A construção de cinco complexos de energia eólica no Ceará e no Rio Grande do Norte se converteu em uma grande usina de atrasos, reflexo da quebradeira financeira que atingiu uma das maiores fornecedoras de turbinas no Brasil, a empresa argentina Impsa.
O jornal O Estado de S. Paulo teve acesso a um relatório da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que analisou o tamanho do estrago causado pelo processo de recuperação judicial da fornecedora e a consequente paralisação de suas operações. O documento aponta que pelo menos 300 turbinas eólicas encomendadas não foram entregues pela Wind Power Energy (WPE), fábrica que a Impsa montou no Brasil para atender o mercado local.
Cinco complexos de geração de energia, que somam 26 parques eólicos espalhados por municípios do Ceará e do Rio Grande do Norte, tinham previsão de entrar em operação entre julho de 2013 e novembro de 2016. Nenhum empreendimento foi entregue até hoje.
Nos cálculos da Aneel, pelo menos 1.580 megawatts (MW) de geração eólica e outros 2.800 MW de geração hidrelétrica devem sofrer impactos em seus cronogramas por conta da falência da empresa e do atraso na entrega dos equipamentos. É quase o mesmo volume médio de energia que será entregue anualmente pela hidrelétrica de Belo Monte, quando a usina estiver em operação plena.
As empresas Furnas, Comercial Mineira, EBDP, Energimp, Tecneira e o Fundo de Investimento em Participações Caixa Milão (FIP Caixa Milão), donas dos cinco complexos eólicos, entregaram à Aneel pedidos de adiamento dos cronogramas e de perdão pelos atrasos nas obras. As empresas responsabilizaram a falência da Impsa pelos atrasos e solicitaram o chamado “excludente de responsabilidade”, sob alegação de que foram prejudicadas pela situação da companhia.
Os 13 parques eólicos de Furnas e o FIP Caixa Milão tinham previsão de serem entregues em setembro do ano passado. As empresas pediram que o prazo fosse adiado em 24 meses, prazo que passaria a ser contado somente após a decisão da diretoria colegiada da Aneel sobre o assunto. Outros projetos que deveriam ser entregues em 2013, 2014 e em novembro de 2016 tiveram seus cronogramas reorganizados para julho de 2021.
A empresa Tecneira, por exemplo, solicitou prorrogação de entrada em operação comercial para janeiro de 2019, além de alegar que seu projeto não será mais viável se não houver mudança no preço da energia já negociada com o mercado. Mais que a mudança no cronograma, ela pede revisão tarifária de sua energia, saltando de R$136,60 o megawatt-hora (MWh) já negociados para R$ 286 o MWh.
Pedido negado
Depois de analisar cada um dos argumentos apresentados pelas empresas, a Superintendência de Concessões e Autorizações de Geração da Aneel rejeitou integralmente os pedidos. Na maioria dos casos, segundo a área técnica da agência, constatou-se que as obras sequer começaram ou estão paralisadas há anos, situações que não teriam relação direta com a quebradeira da Impsa. Os técnicos também avaliaram que a decisão de contratar qualquer fornecedor de equipamentos é algo estritamente privado, e que suas consequências não podem onerar o consumidor de energia.
“Todos os agentes alegam que se cercaram de todas as precauções, utilizando as melhores práticas do mercado para a escolha da empresa fornecedora dos equipamentos geradores e que a falência desta era um fato imprevisível”, afirma a área técnica da Aneel, em seu relatório. “Mas, o que se pode inferir é que apesar de terem declarado diligência e tentado diminuir o atraso em seus cronogramas, a decisão de contratar a WPE como fornecedora partiu dos agentes.”
Segundo a agência, a aceitação do pedido significaria abrir um “precedente”, porque “as empresas poderiam ser estimuladas a relaxar a gestão de governança na celebração de seus contratos com fornecedores de equipamentos”.
As empresas seguem com seus processos administrativos em andamento na Aneel, uma vez que a decisão final sobre os pedidos ainda depende de votação pela diretoria colegiada da agência. A reportagem não conseguiu contato com a Impsa.