Uma suposição se enraizou no País, vinte e um anos atrás, a ponto de virar música dos Paralamas do Sucesso: existem nada menos que 300 picaretas, entre os 513 membros do Congresso Nacional. A suposição, hoje, não desapareceu. Ao contrário, acaba agora de ganhar maior força, através do noticiário político.
Com isto, picareta virou palavra trivial entre nós. O que torna quase impossível imaginar que ela, um dia, já suscitou divergência entre especialistas da Língua Portuguesa, como ocorreu em 2011. O escritor Sérgio Rodrigues, no blog Sobre Palavras, primeiro, lembrou o que o etimologista Silveira Bueno sustenta sobre picareta. O substantivo designa “pessoa aproveitadora, que recorre a expedientes acanalhados para se dar bem” quando tal pessoa “em tudo mete a cara para cavar dinheiro”. Para Bueno, assim, picareta é uma metáfora. Depois, Sérgio discordou: “essa ampliação semântica (de picareta) se deu por influência da palavra pícaro, que quer dizer justamente ardiloso, trapaceiro, velhaco”.
Se tal divergência já surpreende, a existência de uma História dos Picaretas é mais inesperada ainda – percebeu Paula Sato, quando recebeu a incumbência de pesquisar os antepassados deste personagem social, dada pela Editora Abril.
Na pesquisa de Paula surgiu – quem suporia? – uma picareta (humana, claro): Mary Butterworth. Em 1716, aos 30 anos, ela vivia em Massachusetts. Conta Paula: “Mary sustentava os filhos trabalhando como confeiteira e lavando roupas para fora. A grana era curta”. Ela, então, passou a fabricar dinheiro “no melhor estilo dona-de-casa”. Imprimia cédulas de libras esterlinas usando tecido engomado e um ferro de passar. Depois, corrigia as imperfeições à mão, valendo-se de penas de várias espessuras e nanquim. Acumulou tanta riqueza que se mudou para uma mansão. Seu crime foi descoberto. Mas, ela apagara todas as pistas comprometedoras. E, não pôde ser presa.
Fora do Brasil, quem ocupa o trono, no Reino da Picaretagem, é o austríaco Victor Lustig. Suas vítimas eram sempre pessoas desonestas como ele próprio. Nos anos 20, Lustig vendia máquinas de fabricar dinheiro a bandidos. Falsas. E, se escondia. Nem Al Capone escapou. Dele, arrancou 5 mil dólares. Fingindo-se honesto. Seu maior golpe, contudo, foi aplicado em 1925, na França.
Paris atravessava crise financeira, com dificuldades para manter a Torre Eiffel. Lustig vestiu-se como um oficial do governo francês. E procurou um empresário metido a espertalhão. Disse-lhe que a torre ia ser transformada numa sucata de 8 mil toneladas de metal. E, garantiu, poderia transferi-la para ele, se recebesse uma boa propina. O empresário pagou-a. Quando percebeu o logro, ficou tão constrangido que nem denunciou Lustig à polícia.
Quanto aos brasileiros, até a atuação do austríaco talvez pareça amadorística. Afinal, aqui não age Eduardo Cunha?