Nenhum jornalista ou acadêmico pode agir de modo preconceituoso, sem se desqualificar profissionalmente. Nestes campos é intolerável que alguém demonstre preconceito contra as mulheres, por exemplo.
O que não impede a sobrevivência de resquícios dele difusos e dissimulados. Mais visíveis no Jornalismo Esportivo. No qual, publicamente, ninguém admite que julga as mulheres privadas de capacidade intelectual para analisar a performance de um atleta ou de um time. Contudo, o País produziu inúmeras equipes femininas vitoriosas em competições internacionais de futebol, vôlei, basquete, handebol e ginástica artística. E apenas três mulheres aparecem na lista de 150 nomes de comentaristas esportivos brasileiros exibida no Google.
De modo igual, no meio acadêmico, ninguém, diante de estranhos, sustenta que a maternidade incapacita a mulher para a carreira científica. Mas, pelo menos uma vez, na prestigiosa PUC do Rio de Janeiro, uma aluna de Mestrado em Engenharia Civil ficou privada por um ano de sua bolsa de estudos porque, grávida (e ainda doente), foi julgada sem condição de manter seu interesse científico.
O caso ocorreu com Regina Augusta Campos Sampaio, no final dos anos 90, quando ela ainda enfrentava dois outros preconceitos. Um regional e outro de gênero. Pois, lutava para ser cientista da Amazônia, num campo com exigência de rigor na capacidade de raciocínio ainda maior que a do Jornalismo – o matemático.
Antes de ser aceita na PUC carioca, Regina frequentou a faculdade de Engenharia Civil de Belém, criada nos anos 30, sob a égide da descrença – que campeava em todo o Brasil – quanto à capacidade das mulheres de racionar, sem interferência de emoções. Apenas três professoras tinham conseguido ingressar em seu quadro docente, com a obrigação de ensinar Cálculo, ao longo de meio século.
Acontece que, desde sua infância, Regina era fascinada por Matemática. Havia ganho três livrinhos. E descobrira que podia se divertir com exercícios de Matemática Elementar.
Regina esperou sua filha completar seis meses. E recuperou a bolsa de estudo. Sozinha, sem poder contar com a companhia do marido, ela levou adiante o mestrado. Conclui-o, e, foi aceita no curso de doutorado. Quando já tinha os dois títulos, tornou-se, na Austrália, Pós-doutora em Engenharia pela Queensland University of Technology.
Podia, então, voltar para Belém. Onde, no passado distante, existira, dentro da UFPA, somente sua faculdade, ela encontrou um gigantesco Centro Tecnológico, com mais de 10 diferentes cursos de Engenharia. Além de outras dezenas de mestrados e doutorados, de laboratórios, de grupos de pesquisadores e de linhas de pesquisa.
Coube-lhe ensinar Cálculo Avançado, no Mestrado de Engenharia Civil. Por três anos, ela ainda coordenou um grupo de pesquisa em Engenharia Estrutural, relevante para a região. Pôde, assim, mostrar o ridículo dos preconceitos que subsistem contra a capacidade intelectual feminina.
(Na ilustração, foto de Regina, atualmente, radicada, de novo, na Austrália)