O terror criado em O Bebê de Rosemary não está tão distante assim da dorminhoca Cinderella. Em um ensaio da filósofa Julia Kristeva, as duas personagens ganham importância em suas histórias pelo potencial reprodutivo. Seus corpos são sagrados porque vão carregar algo maior que elas e não importa se a princesa da Disney não tenha a oportunidade de dizer não ao beijo do príncipe.
Em cartaz no mesmo Centro Cultural São Paulo, Stabat Mater persegue a ideia trazida por Kristeva no formato de uma palestra cênica, criada por Janaina Leite. A peça que abriu a mostra aponta para a mãe de Jesus, Maria, como o modelo de mulher oferecido ao mundo. “Para Kristeva, Maria é como um protótipo do feminino para o Ocidente. Sua condição é a de uma virgem, que é visitada e fecundada. A missão é a de ser um receptáculo e seu corpo é valorizado porque está gerando o salvador, diz Janaina.
Essa vocação passiva para a concepção é traçada na montagem em outros casos, espalhados pela história e na produção cultural. “Nos contos de fadas, ou mesmo no terror, a mulher é o corpo que abriga deuses ou monstros. A expressão Boa Noite Cinderela também reflete esse tipo de invasão, de estupro.”
Para dialogar com o tema, a atriz e diretora já considerava, desde o início do projeto, a presença de sua mãe, Amália Fontes Leite, no palco. “É uma forma de cruzar o assunto com algo mais documental e pessoal. Talvez como a matrioska, sempre coube às mulheres essa transmissão de feminilidade e do que diz respeito a ser mulher. Com a minha mãe, ocorre um jogo de identificação, pelos elementos em comum, e de repulsa.” O mesmo se dá com a presença do ator pornô Loupan.
“Foi um processo difícil, desde encontrar o profissional até que eles entendessem o queríamos fazer. Os dois são formas de profanar a cena. Acredito que juntar maternidade com desejo ainda seja tabu”, defende Janaina.
STABAT MATER
Centro Cultural São Paulo. R. Vergueiro, 1.000. Tel.: 4003-1212. 6ª, sáb., 21h, dom., 20h. R$ 20 / R$ 10. Até 21/7
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.