O Governo Federal está apostando todas as suas fichas e forças na votação da Reforma da Previdência na Câmara dos Deputados ainda este ano. O objetivo da equipe econômica de Michel Temer é garantir que o novo texto da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 287/2016 seja aprovada no próximo dia 6 de dezembro pela maioria dos deputados. Na visão de especialistas, o novo texto foi produzido com objetivos políticos e não beneficia o trabalhador brasileiro, que terá que contribuir por 40 anos para ter direito a aposentadoria integral, além de cumprir a idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres.
De acordo com advogados e professores de Direito Previdenciário, os trabalhadores públicos, privados e rurais sairão perdendo com a reforma da Previdência e ficarão cada mais longe do sonho da aposentadoria. E, ao contrário do que os porta-vozes da União dizem nas propagandas pela aprovação das mudanças, o segurado do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) perderá direitos como, por exemplo, o fim da aposentadoria por tempo de contribuição.
Para o professor da Universidade Federal do Paraná e autor de obras de Direito Previdenciário Marco Aurélio Serau Junior, a nova versão da reforma tem um viés mais político do que social. “A nova proposta do Governo é composta, basicamente, pelo cerne da proposta inicial, persistindo no grande problema central desta e maior limitador das aposentadorias: a idade mínima elevada. A ideia foi retirar vários temas polêmicos e negociar poucos pontos, indo ao encontro dos desejos da viabilidade política da aprovação do texto”, analisa.
Serau Junior ressalta que as novidades não são animadoras. “O Governo manteve a idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres, pois é o único ponto que demanda uma alteração constitucional. Atualmente, a Constituição define que existem as aposentadorias por idade e tempo de contribuição. Com a reforma aprovada, a aposentadoria será limitada a uma categoria, a de idade”.
Retrocesso
João Badari, sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados, também entende que a reforma é apenas política e econômica e representa um grande retrocesso social. “A idade mínima de 65 anos para homens e 62 anos para as mulheres traz enorme retrocesso em dois pontos: as mulheres terão que trabalhar ainda mais tempo, incluindo a dupla e, às vezes a tripla jornada que tem na atividade laboral e no lar e o fim da aposentadoria por tempo de contribuição”, analisa.
Se as novas regras forem aprovadas, o trabalhador terá que contribuir no mínimo por 15 anos para ter o direito a dar entrada na aposentadoria, mas se quiser alcançar o seu benefício integral terá que comprovar no mínimo 40 anos de contribuição.
O advogado explica que o trabalhador que ganha mais que o piso nacional terá direito a 60% do salário de contribuição ao cumprir os 15 anos de contribuição e, a partir daí, obterá ganhos crescentes se continuar trabalhando.
Será acrescentado 1 ponto percentual sobre a média dos salários a cada ano adicional entre os 16 e 25 anos de contribuição; 1,5 ponto percentual a cada ano entre os 26 e 30 anos de contribuição; 2 pontos percentuais ao ano entre os 31 e 35 anos de contribuição; e 2,5 pontos percentuais a partir dos 36 anos de contribuição. Para conseguir o benefício integral, serão necessários 40 anos de contribuição.
“Dessa forma, um trabalhador da iniciativa privada que contribua por 34 anos receberá 85,5% do seu salário de contribuição. Se ele optar pela aposentadoria antes, quando completar 17 anos de contribuição, esse percentual será de 62%, ou seja, inferior até mesmo ao fator previdenciário se fosse aplicado. Essa segunda hipótese não era possível pelo texto da comissão especial. Além disso, dificilmente os brasileiros das periferias que, em muitos casos, não chegam aos 65 anos de vida, conseguirão atingir a idade para se aposentar e receber um benefício integral. Eles entram no mercado de trabalho mais cedo, contribuem mais e, mesmo assim, não se aposentarão", pontua Badari.
Extinção do fator previdenciário
Caso a nova versão da PEC seja aprovada, serão extintos, automaticamente, o fator previdenciário e a regra 85/95 para aposentadoria integral, pois valerá a idade mínima e tempo mínimo de contribuição estabelecidos no novo texto.
“Não haverá mais o fator, porém as aposentadorias partirão de 60% da média salarial desde 1994. O marco temporal 1994 se dá pelo início do plano Real, sendo considerado para o INSS não ter que converter moeda, trazendo com isso prejuízo aqueles que contribuíram com maiores valores antes de tal data”, alerta o advogado Previdenciário Murilo Aith.
Pensões
Badari também entende que a manutenção da regra de teto de dois salários mínimos para a acumulação de aposentadoria com a pensão por morte é contrária ao princípio contributivo-retributivo da Previdência Social.
