Djavan é negro. Mas não samba. Não grava pagode, nem funk ostentação. Não se apresenta acompanhado por dançarinas semidespidas. Pouco aparece na televisão. Não vende música para anúncio publicitário. Não admite ter carreira patrocinada por nenhuma empresa. Não apela às leis de incentivo à cultura. Nem para cantar, nem para gravar. Não tem turma de conterrâneos em que se apoie, como muitos cantores cariocas, baianos, cearenses, mineiros e pernambucanos. E, contraria o “gosto médio” dos ouvintes das rádios, envenenado.
O rigor comportamental de Djavan mantem sua liberdade de criação. Revela uma aposta na integridade artística. E, humana, de modo geral. O que lhe impõe outros compromissos.
Numa entrevista dada ao UOL, recentemente, declarou: “Racismo é um câncer no Brasil”. E acrescentou: “Eu sou negro e acho que os negros, dentro de suas possibilidades, devem continuar lutando, mostrando sua força”. O rosto do artista na ilustração desta matéria apareceu quase irreconhecível porque sua tez original foi escurecida, como se estivesse coberta de lama. Imagem produzida com uso de tinta vegana, para a capa de seu novo álbum “Vesúvio”. Por duas maquiadoras, consagradas em dezenas de filmes e peças de teatro: Anna van Steen e Joana Seibel. Coube à outra artista premiada, Nana Moraes, fazer a fotografia.
Neste álbum, Djavan mostrou descontentamento e preocupação também com a situação política do Brasil. Por esta razão, no título do texto de sua crítica para o site Caderno Pop, Hugo Sukman anunciou: a clareza da música de Djavan vai iluminar tempos sombrios.
A energia criativa contida no álbum, quem sabe, reanime o cadavérico panorama da nossa música popular atual. Bem que gostaríamos! Uma das suas obras-primas, “Madressilva”, é uma surpreendente modinha brasileira antiga, estilizada, cujo nome Djavan retirou de uma das centenas de plantas do seu orquidário. Sukman vê, em Djavan, estilo próprio, “aquele fraseado e o sincopado único”. É “um dos estilistas da moderna música brasileira”, diz o crítico. Para outro especialista, Mauro Ferreira, do site G1, as criações de Djavan têm: complexidade harmônica; melodias imprevisíveis, e, letras escritas com poética particular.
Os artistas já amavam Djavan, antes que ele tivesse público. Foram os artistas que deram impulso à carreira de Djavan. Mais de cinquenta gravaram músicas dele. Pareciam, com isto, querer alcançar um selo de qualidade para suas carreiras. No Brasil, Roberto Carlos, Maria Betânia, Cássia Eller entre outros. No Exterior: Carly Simon, Al Jarreau, Carmen McRae e Manhattan Transfer. Nos Estados Unidos, a comovente demonstração de respeito. O grande Stevie Wonder aceitou participar como músico, na gravação em que Djavan canta Samurai. Tocou gaita de boca. De modo sublime.
(Na ilustração: a trepadeira madressilva, de folhas opostas, polinizada por abelhas ou mariposas, e, depósito de ovos de borboletas)