O grupo A Cor do Som deve agradecer à visão e à coragem do diretor da gravadora Warner, ex-diretor da Philips, André Midani. Além de contratá-los sabendo que corria todos os riscos que um grupo de música instrumental poderia lhe trazer naqueles finais de anos 1970, Midani fez o trabalho sujo de dizer que alguma letra com alguma voz iria empurrar o grupo para outro patamar.
E assim foi. Mas, antes, Midani os chamou para irem a uma festa onde também estaria Claude Nobs, o fundador e diretor do venerado Festival de Jazz de Montreux, na Suíça. A festa fez a diferença, mais uma vez.
Ao conhecer o som intrincado, ainda instrumental, dos músicos, Nobs os convidou para a edição do festival de 1978, quando o Brasil passaria a ter noites especiais em cada edição. A Cor do Som, mesmo sem ser um grupo de jazz, faria a estreia do Brasil em Montreux.
Eles fizeram dois shows no mesmo dia, um pela tarde, com “cheiro de haxixe”, como lembra o baixista Dadi, e outro à noite, para um público mais especialista, mais radical. A apresentação ia bem, com o virtuosismo dos músicos à flor da pele. Dança Saci, de Mu Carvalho, na abertura, um tema de grande velocidade, deixou o público surpreso. Chegando na Terra, de Armandinho, tinha uma introdução só ao berimbau, algo que enlouquecia os europeus, e Cochabamba, de Moraes Moreira e Aroldo Macedo, apresentava aos que ainda não haviam se convencido a pegada roqueira baiana de Armandinho.
Os problemas só vieram com o tema Festa na Rua, de Dadi, Gustavo, Armandinho e Mu. O frevo ganhou uma conotação totalmente inesperada naquele festival.
A marcação linear da bateria aproximou muito aquela música da linguagem da disco music, avassaladora nas pistas de 1978 e odiada pelos jazzistas. Não deu outra. Quando terminaram, as vaias eram quase tão altas quanto os aplausos. Boa parte do público não perdoou um grupo que eles ouviam como uma espécie de traidor do movimento, mesmo depois de todas as qualidades que haviam acabado de atestar. Curiosamente, um disco ao vivo foi lançado, com a vaia preservada. “Aquele frevo bateu diferente para eles, e havia um público mais radical mesmo. Eles não entenderam”, diz Dadi.
O grupo é considerado por muitos como representante de um conceito pós-tropicalista, mas 1977 já está longe de 1969, quando o movimento de Gil, Caetano e Mutantes acaba. Não é também o tropicalismo o nome mais citado pelos músicos. Dadi aproxima mais a banda daquilo que estava por vir, o rock nacional, ou BRock. “Muitos desses grupos dizem que foram influenciados por aquilo que fazíamos nos anos 70.”
A falta de um planejamento, mesmo com o redirecionamento mais pop a partir de 1977, foi sentido mesmo antes da desintegração do grupo. “Nós fomos como o porquinho da história, que constrói uma casa de palha. Nos divertíamos muito e não pensávamos em mais nada.”
Dadi seguiu em carreira solo e se consolidou como músico de estúdio e projetos pessoais, solos. Lançou discos no Japão e na Itália, títulos que agora estuda trazer para o Brasil depois de um convite dos diretores da gravadora Coqueiro Verde, de Erasmo Carlos. “Será um selo dentro de outro Selo, o Dadi Discos.”
Ele segue com uma relação forte, pessoal e de projetos, com a vizinha Marisa Monte. “Ela não diz se vai fazer mesmo o Tribalistas de novo. Aquilo foi algo muito natural, nunca arquitetamos nada”. E toca também com Jorge Benjor.
Para Dadi, que se tornou uma referência na forma de pensar as linhas discretas de seu instrumento, o contrabaixo marca as batidas do coração da música. “É ele quem dá a respiração.” Avesso a longos solos e exibições de virtuosismos, Dadi vai além em sua comparação. Como o coração, o baixo é discreto. Alguns nem sentem sua presença, mas retire-o dali e tente sobreviver sem ele.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.