“Isso porque toda contribuição deve ser revertida em retribuição, onde o segurado que realizou o custeio aos cofres do INSS deve ter garantido os benefícios pelos quais contribuiu. Imagine, por exemplo, aquele segurado que contribuiu a vida toda pelo teto da Previdência e falece: sua esposa, se for aposentada e recebe um salário mínimo, por exemplo, passará a receber apenas mais um salário mínimo. Essa proposta fere a regra essencial da Previdência e não é isonômica”, adverte o especialista.
Servidores
Na ótica do advogado Leandro Madureira Silva, sócio do Roberto Caldas, Mauro Menezes & Advogados, o novo texto evidencia a intenção do governo em restringir e dificultar o acesso dos servidores públicos aos benefícios previdenciários. “A proposta traz a majoração da idade mínima da aposentadoria, condicionando os cálculos à totalidade da média e prevendo gatilhos que propaguem a elegibilidade ao benefício a requisitos incertos e obscuros”.
Para Madureira, as propagandas veiculadas desde a noite do dia 22 de novembro “levam a crer que o governo incita a população a formar um juízo de valor equivocado. Enquanto reafirma que a reforma modificará somente o benefício de uma classe privilegiada, deixa de informar que desde o ano de 2013 o serviço público federal já tem um teto máximo de benefício previdenciário idêntico ao adotado no regime de previdência dos trabalhadores que não são servidores públicos. Com isso, o que o governo pretende é ganhar apoio da maioria da população”.
O professor e doutor em Direito pela USP Gustavo Filipe Barbosa Garcia também destaca que para Regime Próprio de Previdência Social, passa a ser exigido o tempo mínimo de contribuição de 25 anos. “É um tempo de contribuição elevado. Atualmente, no regime próprio, a Constituição Federal (art. 40, § 1º, III) prevê a aposentadoria voluntária, desde que cumprido tempo mínimo de 10 anos de efetivo exercício no serviço público e cinco anos no cargo efetivo em que se dará a aposentadoria, observadas as seguintes condições: a) 60 anos de idade e 35 de contribuição, se homem, e 55 anos de idade e 30 de contribuição, se mulher; ou b) 65 anos de idade, se homem, e 60 anos de idade, se mulher, com proventos proporcionais ao tempo de contribuição. Isso mudará”.
O texto também, alerta o especialista, prevê a obrigatoriedade de a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituírem o regime de previdência complementar para os seus servidores, num prazo máximo de dois anos da promulgação da PEC. “Isso implicará na limitação de todos os benefícios previdenciários do serviço público brasileiro (federal, estadual, distrital e municipal) ao teto máximo do benefício pago pelo INSS”, afirma Madureira.
O advogado informa que os servidores que já tiverem ingressado em cargo público efetivo do serviço público até a data de publicação da Emenda, poderão se aposentar quando completarem os requisitos abaixo:
– 60 anos de idade para homens e 55 anos de idade para mulheres;
– 35 anos de contribuição para homens e 30 anos de contribuição para mulheres;
– 20 anos de efetivo exercício no serviço público;
– 5 anos no cargo em que se der a aposentadoria;
– 30% de pedágio, incidente sobre o tempo de contribuição que faltar, na data de publicação da Emenda, para que o servidor atinja o mínimo de 30 ou 35 anos de contribuição.
Segundo o texto da Emenda, o limite de idade (60/55 anos), será aumentado a partir do ano de 2020 em 1 ano. A partir de então, a cada dois anos, haverá novo aumento da idade mínima, até que se chegue à exigência de 65 anos de idade para homens e 62 anos de idade para mulheres. A idade mínima que cada servidor da regra de transição deverá possuir no futuro dependerá da data em que a emenda for publicada, caso seja aprovada, e do tempo de contribuição que falta para que esse servidor se aposente.
Badari alerta que nas aposentadorias especiais do regime geral serão mantidas as mesmas condições de exposição a agente nocivo à saúde, porém no regime próprio mantiveram a expressão “efetivamente”, ou seja, o servidor deverá demonstrar que houve efetivo dano a sua saúde. A aposentadoria especial do servidor se tornaria uma “indenização” em caso de prejuízo efetivo apenas.
Pontos positivos
Um dos pontos positivos, segundo Badari, é que o texto determina que o governo vai retirar da DRU (Desvinculação de Receitas da União) – mecanismo que dá ao governo liberdade para manejar livremente 30% dos recursos – as contribuições sociais. Hoje, 30% da arrecadação da previdência vão para fins diversos; com a nova proposta, eles voltarão aos cofres do Instituto.
Outro ponto positivo, segundo o especialista, foi a manutenção das regras para acesso ao BPC, “em razão da dignidade da pessoa humana, onde quem busca o ‘LOAS’ já viver em situação de miserabilidade”.
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