Aos 96 anos, o fotógrafo German Lorca apresenta uma disposição invejável. Durante as últimas semanas, participou ativamente da montagem de uma nova exposição retrospectiva de sua carreira e enfrentou uma maratona de entrevistas para a imprensa. Em sua conversa com a reportagem, o fotógrafo contava, empolgado, sobre o antigo suplemento de lomografia do jornal. “Quando eu era criança, meu tio assinava o Estado e vinha uma página de lomografia. Talvez tenha me influenciado.”
Nascido e criado nos arredores do Largo da Concórdia, no Braz, em São Paulo, Lorca se viu interessado por fotografia já adulto, quando trabalhava como contador, por volta dos anos 1940. De início, o interesse era fotografar a família, mas ao entrar no icônico Foto Cine Clube Bandeirantes, começou uma carreira grandiosa. “Sentia a necessidade de fotografar meus filhos e me apaixonei pela fotografia”.
Décadas depois, os principais registros do artista estão reunidos na exposição German Lorca: Mosaico do Tempo, 70 anos de fotografia, que entrou em cartaz no último final de semana no Itaú Cultural, em São Paulo, onde fica até novembro.
“No começo, achava difícil criar as fotografias, revelar. Mas o clube era uma escola”, confessa Lorca. A partir do clube, começou a fazer trabalhos como fotógrafo para jornais e para a publicidade. Assim, viajou, e registrou, boa parte do mundo. “Às vezes, pegava serviço só para viajar. Dos lugares que gostaria de ir, só não fui ao Japão.” A mostra traz fotografias de todas essas épocas e de algumas dessas viagens. Uma das fotos mais recentes, de 2016, é de um dos lugares preferidos de German Lorca, Nova York. “Gosto do movimento constante.”
Os registros são variados, pessoas, lugares, arquitetura. Mas German não esconde seu interesse principal. “Sempre gostei de gente, da vida”, revela. “O trabalho do fotógrafo não é só bater a chapa, tem uma parte de sociologia, mostrar a vida.”
Apesar de preferir as fotografias em preto e branco – “emociona”, ele diz -, seus registros em cores vivas, principalmente os de anúncios publicitários, estão presentes na exposição. As máquinas utilizadas em sua carreira também são levadas ao público. Lorca acompanha o desenvolvimento tecnológico e não tem uma favorita. “O que mais me interessa é a portabilidade, temos que acompanhar a modernidade.” A mostra conta, inclusive, com uma fotografia feita por ele com um telefone celular, do pintor Fernando Lemos.
Mesmo com 96 anos, o artista mora sozinho, cozinha e até renovou a carteira de habilitação recentemente. Homenageado pela feira SP-Arte/Foto deste ano, que chegou ao fim no último domingo, Lorca realizou para o evento um ensaio inédito, em que recriou algumas de suas fotografias de 60 a 70 anos atrás. “Uma delas foi da Oca (no Ibirapuera). Na antiga, usei minha avó e meu filho para ilustrar a foto”, ele conta. “Agora, usei a sobrinha do meu filho, que tem uma criança pequena.”
De todas as fotografias que recriou e de boa parte das que estão na exposição, o artista conserva as memórias. “Gravei bem esses momentos, a memória de um fotógrafo funciona num lugar escondido, que ninguém sabe.” Mesmo com todo seu vigor, German Lorca admite que não deve ter novos trabalhos. “O corpo pede. Agora meu único projeto é manter a vida.”
Variedade
Para dar conta dos 70 anos de carreira, o curador da mostra, Rubens Fernandes Junior, selecionou 150 obras do acervo do fotógrafo. Cerca de outras 150 vão se revezar, ainda, em telas. “Queremos mostrar o olhar singular do Lorca, ele vê coisas que ninguém vê.
Além de fotografias publicitárias e seus mais famosos registros, a exposição conta ainda com núcleos temáticos de retratos de amigos, imagens de São Paulo e capas de discos e livros. “Seguramente, podemos afirmar que ele é um dos grandes mestres brasileiros e, com muita certeza, o fotógrafo de maior longevidade produtiva.”
GERMAN LORCA
Itaú Cultural. Av. Paulista, 149. Tel. 2168-1776. 3ª a 6ª, 9 às 20h. Sáb. e dom., 11 às 20h.
Entrada gratuita. Até 4/11.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.