O Brasil deve colher uma safra recorde de trigo este ano. A previsão é que seja 37,8% maior do que a do ano passado, com 2,163 milhões de toneladas a mais, segundo o Levantamento Sistemático da Produção Agrícola do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No entanto, os preços dos derivados do trigo, que têm peso significativo no orçamento das famílias, continuam a subir acima da inflação. Apenas o pão francês já ficou 9,37% mais caro nos últimos 12 meses, no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). A alta em setembro foi de 0,38%.
“O cenário de fato é esse, uma colheita jamais vista, com qualidade boa”, confirmou Amaryllis Romano, sócia da consultoria Tendências, responsável pela análise setorial de agronegócios.
A previsão é de que a safra de outros países importantes, como Estados Unidos, também seja boa. No mercado externo, os preços do grão estão caindo mês a mês, apontou Amaryllis. “Passaram de R$ 587,70 por tonelada em agosto para R$ 521,50 por tonelada em outubro”, citou.
Apesar das cotações mais baixas, a cadeia produtiva demora a incorporar a redução de custos com o insumo nos preços ao consumidor. “O efeito para cima (quando o preço sobe) é muito rápido. Quando é para baixo não é tão imediato, porque aí vem toda a cadeia de industrialização. Mas vai acabar chegando”, avaliou a sócia da Tendências.
No Brasil, o grupo de alimentos derivados do trigo aumentou 8,16% em 12 meses, uma contribuição de 0,20 ponto porcentual na inflação de 6,75% acumulada no período, calculou Irene Machado, gerente do IPCA no IBGE. O pão francês é tão importante na cesta de consumo das famílias que a alta de preços nos últimos 12 meses fez o item contribuir sozinho com 0,10 ponto porcentual na inflação oficial.
“Mesmo com o aumento da produção nesta safra, grande parte do trigo consumido no Brasil ainda é importada. Com isso, além das variáveis que determinam os preços dos outros alimentos, os derivados do trigo também sofrem influência das variações do dólar”, lembrou Irene. Embora o País espere uma produção de 7,9 milhões de toneladas este ano, o consumo aparente nacional é de 12,5 milhões de toneladas. A diferença será atendida, mais uma vez, com importações.
“A expectativa é que a safra Argentina também seja um pouco melhor. Podemos importar mais dos argentinos”, citou Amaryllis.
O engenheiro agrônomo Roberto Ferry, da Coordenação de Agropecuária do IBGE, afirma que as condições climáticas por enquanto estão favoráveis a uma produção nacional adequada para a panificação, que exige um trigo de qualidade superior. “É o moinho que verifica isso. Essa qualificação é feita após a colheita. Até o momento, os relatórios mostram que o trigo apresenta boa qualidade”, disse Ferry.
O técnico do IBGE explica que o clima seco ou a umidade interferem no PH do trigo. Uma chuva durante o período de colheita pode fazer o trigo germinar e inviabilizar seu uso na panificação. Nesse caso, o trigo é destinado a ração animal.
“Mas as condições este ano foram favoráveis. O Paraná está recuperando a safra. No ano passado teve estiagem no plantio, doenças como a ferrugem, e geada no período de colheita. Quebrou a safra”, contou Ferry. O Paraná responde por 50,7% da safra nacional de trigo. O Rio Grande do Sul é responsável por outros 40,8% do total nacional.