Quando, em 2012, foi calculado o número de mexicanos que viviam no Brasil, chegou-se ao número de oito mil. Portanto, existia, proporcionalmente, no País, 23.750 brasileiros para cada mexicano. Assim, não é difícil imaginar quantos brasileiros morrem de velhice sem jamais ter visto uma única pessoa nascida naquele país. Hoje, com 120 milhões de habitantes.
Nem por isto, muitos de nós deixaram de se sentir ligados a eles. No passado, por causa dos filmes de Cantinflas, dos boleros do Trio Los Panchos, do visual e dos sons dos mariachis, de antigos símbolos de rebeldia política – Pancho Vila e Emiliano Zapata, substituídos nos anos de 1990 pelos guerreiros do Exército Zapatista de Libertação Nacional. Nos dias atuais, nos ligam ao México a simplicidade do duradouro teatro mambembe televisivo criado por Roberto Gómez Bolaños, o Chaves. E, as telenovelas da Televisa. Nelas, contudo, pouco se vê da verdadeira aparência dos mexicanos – 60% dos quais mestiços – escondida sob a beleza padronizada por Hollywood extraída dos 6% de brancos da população daquela nação. Infelizmente, este viés preconceituoso é reforçado pelo maciço noticiário das agências internacionais sobre crimes do narcotráfico. E pelas ofensas públicas cometidas por Donald Trump contra o México. Conquanto ele presida um país que foi mexicano em grande parte de seu território. Já que toda a área correspondente, aos estados da Califórnia, Nevada, Texas, Utah, Novo México, e, parcialmente, aos de Arizona, Colorado e Wyoming, foram tomadas do México pelos EUA, em 1840.
São minguadas, assim, as informações recebidas no Brasil, atualmente, sobre a milenar cultura deste país, de avançado estágio civilizatório já nos anos de 1300, no império asteca, além daquelas sobre Frida Kahlo, que circulam graças a seus admiradores.
Contudo, neste pobre cenário de intercâmbio cultural, vem despontando, aos poucos, mas vigorosamente, a impressionante figura de Juana Inés de La Cruz. A jovem bastarda que se abrigou num convento, na segunda metade dos anos de 1600, para estudar. E lá, enfrentou a intolerância da Inquisição, até se tornar a erudita capaz de corrigir publicamente erros teológicos do Padre Antônio Vieira, a maior personalidade da cultura de Portugal, naquele século. Além de escrever ousados poemas líricos, impregnados de homoafetividade, com a mesma qualidade dos maiores expoentes da literatura barroca do chamado Século de Ouro Espanhol, como Luís de Góngora.
A saga de Juana – que morreu aos 44 anos numa epidemia – foi estudada por Margo Glantz, especialista em erotismo femininos, e, pelo Prêmio Nobel de Literatura Otávio Paz, no livro “Sor Juana Inés de La Cruz ou As Armadilhas da Fé”, (disponível gratuitamente no site docplayer.com.br).
Em 1990, a cineasta Maria Luisa Bemberg a reconstituiu no filme “Yo, la peor de todos” (postado no Youtube, como as entrevistas de Margo Glantz). Agora, está em exibição pela Netflix na série “Juana Inés”.
(Ilustração: A freira poeta, numa obra do site “Sor Juana, La Décima Musa”)