Um parecer técnico da Fundação Nacional do Índio (Funai) que rejeita a construção da usina hidrelétrica de São Luiz, no Rio Tapajós, está paralisado na sede da autarquia, em Brasília. O documento conclusivo, que se baseia em um estudo contratado pela Eletrobras para analisar o impacto indígena do projeto, já tinha passado pelo crivo técnico da Funai e, inclusive, recebido a assinatura de Maria Augusta Assirati, que até o dia 30 de setembro era presidente da entidade. Tudo estava pronto para que o parecer fosse enviado ao Ibama na semana passada. O processo, no entanto, travou, sem mais explicações.
Desde o ano passado, o licenciamento de São Luiz é tratado com prioridade total pelo governo. A expectativa da cúpula do setor elétrico era vencer todas as etapas do licenciamento ambiental para realizar, ainda neste ano, o leilão daquele que é o maior projeto hidrelétrico do País para os próximos dez anos.
A questão indígena ligada a São Luiz sempre foi minimizada pelo governo. No próprio relatório de impacto ambiental da usina (Rima), a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) diz claramente que não há impacto direto em terras indígenas homologadas pela Funai. O novo estudo apresentado pela Eletrobras, no entanto, apresenta mais detalhes sobre o componente indígena. Foi com base nesse material que a Funai decidiu reprovar o projeto.
Para que a usina seja leiloada, é preciso que, antes, seja emitida pelo Ibama a licença prévia ambiental do empreendimento. Essa licença serve para atestar a viabilidade socioambiental da hidrelétrica. A rigor, o Ibama não depende de aprovação da Funai para liberar o projeto, mas, caso decida ignorar um posicionamento contrário apresentado pela fundação, pode ter seus técnicos responsabilizados por eventuais impactos negativos que a usina venha a causar no futuro. Na prática, portanto, o Ibama costuma seguir as orientações da Funai.
A saída de Maria Augusta Assirati do comando da fundação ocorreu após um processo de desgaste com o Ministério da Justiça, ao qual a autarquia é vinculada. Pessoas próximas a Maria Augusta afirmam que a ex-presidente da instituição não estava satisfeita com a lentidão nas homologações de terras indígenas, as quais passam pelo ministério, além de ser alvo de pressão para liberação de projetos estratégicos, como o de São Luiz do Tapajós.
A usina, prevista para gerar 8.040 megawatts de energia, vai criar um reservatório com área de 729 quilômetros quadrados e uma barragem de 7,6 km de extensão total. O local escolhido fica próximo à região de Itaituba, no Pará, em um ponto em que o Rio Tapajós se aproxima da rodovia Transamazônica. A região é rodeada de pequenas aldeias de índios da etnia Mundurucu.
Hoje, depois de a Funai ficar mais de uma semana sem presidente, o cargo foi interinamente assumido pelo chefe da procuradoria federal especializada da autarquia, Flávio Chiarelli Vicente de Azevedo.
A Funai não explica por que o parecer contrário à construção da usina deixou de ser enviado ao Ibama, uma vez que já está concluído. Segundo a autarquia, a fundação tem prazo legal de 90 dias para se posicionar sobre o processo. O Ibama afirmou que aguarda o posicionamento da fundação.
No ano passado, a diretoria da Funai havia dado um parecer contrário à construção da hidrelétrica de São Manuel, prevista para ser construída no Rio Teles Pires, na divisa de Mato Grosso com o Pará. Depois de uma forte pressão por parte do governo, o parecer foi alterado pela própria Funai. As críticas foram atenuadas e o projeto acabou aprovado.