Quem admitiu isto foi a própria emissora. Quando Chico ganhou o Prêmio Camões. E o ex-presidente Lula, ainda preso, disse num bilhete enviado a ele: “Fiquei muito mais feliz porque a Globo teve que colocar você no ar, em horário nobre. Pela primeira vez vi sua cara na Globo”. Numa nota oficial, a emissora contestou, enumerando as vezes nas quais ele tinha aparecido em matérias daqueles programas. Admitindo, assim, sem querer, que Chico fora excluído dos seus musicais, espaços apropriados para ele, como artista.
Havia poucos meses, o jornalista Paulo Moreira Leite tinha denunciado em seu blog: “Globo censura Chico Buarque”.
O jornal havia vetado um curto comentário feito por Chico, a pedido de sua Redação, sobre a condenação de Lula por Sérgio Moro a nove anos de prisão. “Para Chico, o gesto constitui uma tremenda indelicadeza”, ele escreveu.
Se perseguição a Chico por parte da maior empresa de comunicação do País se reduzisse a estes fatos, já seria lamentável. Desgraçadamente, no entanto, ela dura meio século. Desde quando, em 1970, Chico retornou da Itália, para o clima asfixiante criado para as Artes, no Brasil, pela Censura da Polícia Federal, da Ditadura Militar, colocando em risco a sua própria segurança e a de sua ainda pequena família.
O modo de destruí-lo como artista, usado pela Ditadura foi o de proibir suas músicas. Até tornar-se quase impossível a ele sobreviver artisticamente e manter sua família.
Em situação diametralmente oposta, estava, então, a TV Globo. Desfrutava do auge de seu poder de influência, conquistado pela colaboração na implantação do regime autoritário.
A emissora encarregou-se de tornar ainda mais penosa a luta de Chico. Como ele mesmo contou, em 1993, no documentário sobre Roberto Marinho “Além do Cidadão Kane”, do diretor de cinema inglês Simon Hartog, produzido para o Channel Four, canal de televisão britânica.
No documentário, Hartog diz: “A TV Globo foi muito além do que foi requisitado (pela Ditadura Militar). Transformou as pessoas em não-pessoas”. Neste momento, Chico aparece. E começa a falar. “As pessoas não gratas ao regime eram proibidas de existir. Por isto, a censura proibiu algumas músicas minhas – a oficial, a do governo. Mas, a TV Globo se encarregou de ser mais realista que o rei, reforçando a censura, proibindo (até) o meu nome”.
Na década de 80, Chico recebeu uma breve anistia de seis meses. O tempo que durou programa Chico & Caetano, na TV Globo.
Nunca o documentário inglês foi exibido no Brasil. Roberto Marinho conseguiu sua proibição, através de ação judicial.