Um homem do mundo não é propriamente um homem mundano. Este último tipo de ser humano- supõe-se -, está encerrado nas pequenas questões do cotidiano. E se deixa guiar pela futilidade que impregna o convívio social, em todas as épocas.
Um homem do mundo é um ser de horizontes amplos. Não se fecha num único espaço geográfico, nem mesmo naquele do qual é originário. Suas ligações familiares, assim como suas atividades profissionais, se solidificam em muitas localidades do globo terrestre.
O brasileiro Jorge Amado foi, sem dúvida, um homem do mundo. Isto salta aos olhos de quem visita a Casa de Jorge Amado. Pois, cinco paredes do casarão secular desta fundação, instalada no cenário de vários romances de Jorge, o Pelourinho, em Salvador, estão cobertas por imagens de capas de seus livros traduzidos para 52 línguas. Algumas muito distantes da nossa cultura, como as de Moldávia, Macedônia, e Turcomenistão.
Isto se confirma, ainda, de outro modo, graças a uma preocupação amorosa da escritora Zélia Gattai, mulher de Jorge. A de registrar para seu álbum de família, as ocasiões nas quais seu marido se encontrou quem ele havia criado algum tipo de laço. Zélia, com a singeleza de uma fotógrafa amadora, produziu inúmeros registros de momentos nos quais Jorge esteve alegre, feliz. Pelo desfrute do prazer – tão humano – de encontrar alguém a quem ele admirava e que, em contrapartida, lhe admirava também.
No casarão, estas fotos estão expostas de modo discreto, nas estreitas paredes que separam as portas de entrada. São documentos iconográficos que revelam, instantaneamente, os interesses e os afetos que Jorge cultivou em vários âmbitos de sua vida e de seu trabalho. Assim como os que ele despertou, em tantos países.
Há uma inevitável seção dedicada aos baianos, natos ou adotados. Muitos inseridos por Jorge em seus livros, como personagens: Dorival Caymmi, Mestre Pastinha, Camafeu de Oxossi, Mãe Menininha do Gantois, o rábula Cosme de Farias, o poeta de cordel Cuíca de Santo Amaro.
Há o rico e revelador convívio com uma lista grande de outros literatos e artistas. Um autêntico Mapa Mundi da criatividade no século XX. Prova do acolhimento que Jorge tinha entre seus pares. Quem sabe, algum dia, este painel possa ser usado como material didático num curso de Cultura Universal. Entre os de nossa língua, lá estão os brasileiros e portugueses Dias Gomes, Fernando Sabino, Antônio Maria, Cícero Dias, Cora Coralina, João Cabral de Melo Neto, Vinicius de Moraes, Gilberto Freyre, José Saramago, Ferreira de Castro, Fernando Namora.
Entre os de língua espanhola e italiana, Jorge Seprun, Gabriel Garcia Marques, Mario Vargas Llosa, Miguel Angel Astúrias, Isabel Allende, Pablo Neruda, Nicolas Guillen,Giuseppe Ungaretti.
Entre os de língua francesa: Marcel Camus, Jean Paul Sartre, Simone de Beauvoir, François Sagan.
E os de outras línguas; Ilya Ehremburg (russo), Leopoldo Senghors (senegalês), Nazim Hikmet, e, Erdal Öz (turcos), Sidney Sheldon (norte-americano).
Jorge Amado, este homem do mundo que mergulhou intensamente no seu tempo, teria completado 99 anos, no último dia 10 de agosto, se ainda estivesse vivo.
Oswaldo Coimbra é jornalista e pós-doutor em Jornalismo pela ECA/USP