Mundo das Palavras

Obama e Osama

Não são apenas os brasileiros que usam a irreverência e o humor para expressar sentimentos complexos. Mas, como ocorre também em outros países, fazemos isto, no Brasil, de um modo inteligente e surpreendente. Em 1997, Bill Clinton era considerado o homem mais poderoso do mundo porque ocupava a presidência dos Estados Unidos. Em visita ao Brasil, ele julgou que deixaria impressionada e agradecida a população pobre do Rio de Janeiro mostrando muita animação na visita que fez ao Morro da Mangueira. Com a imprensa à sua volta, Clinton ensaiou aqueles passos desengonçados e sem graça com os quais os norte-americanos supõem estar sambando.  E fez uns arremedos de jogadas de futebol com a bola dos meninos da comunidade do morro. Momentos depois, um repórter encontrou Jamelão, o velho puxador de samba da Estação Primeira de Mangueira, e, perguntou a ele o que estava achando do comportamento de Clinton. Jamelão foi fulminante: “O homem parece mais feliz do que pinto no lixo”.


Em março último, outro presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, visitou o Brasil. E também no Rio de Janeiro acreditou que deixaria os brasileiros impressionados e agradecidos com o discurso que faria no Teatro Municipal. A imprensa se preparou para cobrir um evento histórico, supostamente marco de nova fase da diplomacia norte-americana na América Latina. Mas, para surpresa dos analistas políticos, Obama, em seu pronunciamento aos brasileiros, se comportou como um inspetor de escola, diante de uma turma de alunos bem-comportados. Seus elogios mostraram que ele se julgava investido de autoridade para julgar nosso país. E que nós, brasileiros, estamos preocupados em obter elogios dele. No dia seguinte, àquele pronunciamento, o experiente jornalista Jânio de Freitas acertou no alvo quando definiu o pronunciamento de Obama como “um discurso de churrascaria”.      


Há poucos dias, numa situação muito mais complexa e dramática – a do anúncio da morte de Bin Laden -, Obama se dirigiu ao povo dos Estados Unidos, novamente através de um “discurso de churrascaria”. Nele, chamou para si o maior mérito pelo extermínio do terrorista, transformando-o numa peça de sua campanha publicitária à reeleição. Deu certo, por enquanto. Os institutos de pesquisa revelaram um crescimento de 9 por cento no apoio a Obama. Porém, este crescimento, se é expressivo, é também incerto. Para se firmar, depende da passividade – bastante improvável – dos seguidores de Bin Laden. Qualquer retaliação mais grave que eles imponham aos norte-americanos colocará Obama na difícil situação de quem a provocou.


De qualquer forma, os 9 por cento também indicam que só o discurso não foi suficiente para convencer a maioria dos eleitores norte-americanos. Os que se deixaram influenciar pelo “discurso de churrascaria” provocam, hoje, a mesma má impressão que levou, no passado, Bernard Shaw a dizer:  “Jamais alguém perdeu dinheiro subestimando a inteligência do povo norte-americano”.


O irlandês Shaw era culto e talentoso. Jamelão e Jânio de Freitas não estão em má companhia.  


 


Oswaldo Coimbra é jornalista e pós-doutor em Jornalismo pela ECA/USP

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