Começa nesta terça, 25, no Rio de Janeiro, a 24.ª edição do Anima Mundi, recheada de 400 filmes de 45 países, incluindo um longa-metragem com cheiro de Oscar, chancelado pelo Prêmio Especial do Júri do Festival de Cannes: A Tartaruga Vermelha.
Semana que vem, ele se instala em São Paulo, de 2 a 6 de novembro, com a Cinemateca Brasileira de sala central. No pacote de 2016, os curadores separaram pérolas inéditas de um dos países europeus que mais crescem no setor animado – a Holanda -, montaram uma mostra só de curtas israelenses e asseguraram a vinda de três convidados estrangeiros de peso: o francês Marc Jousset, diretor de arte de Persépolis (2007); o alemão Jacob Frey, realizador do premiado O Presente (2015); e o americano Cassidy Curtis, responsável pelo projeto Google Spotlight Stories, de animações em 360 graus para aplicativos móveis. Mas nada gera mais expectativa do que o épico ecológico sobre uma tartaruguinha metafísica que seduziu a Croisette em peso.
Dirigida pelo holandês Michael Dudok de Wit, oscarizado em 2001 pelo curta Father and Daughter, A Tartaruga Vermelha é uma experiência narrativa sensorial diferente de tudo o que a indústria espera de um desenho animado: 80 minutos sem qualquer diálogo, num tom contemplativo da natureza, construído com cores saturadas, como um pleito pela preservação dos animais.
“Ferir um animal é um gesto que não difere em nada de um estupro”, defendeu De Wit em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, em Cannes. “A incapacidade de um ser indefeso se proteger da brutalidade humana me instigou a produzir um ensaio sobre a nossa intolerância e sobre a nossa recusa de perceber que a natureza é a nossa casa. E, para isso, eu precisava de um corpo com a criação: não podia usar 3D, computação gráfica. Venho do desenho em papel, à mão, onde imperfeições de traço se tornam linguagem. E é isso o que eu busquei preservar, inspirado na poética da animação russa de meados do século 20 e na simplicidade do cinema japonês”.
Ocupado em viagens pelo mundo, sobretudo para Los Angeles, onde uma campanha se mobiliza em torno da carreira de A Tartaruga Vermelha rumo a uma potencial indicação ao Oscar, De Wit não poderá conferir as exibições de seu filme no Anima Mundi, embora tenha colhido já muitos elogios e prêmios nos 11 festivais nos quais foi exibida desde Cannes – só no de Atenas, ganhou três troféus. Centrado nos esforços de um náufrago para se adaptar a uma ilha onde a solidão é (em princípio) sua única companheira, o filme será projetado para os cariocas no Odeon e, para os paulistas, na Cinemateca Brasileira.
“Quando idealizei o curta Father and Daugther, trabalhei em apenas dois tons de vermelho na narrativa toda, sem concessão, e pensei em fazer algo parecido aqui. Mas, como era o meu primeiro longa, e sou estreante já de cabelos grisalhos, considerei prudente não exagerar demais e não abusar da cumplicidade do público. Minha questão era fazer uma aventura que surpreendesse as pessoas revolvendo uma velha questão que aparece na arte desde Robson Crusoe: o isolamento em uma ilha deserta. Para alguns, neste nosso mundo histérico, isso poderia ser uma bênção. Mas para muitos, é a maldição máxima. Para o meu personagem sem nome, isento de qualquer curva de melodrama, essa odisseia é um processo de educação ecológico”, diz o diretor de 63 anos, que começou a carreira em 1981, animando um dos trechos do cult Heavy Metal: Universo em Fantasia. “Este filme fala, antes de tudo, sobre respeito”.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.