Mundo das Palavras

A ética de Hemingway

Com sua agressividade, natural, os animais se protegem e preservam as espécies. Inclusive os seres humanos. Impulsionados por ela à ação, tornamo-nos aptos a criar as condições necessárias para existirmos. Mas, lembra Wagner Paulon, mestre em Psicopatologia da Escola Paulista de Medicina, no artigo “Agressividade e Psicanálise”, o mesmo impulso pode fazer uma pessoa causar danos em outra, sem que disto resulte nenhuma vantagem legítima para alguém.
 
Por isto, as sociedades civilizadas impõem regras para permitir agressões. Respeitando-as, tanto o agressor quanto o agredido conservam sua dignidade humana. A natureza, neste caso, continuará subjugada à cultura. Sua criação nos distingue dos demais animais. 
Numa luta de boxe, por exemplo, o juiz pode desclassificar o atleta, se ele não aplicar no rosto do adversário os “golpes corretos”. Um deles consiste em usar a parte frontal das luvas fechadas. 
 
Outro exemplo: numa guerra, se um combatente, prisioneiro, for maltratado por seu inimigo, haverá um crime passível de julgamento em tribunal internacional. Pois, os países estabeleceram entre si um conjunto de tratados, conhecido como Convenção de Genebra, para viger nos seus conflitos.    
 
A preocupação universal com a dignidade humana nos conflitos foi expressa por Ernest Hemingway na epígrafe do seu livro “O velho e o mar”: “Um homem pode ser morto, mas não pode ser destruído”.
 
Infelizmente, o Brasil enfrenta uma situação quase de guerra civil, com o acirramento de ódios políticos. Sem regras. 
 
“A barbárie se instaurou”, escreveu em seu blog o jornalista Paulo Henrique Amorim, depois da veiculação insistente pela TV Globo das cenas de Antony Garotinho, adversário da emissora, imobilizado à força numa maca de ambulância por agentes da Polícia Federal.
 
Enquanto, perto, a filha e a mulher dele se desesperavam porque o ex-governador é cardiopata. Menos de uma semana depois, sua prisão foi revogada pelo Tribunal Superior Eleitoral, depois de impor-lhe multa e restrições de deslocamento. Tornando ainda mais escandalosa – por ter sido obviamente injustificada – a humilhação pública do político promovida por aquele canal de televisão. 
 
“Queremos uma sociedade de bárbaros? ”, indagou em outro blog, o jornalista Marcelo Auler. Tinha sido exibida na capa da Veja e por outros veículos de comunicação que combatem uma foto de Sérgio Cabral. Feita no interior da Penitenciária de Gericinó, em Bangu, nela, o ex-governador aparece de cabeça raspada, com roupas típicas de presidiário.
 
Escreveu Auler: “É mais do que justificável que a população, em especial a fluminense, aplauda a prisão dos dois ex-governadores, ainda que ambas possam ser discutíveis. O que não se justifica é tripudiarem da situação em que os dois se encontram. Em ambos os casos, o desrespeito foi cometido com a participação e/ou conivência de autoridades que deveriam fazer valer a Constituição Federal, assim como a Declaração Universal de Direitos Humanos”. 
 

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