Mundo das Palavras

Suicidas irritantes

Os suicidas sempre incomodaram os jornalistas brasileiros. Antes, se tivessem de inevitavelmente escrever sobre eles – como nos casos que envolviam pessoas poderosas, ricas ou célebres – não informavam como tinham morrido. Ainda hoje, uma publicação como a Folha de São Paulo chega a incluir o verbete “suicídio” no seu Manual de Redação para ordenar aos jornalistas: “Não omita o suicídio quando ele for a causa da morte de alguém”. O que, porém, não impede o jornal de, frequentemente, substituir, nos seus textos, a palavra suicídio por “queda”, quando ocorrem em prédios altos.  
 
A recusa de uma abordagem direta e aberta deste drama, infelizmente, não existe somente entre jornalistas. Na verdade, “ninguém quer falar no assunto”, disse a própria FSP na matéria “Suicídios e crimes”, publicada no dia 12 de junho de 2013. Nela, o jornal registrou dois fatos.  Vinte e seis brasileiros se matavam, por dia, em média. Havia aumentado em 30%, desde 1988, o número de suicídios entre jovens e adolescentes.
 
Muita gente acredita que o suicida é um criminoso. Esta lenda urbana de nossa cultura agrava o tabu social em torno deste assunto. Quando fracassa em seu intento, o suicida é preso, disse ainda o jornal. Porém, a Polícia alega que não quer puni-lo. Apenas protegê-lo de si mesmo, assim como evitar que, caso ele tente, novamente, outras pessoas possam ser feridas e até mortas, de modo involuntário. Mas, esta proteção tem um preço para o suicida. Ele terá outro estigma social. Será visto como alguém com problemas mentais graves, a ponto de não conseguir cuidar de si mesmo. 
 
É, no entanto, dentro dos ambientes religiosos que mais evidente se torna a rejeição aos suicidas. Apesar de, ultimamente existir entre cristãos uma tendência a admitir que eles possam ser perdoados por Deus. 
 
“O suicídio é, objetivamente falando, um pecado muito grave… Somos os administradores e não os proprietários da vida que Deus nos confiou. Não podemos dispor dela” – diz o site da Renovação Carismática Católica.  
 
Mais duros ainda, são os judeus. Sobretudo com os suicidas que não apresentaram doença mental. Segundo o site da Congregação Israelita Paulista: “O Judaísmo considera o suicídio um crime tão grave quanto o assassinato”. Por isto, o suicida, “é enterrado numa parte do cemitério afastada dos outros túmulos”.
 
Não é sem motivo, contudo, que os suicidas irritam. Afinal, eles buscam a morte, como aparece na escultura grega Gálata Ludovisi, do ano de 230 A.C. – postada junto com este texto. Quando as demais pessoas, tidas como normais – notou o antropólogo Ernest Becker, no livro “A negação da morte”- se entregam sofregamente a todo tipo de jogos sociais, truques psicológicos e preocupações pessoais irrelevantes – enlouquecem, em suma -, para não tomar conhecimento de “sua sorte grotesca”, a de ter de morrer, diz Becker. Eles anseiam por um esquecimento cego que os suicidas rejeitam.
 
 

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