Até então empresário bem sucedido do irmão Emicida, Evandro Fióti, 27 anos, acaba de lançar sua primeira experiência como cantor e compositor. Gente Bonita, o nome de seu EP de seis músicas, vai ser mostrado em apresentação única neste sábado, 10, no Sesc Pompeia.
Antes de seu envolvimento com o rap, Fióti deixa claro em sua identidade musical que bebeu muito de Cartola, Adoniran Barbosa, Djavan. Seu violão é contido, de poucas notas e mais suingue, assim como sua voz trabalha em uma extensão curta, mais para os graves.
“Aos 13, 14 anos, fui ouvir rap com os Racionais e comecei a me ligar no preconceito. Quem gostava de rap era discriminado na escola, aquilo era considerado música de bandido”, lembra ele. Seu disco faz uma discreta brincadeira no logotipo que traz a inscrição “Nova Música Popular Brasileira”. Uma referência proposital à marca da série de LPs dos anos 80, Música Popular Brasileira, da Editora Abril.
Fióti diz que o amadurecimento que o rap atingiu na última década, ao deixar os formatos de sua primeira fase dos anos 80 e partir para a junção com elementos da música brasileira, faz o gênero chegar em seu momento mais rico. “Esse é o momento, a hora em que o rap fica de fato brasileiro. É assim que ele parece único e passa a se tornar música brasileira também.”
Por outro lado, ao usar letras de rappers como Ogi para fazer seu primeiro trabalho, Fióti sente estar fazendo uma espécie de serviço à música brasileira. “Havia uma fase em que o pop era bom, mas hoje há coisas horríveis, letras muito ruins. O rap tem bons letristas e pode ajudar muito na qualidade da música brasileira.”
Seu samba Obrigado, Darcy, em homenagem ao antropólogo Darcy Ribeiro, é um bom exemplo de sua linguagem miscigenada, um registro formal de rap, suprimindo por vezes a concordância verbal, cantando com a leveza dos sambistas. “Arranha-céus ou igarapés / Força de bateria nota 10 / Ao olho alheio, trem sem freio, tio / É um coração cheio, um estômago vazio / É a bunda da mulata ou é um moleque de fuzil / Paixões e contradições mil / Sob o Cristo do Rio, riso efêmero / Pô, qual tua cor? Valor? Qual teu gênero? / Se descer sem sambar, eles tremerão / Com roteiro de inspirar James Cameron / Terra de Vera Cruz, luz, berço da vida / Os vilão que é do bem, dos heróis genocida / Sonho de paz, outros Carnavais / Sou um povo que tem como seu maior bem / Gritar gol”.
Boa parte da resistência ao rap, diz ele, pode ser explicada por uma má interpretação de um discurso cheio de ira. “Muitas vezes as pessoas acham que os rappers estão fazendo apologia ao crime. Há várias formas de dar o recado.” É curioso observar com Fióti como uma mesma letra pode ganhar forças e intenções diferentes dependendo da melodia em que ele foi colocada.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.