Denunciado por peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e sua mulher, a dentista Fernanda Antunes Bolsonaro, compraram por cerca de R$ 6 milhões uma casa em Brasília. A aquisição do imóvel, próximo do Lago Paranoá, foi revelada pelo site <i>O Antagonista</i> e confirmada pelo <b>Estadão</b>. Flávio e a mulher vivem sob o regime da comunhão parcial de bens.
Conforme registrado no 1.º Ofício de Registro de Imóveis do Distrito Federal, em 2 de fevereiro, o imóvel foi comprado por R$ 5,97 milhões. A nova casa do filho do presidente Jair Bolsonaro fica localizada no setor de Mansões Dom Bosco, no Lago Sul, bairro nobre da capital federal, e foi vendida em anúncio como "a melhor vista de Brasília da suíte master". A casa tem 1,1 mil m², com quatro suítes, academia, piscina e spa com aquecimento solar.
O salário bruto de um senador é de R$ 33.763, que, após descontos, cai para R$ 24,9 mil. O valor do novo imóvel é mais que o triplo do total de bens declarados por Flávio à Justiça Eleitoral em 2018, quando disputou uma vaga no Senado. Naquela ocasião, Flávio declarou um total de bens de R$ 1,74 milhão, incluindo um apartamento residencial na Barra da Tijuca, no Rio (R$ 917 mil), uma sala comercial no mesmo bairro (R$ 150 mil), 50% de participação da empresa Bolsotini Chocolates (uma franquia da Kopenhagen, de R$ 50 mil), um veículo Volvo XC (R$ 66,5 mil) e aplicações e investimentos que somavam R$ 558,2 mil.
O senador e seu sócio entregaram a loja de chocolates após o estabelecimento entrar no radar da investigação do Ministério Público. A franquia da Kopenhagen é apontada pela Promotoria como uma forma de o senador lavar dinheiro supostamente desviado da Assembleia Legislativa do Rio quando era deputado estadual. Ele nega.
As condições do financiamento do imóvel de Flávio no Banco de Brasília (BRB), no valor de R$ 3,1 milhões, são vantajosas na comparação com simuladores de outras instituições financeiras. A título de exemplo, em outro banco, ele obteria uma taxa mínima de 5,39% ao ano. Para financiar R$ 3,1 milhões, teria de arcar com uma parcela inicial de R$ 23.222,93, considerando valor do imóvel, entrada, idade do senador, seguros e taxa de administração. Isso consumiria quase todo o ganho líquido de Flávio, de R$ 24,9 em fevereiro.
De acordo com o simulador do BRB, com uma renda mínima acima de R$ 46 mil, um financiamento de R$ 3,1 milhões teria prestações iniciais acima de R$ 18 mil, o que representa mais de 70% da remuneração líquida do senador. O BRB é uma instituição financeira do governo do Distrito Federal, comandado por Ibaneis Rocha (MDB), aliado da família Bolsonaro.
A aquisição do imóvel foi noticiada no mesmo dia em que o Superior Tribunal de Justiça retirou da pauta recursos da defesa de Flávio que podem anular toda a investigação sobre as "rachadinhas" na Alerj. Ele é acusado de comandar esquema que teria desviado R$ 6,1 milhões.
O <b>Estadão</b> procurou a assessoria de Flávio Bolsonaro, mas não recebeu resposta até a conclusão desta edição.
<b>Relator adia análise de recursos por tempo indeterminado</b>
O relator do caso das "rachadinhas" no Superior Tribunal de Justiça (STJ), Felix Fischer, retirou da pauta de julgamento nesta segunda, 1º, dois recursos da defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) que podem levar à nulidade total da investigação. A análise dos recursos estava prevista para ocorrer hoje à tarde, em sessão do colegiado. Agora, o julgamento está adiado por tempo indeterminado.
Ministros do STJ ouvidos pelo <b>Estadão</b>, sob reserva, avaliaram que Fischer tentou uma última manobra para tentar salvar o caso e evitar uma desidratação ainda maior da denúncia contra Flávio, filho do presidente Jair Bolsonaro. Na semana passada, por 4 votos a 1, a Quinta Turma do STJ acolheu um dos pedidos da defesa de Flávio e anulou a quebra do sigilo bancário e fiscal, determinada durante as investigações, que estão em andamento desde 2018. Com a decisão da Corte, serão excluídas da apuração todas as informações obtidas a partir da quebra do sigilo do parlamentar e outros 94 alvos, entre pessoas e empresas.
O segundo recurso apresentado pelo senador questiona relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Revelado pelo <b>Estadão</b>, o documento apontou movimentações suspeitas do ex-assessor Fabrício Queiroz, que trabalhou no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio. Flávio e Queiroz foram denunciados pelo esquema de "rachadinhas", com contratação de assessores fantasmas na Alerj. Queiroz está em prisão domiciliar.
"O Coaf não é o órgão de investigação e muito menos de produção de prova. Tem de fazer o relatório e mandar, não pode ser utilizado como auxiliar do Ministério Público em termos de investigação", disse o ministro do STJ João Otávio de Noronha, ao antecipar que acolheria o segundo pedido da defesa de Flávio na semana passada.
Na ocasião, Noronha votou o segundo recurso antes de Fischer, que reagiu. "Em 40 anos de tribunal, nunca vi o relator ficar para depois. Isso não existe", disse Fischer. Dirigindo-se a Noronha, afirmou: "Vossa Excelência me atropelou no outro caso, votando na minha frente. Agora, para evitar qualquer confusão, vou trazer (os outros recursos) na próxima sessão, coisa que o senhor nunca fez! E vem criticar! Que história é essa?"
Além de questionar a quebra de sigilo e o Coaf, a defesa de Flávio pede a anulação de todas as decisões do juiz Flávio Itabaiana, da 27.ª Vara Criminal do Rio, que conduziu as investigações na primeira instância. Em junho do ano passado, o Tribunal de Justiça fluminense concedeu foro ao senador e o caso foi transferido para a segunda instância. Segundo o <b>Estadão</b> apurou, esse terceiro recurso também será acolhido por Noronha.
Flávio afirmou que é vítima de uma investigação ilegal para atingir seu pai. A defesa de Queiroz, nos autos, nega o envolvimento dele em crimes.