Mundo das Palavras

Figurinhas virtuais

O vício de colecionar figurinhas tem História. A primeira coleção delas foi impressa em Paris, em 1875. Para distribuição no Uruguai. Em embalagens de extratos de carne. Da marca Liebig. Algumas das maiores paixões despertadas por estas coleções, neste mais de um século, dirigiram-se a um tipo especifico de imagens. As de atores e atrizes do Cinema. Não é difícil entender por que. Já que tais paixões nascem e se alimentam na solidão. De pessoas, que embora cercada por outras, se isolam, na escuridão, de uma sala, para vivenciar relações únicas e pessoais com personagens, que veem projetadas numa tela grande, diante delas. E ante as alegrias e dramas experimentados por elas, sentem-se envolvidas emocionalmente. Algumas vezes, a ponto de isto influenciar o modo com elas pensam e vivem.
 
Seria impossível avaliar quantas pessoas, impregnadas destas paixões, se submeteram sem reclamar ao desafio de suportar ansiedade – e, às vezes, frustração – nas tentativas de descobrir nos envelopes vendidos em bancas de jornal aquelas poucas imagens necessárias para completar seus álbuns – sabidamente impressas em pequenas quantidades pelas editoras que as publicaram, num golpe comercial, nunca admitido, para forçar o aumento de suas vendas.
 
Hoje, quem as coleciona ainda se coloca em situações que testam seu amor pelo Cinema. Embora já não dependa de impressão e venda delas pelas editoras. Pois, apoiado nos recursos disponibilizados pela internet, seus desafios na reunião de imagens têm outra natureza. A de um pesquisador com chances de influenciar seu campo de trabalho. E até de corrigir erro de informação oficial. Como o existente na História do Cinema do Brasil. Segundo a qual o primeiro brasileiro a atuar em Hollywood foi o talentoso ator carioca Raul Roulien, instalado nos Estados Unidos, a partir de 1931.
 
Acionando links de bancos de dados sobre o Cinema, como os do IMDb – Internet Movie Database e do Allmovie, entre outros – através dos quais pode consultar preciosos materiais guardados pela Cineteca Nazionale, de Roma e pela Biblioteca do Congresso dos Estados -, este novo tipo de colecionador de imagens de atores e atrizes, descobrirá que Roulien foi antecedido em Hollywood por Synésio Mariano de Aguiar, um amazônida de Belém do Pará. Que chegou aos Estados Unidos em 1916, aos 22 anos, tendo em seus bolsos os recursos de mesada enviada por seu pai. E que teve a sorte de hospedar em seu apartamento um jardinheiro, lavador de pratos, chamado Rodolfo, um ano apenas mais velho que ele, de que seria amigo até o final precoce da vida dele, aos 31 anos. Quando, àquela altura, ele havia se transformado no maior símbolo sexual masculino do Cinema Mudo: Rodolfo Valentino.
 
Em 1918, Synésio com 24 anos, começou a atuar em filmes, com o pseudônimo de Syn de Conde. Esteve no elenco de “Revelation”, estrelado pela mais fascinante atriz do Cinema Mudo, Alla Nazimova. E, no de “The Brass Check”, com Francis Xavier Bushman, outro galã, visto como “o homem mais bonito do mundo”. 
 
No ano seguinte, Syn de Conde foi dirigido pelo legendário gênio David Llewelyn Wark Griffith, em “The Girl Who Stayed at Home”. E, pela talentosa, respeitada e bela diretora pioneira Lois Weber, em “Mary Regan”. Um filme co-produzido por Louis Burt Mayer, que se tornaria um gigante dentro da indústria do Cinema. 
 
Em “Rose of the West”, Syn esteve ao lado de Tom Santschi, famoso cow-boy. E, em “Out of the shadow”, de Frederick Pauline, mais tarde consagrada no papel de mãe da personagem de Joan Crawford, em “This Modern Age”. 
 
Naquele ano, ele ainda trabalhou em “Flame of the Desert”, produzido por Samuel Goldwin, outro personagem mitológico de Hollywood, criador da Paramount e da Metro-Goldwyn-Mayer, com Louis Mayer. 
 
No ano de 1920, Syn participou de “Rouge and Riches”. Que contava também com Mary MacLaren, uma surfista e tenista, levada para o Cinema por Al Jolson.
 
Porém, em 1921, o paraense teve de encerrar abruptamente sua carreira, por imposição familiar. Antes, contudo, ainda foi dirigido, em “Moongold”, pelo brilhante ilustrador da New American Art, William Henry Bradley – o “Reitor dos Designers Americanos”.
Uma coleção de imagens da carreira deste ator do Cinema Mudo, como qualquer outra, criada por um amante do Cinema, com os meios propiciados pela net, terá inevitavelmente as marcas das simpatias e idiossincrasias do colecionador. A deste colunista, por exemplo, revelaria inevitavelmente sua admiração por Alla Nazimova, cuja imagem acompanha este texto.
 
 
 

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