O ajuste da economia em 2015 será mais difícil que o de 2003, e a situação dramática da Petrobrás, a maior empresa do Brasil, deve tornar o próximo ano ainda mais complicado. A agenda, porém, não se limita à guinada na política fiscal, e se estende ao modelo econômico em aspectos mais estruturais, como as políticas industrial e comercial.
A escolha, pela presidente Dilma Rousseff, de uma equipe econômica que contradiz seu discurso de campanha traz dúvidas sobre o caminho a ser seguido. Sobretudo porque ainda há uma visão alternativa, próxima ao campo político da presidente, de que as políticas de estímulo à demanda do Estado são fundamentais para que o Brasil supere a fase de baixo crescimento – para esta corrente, o rigor fiscal esperado do novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, pode ser contraproducente. Esse pode ser o resumo do conjunto de artigos publicados pelo Estado neste caderno especial, que gira em torno da complicadíssima travessia que o País terá de fazer em 2015.
O economista Affonso Celso Pastore nota que as excelentes credenciais de Levy não “o qualificam para realizar milagres”, e que a retomada do crescimento e a queda da inflação só ocorrerão depois de um “extenso período de taxas de crescimento baixas ou mesmo negativas” e de alta do desemprego. Em seu artigo, o consultor e ex-presidente do Banco Central detalha as diferenças entre o ajuste de 2003 e o prometido para 2015.
Outro ex-presidente do BC, Gustavo Franco, vê no escândalo da Petrobrás as consequências do “cruzamento entre o capitalismo de Estado tipicamente asiático e o petropopulismo de corte venezuelano”. Já Edmar Bacha, companheiro de Franco na elaboração do Plano Real, toma uma perspectiva mais de longo prazo – a quase estagnação da economia brasileira em 33 anos – para defender a ideia de que o Brasil precisa abandonar o protecionismo e abrir a economia.
O economista Sérgio Lazzarini, professor do Insper e autor do livro Reinventando o Capitalismo de Estado, lembra o baixíssimo nível de investimento privado no Brasil, a despeito das fartas oportunidades para aumentar o índice por meio de parcerias público-privadas. Marcos Lisboa, um dos principais colaboradores de Antônio Palocci, ex-ministro da Fazenda, e hoje diretor vice-presidente do Insper, considera que “o governo parece encontrar-se refém dos mitos criados durante a eleição, comprometendo a credibilidade do ajuste”.
De um ponto de vista ideológico distinto, Ricardo Bielschowsky, economista da UFRJ, escreve que “o nó atual da economia brasileira é a escassez de demanda”. Para ele, com a queda da demanda decorrente do esperado ajuste fiscal, “não se pode esperar muito do investimento privado, cabendo ao setor público a principal responsabilidade na mobilização da atividade inversora, em forma direta ou em parcerias.”
O economista Amir Khair, por sua vez, concentra-se no componente financeiro do desajuste fiscal: “Para se chegar ao equilíbrio fiscal é necessário elevar o superávit primário e reduzir a despesa com juros”. Ele acha que o ajuste fiscal tem de ser complementado por uma redução da taxa Selic dos atuais 11,75% para 6%. Khair defende ainda a ampliação da base monetária com emissão de moeda e a venda das reservas internacionais para reduzir o custo do seu carregamento.
Márcio Pochmann, professor da Universidade de Campinas e ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), recapitula os “blocos de investimento” da história econômica brasileira, nos anos 40, 50 e 70, e os três grandes ciclos de consumo, o plano Cruzado, o plano Real e o governo Lula. Para ele, é fundamental implementar um quarto bloco de investimento, para se contrapor ao “baixo dinamismo do capitalismo brasileiro” nas últimas três décadas, que acompanha “o esvaziamento do setor manufatureiro, o avanço da reprimarização da pauta de exportação e a dominação financeira da economia nacional”. Pochmann vê como urgente uma reforma das relações entre o Estado e o setor privado.
Uma visão pragmática do ajuste de 2015 é delineada pelo economista José Roberto Mendonça de Barros, que procura antever os setores capazes de fazer uma boa travessia do próximo ano. Ele aposta que a desvalorização terá efeito positivo sobre exportações industriais e do agronegócio. Mendonça prevê também que os tempos difíceis à frente podem levar empresas endividadas a “um processo natural de consolidação”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.