Começo da manhã de um sábado cinzento. O Parque Villa-Lobos está vazio. Na biblioteca, também vazia, Clara folheia um livro e João Pedro faz hora no café. Os dois estão ali para participar do projeto Lê no Ninho. Durante 45 minutos, eles vão ouvir histórias, brincar com livros e fantoches, cantar, dançar. No final, poderão levar um kit para casa, para reproduzir lá o ambiente que encontram na biblioteca.
Clara é a mais velha da turma: tem dois anos e meio e frequenta o espaço há um.
Adora livros e é sócia do serviço de assinatura Leiturinha. “Mas mesmo tendo várias obras, ela gosta de vir por causa do ambiente e da música. E sempre emprestamos livros”, conta Adriana, sua babá. A mais novinha é Ana Luisa, de 9 meses, que está ali pela primeira vez. “Temos livros em casa e ela come tudo”, brinca o pai Flávio. “Quando mostramos os livros, ela sempre fica quietinha, curiosa”, completa. João Pedro ameaçou chorar quando a mãe disse que era hora de ir embora. “Ele vem desde os oito meses e ama”, conta Juliana, que já frequentava a biblioteca antes do nascimento do filho.
Todos os sábados e domingos a atividade se repete na Biblioteca Parque Villa-Lobos e também na Biblioteca de São Paulo, construída onde era o Carandiru, ambas do Governo do Estado. O público: crianças de 6 meses a quatro anos.
Se esses meninos e meninas vão se tornar leitores não é possível prever. Mas promover esse primeiro encontro de forma leve, no início da infância, já é meio caminho andado. “Devemos criar a oportunidade de a criança ter um contato gostoso com o livro, um contato de descoberta, porque isso vai ficar na memória afetiva dela como uma coisa prazerosa, que ela vai querer reencontrar, sentir novamente. Vai ter muito menos rejeição ao livro e à leitura quando chegar na escola”, explica Zoara Failla, gerente executiva do Instituto Pró-Livro (IPL).
E, possivelmente, vai ter muito menos rejeição à biblioteca. Hoje, segundo a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, do IPL, 8% dos brasileiros não pisariam numa biblioteca por nada neste mundo. Outros dados: apenas 5% da população frequenta sempre uma biblioteca e 71% dos entrevistados acham que ela é um espaço de estudo e pesquisa – e é essa percepção que se está tentando mudar.
Mais do que um lugar para guarda e empréstimo de livros, elas estão se tornando centros culturais onde é possível, entre tantas opções, ver peça de teatro ou show musical, fazer curso de computação, aula de ioga, usar a internet, descansar um pouco e se esconder do sol quente – como no feriado do dia 15, quando a Biblioteca Parque Villa Lobos ficou lotada.
Se o desafio da Villa-Lobos (126 mil usuários em 2016) é formar um público desconectado do parque, o das bibliotecas municipais (54 unidades e 952 mil usuários em 2016) é a modernização, a ampliação do horário de funcionamento e a retomada da renovação do acervo – depois de um hiato, este ano, segundo o secretário de Cultura André Sturm, foram gastos R$ 535 mil na compra de 23.266 exemplares. Doações também foram feitas por editoras a pedido da Prefeitura. Em 2018, Sturm disse o valor chegará a R$ 1 milhão – o mesmo que pretende investir no projeto Biblioteca Viva, que vai dar uma nova cara aos espaços. A Álvaro Guerra, pertinho do Parque Villa-Lobos, foi a primeira a ser reinaugurada com Wi-Fi, novo mobiliário, diferente disposição de livros de ficção (com a capa virada para a frente) e ampliação da programação. “Faremos isso nas 54 e, nesse ano, ainda, em pelo menos mais 35. A ideia é que até fevereiro todas estejam como a Álvaro Guerra”, garante Sturm.
Nem sempre relacionados aos livros ou que tenham a leitura como objetivo final, muitos dos cursos oferecidos têm fila de espera. É o caso do Smartphone para a terceira idade, nas duas bibliotecas estaduais.
Maria da Piedade Siqueira já tinha até esquecido que se inscreveu nesse curso quando recebeu a ligação da Biblioteca de São Paulo. Fazia quatro ou cinco meses que tinha visto uma matéria na tevê e ela, que nunca tinha pisado na biblioteca, foi lá, feliz da vida. “Foi ótimo. A turma toda gostou”, conta. Ela quer mais. “Deixei meu nome para fazer o curso de computação. O que tiver para eu ocupar a mente eu pretendo fazer.” Ler também? “Tenho dificuldade em ler, não sou muito apegada a livro, mas vou tentar.” Aos 68, ela diz que espera que o Governo continue com ações como essa. “Ocupando a mente da velharada, vão economizar com hospital e remédios”, conclui.
Para o aposentado Luiz Antonio de Oliveira, de 66 anos, e Vanira Vergani, jornalista de 56, os livros são, ainda, o melhor remédio. Ele, com cerca de 100 empréstimos por ano e levando três horas para ir e para voltar, é o frequentador mais assíduo da Villa-Lobos. Ela, com 25 livros lidos por semana, da Biblioteca de São Paulo. “Se temos tudo aqui, por que comprar? Se eu tivesse que comprar, leria mais devagar”, brinca Luiz, que nunca fica para ler na biblioteca por causa do barulho. Os novos tempos…
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.