Variedades

Filho de Cassia Eller, Chico faz sua estreia em SP

Chico Eller fala com certo desconforto, como se não quisesse nem falar nem estar ali, ao telefone, respondendo às perguntas de um desconhecido que só deve ter ligado para, ao final de algum pseudointeresse, saber de sua mãe, Cassia Eller. Ele cresceu assistindo ao assédio da imprensa e aos estrondos provocados por Cassia, o último grande acontecimento da música brasileira. A cobertura de sua trágica morte, em 29 de dezembro de 2001, teve impacto avassalador nos fãs e fez surgir o vazio que os tempos só retomam nas grandes despedidas. A atitude de Cassia jamais foi assumida com vitória por outras cantoras, mas sua maior semente já havia sido plantada, silenciosamente, no quintal de casa.

Chico Eller, o Chicão, já é Chico Chico desde que começou a dar os primeiros passos no Rio. Ele começou pequeno – ainda diria que é – em recantos que suportam uma cena carioca criativa e bastante jovem da música brasileira. Uma linhagem de libertação e miscigenação de gêneros que segue as mesmas diretrizes dos paulistas, embora radicalize menos no experimental.

Chico Chico, mesmo desconfortável, vai se soltando aos poucos, mas o começo é sempre difícil. Nesta quinta, 31, no Bourbon Street, ele faz sua primeira aparição em São Paulo ao lado do Mantuano Trio (com Pedro Fonseca no teclado, Miguel Dias no baixo de cinco cordas e João Mantuano na voz e violão). Vai mostrar, sobretudo, canções do fabuloso álbum 2×0, que gravou com a formação Vargem Alta, e algumas músicas novas. Se a migração entre bandas no início de carreira aponta para uma característica, uma inquietação? “Acho que sim. Não sei, estou me descobrindo”. Se existe alguma expectativa diferente ao vir a São Paulo? “Não sei. Acho que sim. Aí, tem uma galera que respeito muito.” Se sua música já não é mais a que se ouvia com o Zarapatéu ou com o Vargem Alta? “Cara, retomando aquele assunto… Vá ao show que você vai ver.”

Faz parte do jogo. E como jornalistas são pagos para tentar ver além das montanhas, vale a pena esperar até que as nuvens se dissipem. Chico Chico tem a força da natureza crua e criativa, sem grandes contornos nem acabamentos às ideias que lhe chegam primeiro. Sua voz traz a incontornável associação com Cassia e a forma como a coloca fica em algum lugar da agressividade descontrolada que vem sempre antes e da doçura que, como em Cassia, chegará adiante. Ele tem outro componente importante: é compositor.

Além de belas canções no álbum 2×0, como Caponav, Quanto Calor, Folhas da Praça Paris ou Nada Mais, seu trabalho tem algo que, muitas vezes, chega no terceiro ou quarto disco. Chico Chico sabe o que quer, e isso lhe dá personalidade. Antes de saírem pelo folk e pelo rock, suas ideias parecem nascer no blues. Não no formato harmônico, mas no sentimento de suas letras e nos acentos de sua voz.
O repórter chega então ao que pode ou não ser o tabu de Chico, Cassia Eller. E, para surpresa, ele não solta fogos com o assunto, mas também não sobe barreiras. “As pessoas criam isso (de eu não falar sobre o assunto). Mas está tranquilo”, diz. “Agora, eu acho que (o fato de ter o sobrenome Eller) facilita alguma coisa. Eu não estaria falando com você. Uma pena, isso reflete algo que está errado na mídia.” Ele é confrontado, então, com a ideia de que se realmente estivesse sendo seguro apenas pelo sobrenome, já estaria falando sozinho, como acontece com muitos cantores de linhagem nobre. Chico parece se satisfazer com a observação, mas ainda critica o comportamento da imprensa. “Não vejo jornalistas indo até o show que fazemos na Maré (comunidade no Rio). Mas todos vão ao que fazemos na zona sul.”

Se reconhece em si o gene da mãe, ele responde: “Há uma influência de casa, sim, mas não no DNA. Como não é preciso ser filho de pintor para ser pintor, ninguém precisa ser filho de cantora para ser cantor”. Seus planos incluíam ser jogador de futebol e professor de geografia. Cassia deve ter ficado feliz pela escolha. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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