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ESPAÇO AAPAH – Escola sem partido: uma impossibilidade educativa

Sou professora da rede municipal de Guarulhos. Estamos em greve há 5 dias, com manifestações diárias lotadas de professores, diretores, coordenadores e supervisores de ensino. Pode-se ler nos jornais locais os impactos que essas manifestações tiveram no trânsito e até em eventos, e também as acusações ao governo do PT, já tão desgastado politicamente, e seus desmandos com os trabalhadores da cidade. Essa semana, em meio a essa efervescência política, li o Projeto de Lei 193/2016 do senador Magno Malta denominado Programa Escola sem Partido e me chamou a atenção o seguinte inciso acerca da função do professor: “I – não fará propaganda político-partidária em sala de aula nem incitará seus alunos a participar de manifestações, atos públicos e passeatas”
 
Pensando numa rede que tem como base de sua proposta curricular concepções progressistas de Educação, pautadas na teoria de Paulo Freire, fiquei pensando em como seria nossa atuação se uma lei como essa fosse aprovada. Deveríamos nos calar e esperar pacientemente que a questão fosse resolvida de acordo com a boa vontade do prefeito? Ou deveríamos privar nossos alunos da discussão de que a tal educação de qualidade que tanto falamos só virá através da luta e reivindicação? Pois a história mostra que contar com o bom senso dos nossos governantes não vem dando certo.
 
A questão de não ser partidária também é algo que me intriga. Ora, se a organização política brasileira se organiza em partidos, cujas propostas estão carregadas de ideologia, como fazer qualquer crítica, qualquer uma mesmo, sem que esta esteja relacionada a algum partido? Não seria isso tomar partido dos que estão no poder?
 
A crítica é algo inerente à prática educativa. Estudiosos apontam que quanto maior a carga teórica adquirida maior a possibilidade de reflexão, de análise. Além do mais, a ideia de uma escola que doutrina alunos à esquerda, só poderia vir de alguém que há muito não visita uma escola pública. Mesmo nas redes com proposta curricular um pouco mais progressista, o que vemos na prática é um currículo extremamente conservador, machista, homofóbico e cristão. E os professores, num processo evidente de proletarização se veem reféns de tantos cumprimentos burocráticos e com condições de trabalho tão degradantes que não conseguem sequer ter tempo de analisar criticamente sua própria condição enquanto trabalhador – vide a dificuldade que é convencer alguns colegas a aderir uma greve que mexe em seu próprio bolso – quiçá discutir qualquer que seja o tema polêmico com os alunos. Os assuntos como racismo, machismo e etc continuam sendo trabalhados pontualmente em datas comemorativas e nem de longe servem de tema norteador da prática.
 
A escola, em crise de objetivos, oscila entre metodologias progressistas e um formato arcaico e autoritário que não facilita em nada nenhum processo de reflexão. E as tentativas de resistência, como foi o caso das ocupações feitas pelos alunos nas escolas estaduais, sofrem boicotes violentos por parte dos professores, esses acusados de doutrinarem os alunos à esquerda. 
 
Diante do descaso atual da educação, em especial na cidade de Guarulhos, cujo prefeito opta por ignorar o brado dos seus educadores em vésperas de eleições, tenho esperança. Esperança de que não sejamos tomados por esse marasmo que esperam de nós. Que não nos deixemos esmorecer, que possamos resistir e ser sim uma alternativa cada vez mais à esquerda da situação na qual nos encontramos.
 
 
  *Pedagoga, associada da AAPAH, coautora do livro “Cecap Guarulhos – Histórias, Identidades e Memórias”
 

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