Que ficou guardada em arquivo, trinta e quatro, antes de ser postada na internet. O meme extraído dela está espalhado, hoje, por centenas de links do Google, do Youtube e outros navegadores.
Nada semelhante, houve com a live recente. Embora nela tenha ocorrido o mesmíssimo tipo de incidente que deu origem ao meme famoso. Ambos provocados por constrangedores equívocos cometidos por bons jornalistas. Logo classificados por Caetano como absurdos, maluquices e ignorâncias.
Em primeiro lugar, porque agora, houve imediato pedido de desculpas da Rolling Stones. A revista tinha rotulado de “inusitado e cômico” o uso, na live, de prato e faca, como instrumentos de percussão, por Moreno, filho de Caetano. Caetano ridicularizou a crítica, lembrando que os dois objetos tem uso na Música Popular Brasileira, desde a época da criação do samba – por João da Baiana, por exemplo. Ele lembrou ainda da figura lendária de Dona Edith do Prado, com quem gravou música e se apresentou em todo o País. Se tivesse consultado o site do IPHAN, a revista também teria sido informada de que o uso de prato e faca como instrumento musical é tão velho que está até tombado como bem imaterial da cultura brasileira.
No incidente de 1978, não houve um elegante pedido de desculpas. Por que? Não havia espaço para ele, no ambiente político tenso da Ditadura Militar. Já mais de dez anos de censura, prisões, exílios e mortes pesavam sobre jornalistas e artistas. Tanto stress prolongado tornara aguda a divisão que surgira, no campo cultural, anos antes. Entre quem, como Geraldo Mayrink, da Veja, seguia uma linha política de exigência às Artes de questionamento da Ditadura. E os outros, como Caetano, de uma linha anárquica e libertária, que considerava aquela exigência mais um tipo de censura.
No programa Vox Populi, da TV Cultura em que Caetano foi entrevista este conflito aflorou. Quando Mayrink criticou as reações negativas de Caetano a quem escrevesse algo desfavorável a ele, acusando-o de artista alienado. Ele perguntou: “A imprensa só pode elogiar você?”. “Como você é burro, cara!”, estrilou Caetano, referindo-se não àquela pergunta. Mas às gafes que Mayrink tinha cometido numa crítica para a Veja sobre “Muito (Dentro de uma estrela azulada)”, o disco de Caetano, então recém-lançado. Nela, Mayrink sustentou que Caetano passara a escrever maus versos. Sem considerar três obras primas do disco – “Sampa”, “Terra”, e, “Muito Romântico”. Pior: ao apontar exemplos de maus versos de Caetano, Mayrink citou trechos de letras das músicas “São João Xangô” e “Eu te amo”. Que eram versos de “Olha Pro Céu” e “Boneca de Piche”, de Luiz Gonzaga e de Ary Barroso. Incorporados por Caetano às suas letras como colagem, técnica vanguardista, largamente adotada pela Literatura e pelas Artes Plásticas.
Época atormentada aquela, em que havia intolerância até entre quem se admirava. Mayrink morreu em 2009. Muito antes, já levantara sua bandeira branca. Em 1988, ele escreveu, na Vogue: “O Caetano já me deu mais alegrias que aporrinhações. É um grande artista”.
(Ilustração: Caetano no Vox Populi, da TV Cultura)