Os planos da AES Brasil de construir uma fazenda de energia solar nos arredores da usina hidrelétrica de Água Vermelha, em Minas Gerais, estão na gaveta. O grupo desistiu de submeter o projeto no último leilão de geração de energia, em abril, por considerar que ele se tornou inviável. Com cerca de 70% do projeto financiado, a AES teria de gastar mais do que previu para construir a fazenda solar, diante da alta do custo do crédito. A avaliação da empresa era de que a tarifa máxima para a venda de energia teria de ser reajustada para o projeto valer a pena.
“O preço teto da energia não refletia a nova realidade de custo de financiamento e as mudanças da taxa de câmbio”, explicou o vice-presidente Financeiro e de Relações com Investidores da AES Brasil, Francisco Morandi. Segundo ele, a AES tem 1.200 megawatts em projetos de energia solar e térmica prontos para serem lançados, que não se concretizam agora por inviabilidade financeira ou incertezas sobre fornecimento de gás para as térmicas.
A AES não é a única. Um estudo da consultoria Accenture aponta que o custo do capital das grandes empresas brasileiras subiu de 10% para 16,4% ao ano entre 2012 e 2015. O capital ficou mais caro em um momento em que elas já estão endividadas e tentam preservar o caixa para sobreviver, afirma Leonardo Framil, presidente da Accenture na América Latina. “É uma tempestade perfeita. Nesse cenário, o custo de oportunidade sobe e os retornos têm de ser maiores”, disse. “A consequência é que vários projetos não fazem mais sentido.”
Risco
A onda de rebaixamentos das notas de crédito das empresas brasileiras dá uma ideia de quanto a percepção de risco – e consequentemente o custo do capital – piorou. Só na agência Fitch, foram 188 rebaixamentos de notas de crédito nacional e internacional entre 2014 e o primeiro semestre de 2016, um volume superior ao número de rebaixamentos nos dez anos anteriores.
“O ambiente ruim de negócios têm reflexo nas companhias”, explicou Ricardo Carvalho, diretor sênior de Corporate na Fitch. Ele lembra que o PIB brasileiro terá uma queda acumulada de 8% em dois anos. “Isso chegou ao balanço das empresas. Elas estão com menos caixa e menor capacidade de pagamento.”
Já a Standard&Poors (S&P) rebaixou neste ano cerca de 80 notas de empresas brasileiras de um grupo de 170 avaliadas em 2016. “É atípico. Não temos essa situação em outros países da região ou do mundo”, afirmou Diego Ocampo, diretor sênior e especialista em rating corporativo da S&P. Ele ressalta que a onda de rebaixamentos pode continuar e piorar ainda mais a situação das empresas. O risco soberano do Brasil e a nota de crédito de cerca de 70% das empresas avaliadas têm perspectiva negativa na S&P.
A redução da nota de crédito torna o crédito mais escasso e caro, explica Ocampo. Um relatório de junho do Itaú BBA traz estimativas do prêmio de risco médio que cada nota de crédito requer sobre o rendimento do Tesouro Americano.
No caso da Odebrecht Engenharia, por exemplo, que tinha nota BBB em maio de 2014 e hoje está classificada pela S&P cinco níveis abaixo (B+), o spread que a empresa teria de pagar subiria de 3 para 10 pontos porcentuais, de acordo com a tabela.
As novas captações mostram que o mercado já cobra o prêmio de risco das empresas brasileiras. Em 2013, a AES pagou a taxa de CDI mais 0,79% ao ano em uma emissão de debêntures com prazo de pagamento de seis anos. No fim do ano passado, o mercado cobrou taxas mais altas (CDI + 2,15%) e o prazo de pagamento caiu para três anos.
No caso do crédito ofertado pelo BNDES, que antes cobria 70% dos financiamentos de infraestrutura, há uma incerteza sobre qual montante o banco vai liberar, diz Morandi. “Isso muda a conta. Com o crédito do BNDES, o custo era TJLP mais uma taxa. No mercado, é CDI mais uma taxa.”
A melhoria das condições de crédito depende da uma retomada do crescimento do País, explica Carvalho, da Fitch. Ele ressalta que o reflexo será gradativo. “A taxa de juros sobe de elevador e desce de escada.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.