A falta de atenção reinante no ensino do Brasil aos elementos que constituem a complexa identidade cultural de cada uma das regiões do País faz o amazônida se enxergar através da ótica de outras áreas que detém o controle político-econômico de nossa pátria. Ou melhor, o obriga a isto. De fato, a população daquela região quase não se enxerga. Porque, na verdade, a ótica pela qual ela é percebida por aquelas regiões a reduz à invisibilidade.
A Amazônia, através de tal ótica, aparece composta, quase exclusivamente, por vegetação frondosa e rios caudalosos. Às vezes, por menos, ainda. Apenas com grandes extensões de águas, cobertas por grandes extensões de céu. Como um novo gênesis. Portanto, como uma região sem História, pois, sem população. Numa distorção antiga. Foi assim que, por exemplo, a viu Euclides da Cunha, em 1905, quando chefiava uma missão do Ministério do Exterior e percorreu o Rio Purus.
Os atuais vinte milhões de amazônidas, espalhados por nove estados, parecem aceitar passivamente esta situação que lhes impõem, por exemplo a programação de televisão e a cobertura jornalista do país produzidas no eixo Rio/São Paulo. E, com isto, eles próprios ignoram sua rica e densa identidade cultural formada ao longo de quatro séculos, com influências indígena, portuguesa, italiana, espanhola, japonesa, síria, libanesa, judaica, norte-americana. E que, apenas, numa de suas capitais, Belém, deixou marcas profunda no seu Centro Histórico – cuja imagem acompanha este texto – , composto de dois mil imóveis de estilos barroco, neoclássico, eclético e modernista.
Os amazônidas, assim, não fazem como os franceses que recusaram uma imagem de seres humanos de segunda classe que lhes quiseram impor os nazistas quando invadiram a França. Num de seus livros sobre a ocupação nazista, o filósofo Jean Paul Sartre escreveu: "Nunca fomos tão livres porque todos os dias tínhamos de reafirmar o que somos".
Por assumirem uma postura completamente diferente, não surpreende que os amazônidas desconheçam os nomes e os destinos de pessoas que contribuíram, com grande sacrifício, para que a região desfrute hoje de sua grandeza físico-geográfica. Como os engenheiros alemães, italianos e portugueses que demarcaram, nos anos de 1700, seus limites de hoje.
Esta tremenda distorção provocada pelas deficiências de nosso sistema de ensino se repete em todas as regiões do País, com graves consequências de naturezas diversas na vida social brasileira. Uma delas: a baixa autoestima a que induz os habitantes das diversas regiões do País por desconhecimento da beleza e do valor de suas identidades culturais dificulta o desenvolvimento de consciência sobre a importância de se preservar o patrimônio histórico. Isto afeta negativamente a indústria do turismo cultural, gerador de empregos, tão necessários para nossos trabalhadores.