O consumo formiga de materiais de construção, aquele feito a conta-gotas pelos brasileiros para reformar a casa ou fazer um “puxadinho”, deve encerrar este ano no vermelho. Se as previsões se confirmarem, será a primeira queda sobre o ano anterior desde 2009, quando o País sentia os efeitos da crise financeira internacional.
Crédito mais caro e restrito, renda crescendo, porém em ritmo menor, e o cenário de incerteza que se traduziu na estagnação da economia durante este ano atrapalharam os planos de melhorar a moradia e as vendas do setor, que ainda conta com o benefício do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) reduzido.
O tamanho da freada aparece na redução do número de famílias que pretendiam reformar a casa. Em agosto, 18,3 milhões de lares, mais da metade (62%) das classes de maior renda (A e B) planejavam uma reforma nos próximos 12 meses, aponta a pesquisa nacional da consultoria Data Popular com 1,8 mil entrevistados.
Em 2010, quando a economia estava a todo vapor e crescia a 7,5%, 22 milhões de famílias queriam reformar a casa e a maior fatia (52%) era da classe C, que agora concentra um terço das intenções de reforma.
“Todo mundo sabe que fazer uma reforma é um saco sem fundo e está pensando duas vezes antes de começar, diante do cenário de incertezas”, constata o sócio-diretor da Data Popular, Renato Meirelles.
A cautela do brasileiro acendeu um sinal de alerta na indústria. “Esse ano foi muito difícil”, afirma o presidente da Associação Brasileira da Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat), Walter Cover. Ele diz que, entre 2010 e 2013, o faturamento real do varejo (descontada a inflação) cresceu em média 7% ao ano. A expectativa para este ano era de um avanço entre 5% e 6%, mas Cover acredita que a queda deve beirar 1%.
Pesquisa
Até setembro, o faturamento real no varejo de materiais de construção recuou 0,35%, afirma a Abramat, com base na pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No terceiro trimestre, a receita real do varejo caiu 2,4% ante o mesmo período de 2013. E as vendas totais da indústria, incluindo três setores (formiga, imobiliário e infraestrutura) devem cair entre 4% e 5% este ano.
Ana Maria Castelo, coordenadora de Projetos da Construção da Fundação Getulio Vargas (FGV), explica que 50% das vendas da indústria são para o comércio e a maior parte (80%) dessa fatia se destina às famílias. Os 20% restantes são consumidos por pequenas empresas de construção e condomínios, entre outros segmentos.
“O consumo formiga está sofrendo os efeitos do crédito mais caro, das famílias mais endividadas e das incertezas em relação ao que vai acontecer daqui para a frente”, observa a economista. Nas suas projeções, o resultado das vendas desse segmento deve ser negativo e será primeira queda desde 2009.
A menor disposição do brasileiro para gastar com materiais de construção também aparece na intenção de consumo para este trimestre. Pesquisa do Programa de Administração de Varejo (Provar) mostra que os paulistanos pretendem desembolsar R$ 5.698 com materiais de construção entre setembro e dezembro. A cifra é 12,5% menor do que a gasta no mesmo período do ano passado e 7% abaixo da verificada no trimestre anterior.