A reivindicação desses trabalhadores não se justifica. Primeiro, porque querem a manutenção de tratamento diferenciado, num momento em que a expectativa de vida da população de países desenvolvidos não pára de crescer. Para piorar a situação, optaram pelo radicalismo, paralisando um serviço básico que deixou as pessoas a pé e provocou prejuízos financeiros calculados em 400 milhões de euros/dia. Resultado: ganharam a antipatia de grande parte da população, que se sentiu traída e desrespeitada pela decisão dos 500 mil trabalhadores da categoria.
O fato positivo dessas manifestações foi a retomada das discussões sobre o problema no País. É inegável que a França precisa de soluções para evitar um colapso do sistema previdenciário. Da mesma maneira que a Inglaterra, os Estados Unidos, a Alemanha, o Japão e o Brasil, entre dezenas de outras nações. Em todos esses casos, os governos sabem que é inevitável alterar as regras do jogo. Alguns iniciaram o debate, como é o caso brasileiro, enquanto outros, diante do desgaste que isso pode causar, empurram o problema para o futuro.
Nosso “Fórum Nacional da Previdência Social” foi criado no início do ano para evitar o colapso do sistema no Brasil. Digo “nosso” porque realmente se tratava de um espaço que deveria abrigar não só propostas governamentais, como também ouvir diferentes setores da sociedade para formular as novas regras da Previdência Social. Nada mais democrático, não é mesmo? O problema é que o Fórum encerrou suas atividades no final de outubro sem apresentar idéias concretas e viáveis à sociedade.
Infelizmente, a participação popular nesse tipo de iniciativa ainda deixa a desejar. Ao contrário do que ocorre na França, ninguém por aqui quis saber o que vai ocorrer com sua aposentadoria no futuro. Na verdade, as pessoas só terão consciência das mudanças quando elas aparecerem no holerite. Pior ainda. Ao invés de buscar informações sobre o Fórum da Previdência, vejo os jovens preocupados em descobrir maneiras de diminuir o valor de suas contribuições, seja pelo regime de pessoa jurídica ou descaradamente assumindo a informalidade como regra.
Essas pessoas se esquecem que lá na frente esse tipo de atitude poderá ter reflexo em seus próprios bolsos. Nas próximas duas décadas, estima-se uma população de 30 milhões de idosos no Brasil, quase o dobro da atual. Imagine o impacto disso sobre setores como a saúde e a previdência social. Sem alternativas, o governo terá de mexer nas regras atuais com coragem. Vai desagradar a muita gente, embora a maioria sequer tenha consciência disso. Não é preciso fazer paralisações como as de Paris. Mas seria bom prestar atenção no que se discute em Brasília.
Milton Dallari é consultor empresarial, engenheiro, advogado e presidente da Associação dos Aposentados da Fundação Cesp. O e-mail para contato é o [email protected].