A reforma da Previdência, aprovada em novembro do ano passado, dificultou o caminho das trabalhadoras para alcançar o direito de se aposentar pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). O aumento da idade mínima para as mulheres, que agora é de 62 anos, aproximou os critérios previdenciários aos dos homens e, de modo geral, as novas regras ficaram mais rígidas para as seguradas que, muitas vezes, cumprem dupla ou até tripla jornada ao acumularem as atividades do trabalho com as da vida em família.
A licença-maternidade é o único benefício previdenciário exclusivo para as mulheres. Além disso, as trabalhadoras têm os mesmos direitos previdenciários que os homens, tal como as aposentadorias, benefícios por incapacidade, pensões, auxílio-reclusão e benefícios acidentários.
Apenas as mulheres filiadas à Previdência Social, que tenham o período mínimo de carência necessário, além dos pressupostos exigidos em lei, têm direito à aposentadoria e a benefícios por incapacidade e em razão da maternidade. “Já aquelas que desejem receber benefícios oriundos de seus maridos e companheiros, também filiados à Previdência, como a pensão por morte e o auxílio-reclusão, basta que comprovem o casamento ou a união estável”, explica Debora Silva, advogada previdenciária do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.
Para ter direito aos benefícios, as trabalhadoras por conta própria devem comprovar dez meses de tempo de trabalho, enquanto que as desempregadas devem ainda comprovar a qualidade de segurada do INSS. Contudo, são isentas de comprovação do período de carência as trabalhadoras contratadas por meio da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), empregadas domésticas e trabalhadoras avulsas, sem vínculo empregatício, que estejam em atividade na data do afastamento, parto, adoção ou guarda.
Caso a qualidade de segurado seja perdida, a segurada deverá cumprir metade do tempo de carência, ou seja, trabalhar cinco meses a mais no caso dos critérios exigidos para a aposentadoria.
Desde o último dia 13 de novembro, as regras para se aposentar se tornaram mais difíceis de ser alcançadas depois da vigência da Emenda Constitucional (EC) 103/19, responsável pela reforma da Previdência. As trabalhadoras do setor privado necessitam agora alcançar uma idade mínima de 62 anos e 15 anos de tempo de contribuição; as rurais necessitam atingir 55 anos de idade e 15 anos de contribuição; e professoras do magistério infantil, fundamental e médio devem ter uma idade mínima de 57 anos e o tempo de contribuição mínimo de 25 anos.
“Sob o viés de gênero, o diferencial de tempo de contribuição foi eliminado pela reforma da Previdência. Pela regra antiga, as professoras tinham que comprovar 20 anos de contribuição e os professores, 25 anos. Pelas novas regras, ambos terão que comprovar 25 anos de contribuição, sendo introduzida a idade mínima de 57 anos às mulheres”, critica Veridiana Police, advogada especialista na área trabalhista e previdenciária e sócia do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de Advogados.
A especialista também aponta que, no caso das trabalhadoras urbanas, o critério aumentou apenas para as mulheres, de 60 para 62 anos, enquanto a idade mínima dos homens permaneceu em 65 anos com a reforma, o que fez com que diminuísse a diferença entre os critérios. “A premissa adotada pelo governo federal para tal redução certamente não considerou a realidade das mulheres que, apesar de terem ganhado espaço no mercado de trabalho, ainda realizam jornadas de trabalho duplas ou triplas em razão das atividades domésticas, sem falar que, em sua grande maioria, figuram como únicas provedoras do lar. A Emenda Constitucional feriu o princípio da igualdade, pois deixou de tratar desigualmente os desiguais na medida da sua desigualdade”, aponta.
Para compensar as mudanças nos critérios, a reforma apresentou uma regra de transição exclusiva para trabalhadoras próximas de alcançar o direito de solicitar a aposentadoria. É possível que as seguradas se aposentem com 60 anos e seis meses de idade com no mínimo 15 anos de contribuição. O critério de idade mínima teve um aumento de seis meses no início desse ano e aumentará de forma progressiva até atingir 62 anos em 2023. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 133/19, conhecida como “PEC Paralela”, prevê ainda que o critério de 62 anos passe a ser alcançado apenas em 2026 pela regra. A proposição já foi aprovada no Senado e aguarda análise da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados.
A advogada Joelma Elias dos Santos, do escritório Stuchi Advogados, frisa que os impactos da reforma para as mulheres ainda devem ser analisados com cautela. “Por serem regras muito recentes, não se pode avaliar o lado positivo e negativo. Contudo, já percebemos que os impactos para a mulher serão muito maiores que para o homem. A mulher terá que trabalhar por muito mais tempo para conquistar o seu benefício”, pondera.
Avanços da licença-maternidade
Entretanto, de acordo com especialistas, o possível aumento do período de tempo da licença-maternidade tem sido visto hoje como uma possibilidade de ampliar direitos para o gênero. Projetos no Congresso Nacional preveem o aumento para todas as trabalhadoras da licença dos atuais 120 dias para 180 dias, o que já vendo sendo garantido para algumas categorias por meio de acordos e convenções coletivas.
No último mês de dezembro, deputados membros da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovaram a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 158/19, que propõe a mudança. O texto agora deverá passar por comissão especial antes de seguir para o plenário da Câmara e, caso aprovado em votação de dois turnos, será analisado pelo Senado Federal.
“O avanço dos direitos é sempre bem-vindo, principalmente para a proteção da mulher e da criança. A amamentação é um período primordial para formação do bebê e quanto maior for o contato entre mãe e filho, melhor será para a criança. Pode-se observar que a atual licença de quatro meses é insuficiente para as trabalhadoras, visto que a maioria das mães amamentam por mais de 180 dias. Desse modo, embora seja permitido o período da amamentação, o ciclo é interrompido com a volta ao trabalho”, afirma Bianca Canzi, advogada do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados.
A licença é concedida às mães que se afastam do emprego nos estágios finais da gravidez ou logo após darem à luz, sendo um direito de toda contribuinte do INSS, que recebe normalmente o salário durante o período de afastamento.
Para Joelma Elias, a licença-maternidade é um direito que vem avançando, embora projetos relacionados a ele no Congresso Nacional tenham tramitação lenta. “É um grande benefício, inclusive para a saúde pública, uma vez que é de conhecimento geral que quanto mais tempo o aleitamento materno perdura, melhor as condições de saúde da criança. Quanto mais tempo a mãe puder passar com o filho, melhor para ambos. Algumas convenções coletivas já vêm trazendo esta previsão, aumentando o prazo por ação dos sindicatos”, contextualiza.
Bianca Canzi explica que o benefício é garantido por lei até mesmo em caso de aborto não criminoso, adoção ou falecimento da criança após o parto. “No entanto, em alguns casos, deverá ser de forma proporcional. Em caso de aborto espontâneo ou não criminoso, por exemplo, a trabalhadora terá direito a duas semanas de licença. Importante lembrar que a mãe adotante, após aprovação da Lei 12.873/13, também passou a ter direito à licença-maternidade, assim como a mãe biológica”, ressalta.
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