O agronegócio brasileiro, que no início dos anos 2000 foi palco de uma série de fusões e aquisições no segmento de açúcar e álcool, voltou à lista de setores mais cobiçados por investidores financeiros e estratégicos. Desta vez, o interesse está em uma variedade muito maior de segmentos, que vão desde logística e ração animal até fertilizantes e insumos. Segundo profissionais de peso que trabalham com fusões e aquisições no Brasil, o agronegócio está se tornando “a bola da vez”, assim como os desejados setores de consumo e varejo brasileiros.
Na dianteira deste movimento estão investidores estrangeiros, principalmente fundos de private equity e fundos soberanos, que buscam retorno em várias partes de mundo e encontram no Brasil um ambiente regulatório considerado seguro, uma vez que mesmo as eleições presidenciais não representam uma ameaça de ruptura institucional como vista em outros mercados.
Segundo o diretor de Investment Banking do Banco Indusval & Partners (BI&P), Rogério Pacheco, pela primeira vez começam a surgir fundos levantando capital com finalidade de fazer aquisições no agronegócio. “Cinco anos atrás não se via este tipo de coisa. Era mais foco em compra de terras e algo no setor sucroalcooleiro”, diz Pacheco.
Até o momento, a preferência tem sido por negócios que circundam a produção agrícola, como fertilizantes, defensivos, rações, insumos, medicamentos e genética. A vantagem destes setores, segundo o executivo, é o fato de serem menos dependentes de fatores climáticos e dos preços das commodities do que a produção agrícola. A compra de terras não está em evidência porque no Brasil está proibida, desde 2008, a aquisição por investidores estrangeiros.
Mesmo assim, investidores da Ásia e do Oriente Médio já começam a manifestar interesse em atuar diretamente na produção agrícola para assegurar fontes de alimentos no longo prazo. De acordo com o sócio do Pátria responsável pela área de fusões e aquisições, Antonio Wever, fundos de private equity e fundos soberanos asiáticos e do Oriente Médio estão procurando ativos com este perfil na América Latina e na África, e o Brasil é um forte candidato.
Ele destaca que o agronegócio ainda é muito fragmentado no País, e que os investidores estão em busca de associações para consolidar o mercado. “Muita coisa vai acontecer nos próximos anos porque o interesse de fora é grande, e o setor tem necessidade de capital”, afirmou. Em sua opinião, boa parte da necessidade incremental de produção de grãos no mundo deve ser atendida pelo Brasil.
Os braços de private equity e de infraestrutura do Pátria fizeram operações nesta área nos últimos anos, sendo um dos investimentos na produtora de café AC Agro e outro na empresa de logística de grãos Nova Agri. Outro negócio recente firmado no setor foi a venda de participação de uma companhia de confinamento de gado brasileira para o fundo Black River Asset Management, da Cargill, que é dedicado ao agronegócio. De acordo com uma fonte do mercado, a Cargill acredita que se repetirá no Brasil o que ocorreu nos Estados Unidos há duas décadas, com a migração do gado do pasto para o confinamento.
Um levantamento do Transactional Track Record (TTR), serviço parceiro do Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado, aponta que ocorreram neste ano, até o momento, 18 transações no setor de agronegócios brasileiro, que movimentaram R$ 1,431 bilhão. Deste montante, cinco foram empresas estrangeiras comprando ativos no Brasil. De janeiro a dezembro do ano passado, 26 transações movimentaram R$ 4,631 bilhões, das quais cinco envolviam compradores estrangeiros. O volume em 2013 foi expressivo quando comparado com 2012, quando 17 transações somaram R$ 1,777 bilhão, com participação de quatro empresas estrangeiras.
De forma geral, os compradores do agronegócio têm adotado uma postura discreta no Brasil, justamente para evitar uma disparada nos preços dos ativos, de acordo com profissionais do mercado.
Do lado dos vendedores estão companhias nacionais, em sua maioria familiares, que têm se preparado nos últimos anos com um nível crescente de profissionalização. “Antes era raro ver estrangeiros interessados no agronegócio brasileiro porque a falta de sofisticação do setor era uma barreira natural. Mas as empresas têm criado estas condições”, explica o sócio do escritório Mattos Filho especializado em direito societário, Pedro Whitaker de Souza Dias, que também é presidente da Comissão de Agronegócios da Ordem dos Advogados do Brasil São Paulo (OAB SP).
O diretor do BI&P também destacou que nos últimos cinco anos o setor se familiarizou com a necessidade de ter auditoria, conselho e governança, e que este “fenômeno recente” ajuda a fomentar negócios no setor.
Usinas
O setor de açúcar e álcool, que viveu um “boom” de investimentos no começo dos anos 2000, vive hoje uma fase difícil e deve ficar de fora do movimento de aquisições no agronegócio até que ocorra uma mudança mais profunda, apontam os especialistas. A política de contenção de preços da gasolina é apontada como principal entrave para o setor, pois retira a competitividade do etanol. Além disso, as empresas elevaram muito sua alavancagem (relação entre dívida líquida e geração de caixa) a custos elevados, e ainda devem levar alguns anos para solucionar esta situação.