiosas obras históricas, “os lados opostos estão sempre em diálogo, com uma das faces geralmente servindo de contraponto à outra por meio de um arranjo positivo-negativo”, como descreve Perez-Barreiro. Teria então o artista se referido a essas obras neoconcretas quando escreveu “Hoje você me viu/ e quando me descobriu/ (embora eu já soubesse/ quem era você/ antes que me tivesse visto)/ senti-me repentinamente/ achado por você e para mim”?

“Comecei a suspeitar que, para o Willys, uma expressão que é tão clara na geometria dos seus trabalhos tem também um lado romântico, emocional, metafísico”, diz Gabriel Perez-Barreiro sobre a pesquisa dos escritos do artista. Segundo o curador, o pintor, gravador, artista gráfico, compositor, “escrevia pouco, mas escrevia muito bem”, e, em sua escrita, seja de poesia, de prosa, ou anotações, destacam-se a questão da percepção e o tema do encontro (que pode ser com o outro ou do que aflora pelo ato de ver).

“Achei um paralelo bonito com o próprio processo do Objeto Ativo, em que a experiência com a obra é construída a partir do olhar e caminhar”, explica o curador da exposição Lado a Lado – Os Objetos Ativos de Willys de Castro, que será inaugurada nesta quarta-feira, 30, no IAC, abrigado no Centro Universitário Belas Artes.

Temperatura

Em 2012, o Instituto de Arte Contemporânea realizou uma exposição que contemplou os vários segmentos de criação do artista – e na época foi lançada uma edição com 32 poemas de Willys de Castro datados do período de 1953 a 1957. Entretanto, desta vez, a mostra Lado a Lado tem como foco “a delicada relação existente entre a forma e a percepção” na obra do pintor apresentada apenas pela exibição, em três espaços neutros e brancos, de 12 Objetos Ativos (quase todos de coleções particulares, exceto o trabalho em forma de cubo de 1962 da Pinacoteca de São Paulo) e 12 textos (datilografados ou escritos com uma “caligrafia muito clara”) do artista expostos em vitrines.

Para Gabriel Perez-Barreiro, diretor da Coleção Patricia Phelps de Cisneros, baseada em Nova York, os Objetos Ativos, que “mantêm uma codependência da pintura e da escultura”, são mais emblemáticos do neoconcretismo do que os Bichos de Lygia Clark. “Se você ler o Manifesto Neoconcreto (de 1959), as questões sobre a percepção, o objeto e a relação com o espectador, estão perfeitamente resolvidas no Objeto Ativo”, afirma. “Na minha leitura, a relação do olho e do corpo com o objeto é uma questão íntegra na obra de Willys antes do neoconcretismo se desenvolver em uma arte mais performática.”

Sendo assim, colocar, especialmente, os poemas do pintor mineiro – “austeros, feitos de poucas palavras”, contudo, com “uma temperatura mais quente” e abertos a uma “metáfora do relacionamento” – próximos desse conjunto de históricas criações é uma maneira de contribuir para um novo olhar para o Objeto Ativo.
Dois caminhos. Já na exposição Poemata, do artista pernambucano Montez Magno, de 81 anos, as seguintes palavras estão estampadas na parede da Galeria Pilar, como um haicai: “Há tempo de escrever/ e há tempo de pintar. E há tempo de não fazer/ absolutamente nada”. Como ele conta, “a poesia começou antes dos trabalhos visuais” em sua trajetória (a escrita, em 1950; a pintura, em 1954). Mais ainda, o prolífico criador considera que as duas atividades são “dois caminhos diferentes” em sua produção – “a poesia é mais conceitual e as outras coisas são mais expressionais”, define, por telefone.

“Tenho 12 livros escritos, 11 deles editados, e um inédito”, diz Montez Magno, explicando que o novo Crisálida é lírico e contém também poemas em espanhol. “Uma coisa que me chama a atenção no Montez é sua verve poética”, afirma Lisette Lagnado, curadora da mostra, inaugurada nesta quarta-feira, 30, para o público. A princípio, sua ideia era fazer uma exposição sobre a poesia visual do artista, mas Poemata (união de “poema” e “sonata”, sugeriu, como título, o pernambucano) abriu-se para um território muito mais amplo ao reunir trabalhos criados entre 1964 e 2015.

O sentido de poesia está presente na mostra menos por meio de palavras (leia abaixo um dos poemas que chegou a ser selecionado para ser exposto na individual) e mais no sentido de “síntese de linguagem”, explica Lisette Lagnado. Dessa maneira, pinturas recentes, com leves linhas verticais, como “acordes”, referem-se à ligação do artista com a música, mas são também homenagem à pintora Agnes Martin. Destaque ainda para as surpreendentes “maquetes de cidades eletrônicas” e outras obras que são reflexões sobre espaços e territórios.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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